Coluna

Déficit comercial da indústria de transformação salta 72% até abril

Publicado por: Sheyla Sousa | Postado em: 13 de maio de 2020

Os
resultados oficiais acumulados pela balança comercial brasileira no primeiro
quadrimestre teimam em desmentir a retórica alardeada pelo ministro dos
mercados, senhor Paulo Guedes, em lives dedicadas ao mercado financeiro nos
últimos dias. O caro ministro tem repetido que o Brasil foi o único país
participante do G-20 (grupo formado pelas 19 maiores economias do globo, mais a
União Europeia) a conseguir elevar suas exportações no primeiro quadrimestre
deste ano. Esse seria um dos fatores, segundo o superministro, a justificar a
expectativa de uma retomada rápida da atividade econômica no Brasil assim que
debelada a pandemia – o que o senhor Guedes acredita que vá acontecer ainda no
segundo semestre deste ano.

Estaria
quase tudo muito bem se a informação fosse tão verdadeira quanto uma nota de
três reais. Na verdade, as exportações brasileiras sofreram baixa de 4,38% no
acumulado entre janeiro e abril deste ano, comparadas a igual intervalo de
2019, passando de US$ 70,450 bilhões para US$ 67,361 bilhões, conforme já havia
sido divulgado pelo Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços
(Mdic). Não causa estranheza o fato de que esta área do governo estar sob as
asas do superpoderoso Ministério da Economia desde janeiro de 2019.

Os
dados desagregados mostram que a perda de mercados lá fora tem sido mais
intensa exatamente no setor industrial, um dos mais sacrificados por más
políticas econômicas nas últimas décadas. As vendas externas da indústria de
transformação simplesmente desabaram praticamente 13,0% no período, baixando de
US$ 41,6 bilhões para US$ 36,2 bilhões, nas estatísticas do Mdic. A queda nos
volumes embarcados (-6,3%) foi mais relevante para explicar o tombo, reforçado
ainda pela redução de 4,8% no preço médio de exportação.

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As
importações do setor cresceram levemente, variando 1,3% entre os primeiros
quatro meses do ano passado e igual período deste ano, avançando de US$ 50,3
bilhões para US$ 51,2 bilhões. O resultado final foi um salto de 72,4% no
déficit comercial da indústria, que avançou de US$ 8,7 bilhões para US$ 15,0
bilhões em grandes números. Foi o déficit comercial mais elevado para o período
desde 2015, quando havia somado US$ 18,3 bilhões, na série estatística do Mdic.

Destaques negativos

Dois
setores apresentaram os piores resultados no quadrimestre analisado,
destacando-se aqui a indústria de material de transporte (que inclui veículos
de carga e de passeio, aviões e embarcações). Nesta área, o déficit comercial
experimentou alta de 163,6%, saltando de pouco menos de US$ 1,20 bilhão para
US$ 3,162 bilhões. Na indústria de máquinas, aparelhos e instrumentos
elétricos, as importações superaram as exportações em US$ 10,886 bilhões, o que
correspondeu a um incremento de 37,2% em relação ao déficit comercial de US$
7,938 bilhões nos primeiros quatro meses do ano passado. Nas duas áreas, as
exportações despencaram 28,4% e 51,3%, baixando de US$ 5,445 bilhões para US$
3,90 bilhões no setor de máquinas e aparelhos elétricos e de US$ 5,269 bilhões
para US$ 2,569 bilhões na indústria de material de transporte.

Balanço

·  
Parte
nada desprezível da queda nas vendas de veículos, aviões e embarcações deveu-se
ao encolhimento da economia argentina, que afetou drasticamente os embarques de
automóveis. As vendas de veículos de passageiros e de cargas sofreram perdas,
pela ordem, de 35,8% e de 23,2%, com retração ainda de 44,8% nas vendas de
aviões.

·  
Ainda
na indústria de transformação, os fabricantes de plásticos e suas obras
reduziram as exportações em 13,4% (de US$ 1,545 bilhão para US$ 1,338 bilhão),
enquanto os embarques de produtos químicos indicaram redução de 7,52% (de US$
3,275 bilhões para US$ 3,029 bilhões).

·  
Como
exceção, as vendas externas de produtos da indústria de alimentos anotaram
elevação modesta de 0,5%, saindo de US$ 5,671 bilhões para US$ 5,699 bilhões.

·  
A
queda das exportações totais poderia ter sido muito mais severa não fossem as
contribuições das vendas de soja em grão e de petróleo e seus derivados.
Somados, os dois grupos de produtos responderam por um terço das vendas
externas totais do País no acumulado até abril deste ano (ou 33,4%, o que se
compara com uma participação somada de 27,1% no primeiro quadrimestre de 2019).

·  
A
soja em grão, que teve na China o principal destino (73,4%), registrou alta de
28,2% nas exportações, saindo de US$ 8,967 bilhões para US$ 11,496 bilhões. As
vendas externas de petróleo e derivados avançaram de US$ 10,140
bilhões para US$ 11,026 bilhões, numa variação de 8,7%.

·  
Excluindo-se
soja, petróleo e derivados, os demais setores da economia viram suas vendas ao
exterior caírem de US$ 51,343 bilhões para US$ 45,311 bilhões, em baixa de
11,75%.

·  
Não
deve novamente causar estranheza o fato de a balança comercial caminhar em
direção oposta àquela indicada pela (falta de) política de relações exteriores.
O alinhamento automático aos Estados Unidos, numa demonstração explícita e
jamais vista de submissão, não tem se traduzido em resultados concretos. As
exportações brasileiras para aquele mercado despencaram 24,14% no primeiro
quadrimestre, encolhendo de US$ 9,217 bilhões (13,08% do total) para US$ 6,992
bilhões (10,38%).

·  
As
compras brasileiras de produtos norte-americanos cresceram 11,87%, de US$ 8,955
bilhões para US$ 10,018 bilhões. Em consequência, o magro superávit comercial
registrado em 2019 (até abril), na faixa de US$ 267,07 milhões, transformou-se
num rombo de US$ 3,026 bilhões.

·  
As
exportações para a China aumentaram 10,94% (de US$ 18,799 bilhões para US$
20,855 bilhões, representando 30,96% do total). Como as importações de produtos
chineses recuaram 7,35% (para US$ 11,847 bilhões), o saldo comercial bilateral
saltou quase 50%, de US$ 6,012 bilhões para US$ 9,008 bilhões, ou seja, 76,3%
de todo o superávit do Brasil com o resto do mundo.