Dívida externa do setor privado aumenta 13,2% em onze meses

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 04 de janeiro de 2024

A perda de valor do dólar em relação ao real nos últimos 12 meses aparentemente teria estimulado o setor privado, o que inclui empesas dos setores financeiro e não financeiro, a contratar novas dívidas em moeda estrangeira ao longo dos 11 primeiros meses do ano passado, ao mesmo tempo em que o setor público percorria trajetória inversa, reduzindo seu endividamento externo. As estatísticas do setor externo divulgadas ontem pelo Banco Central (BC) registram uma variação de 5,23% para o saldo da dívida externa bruta do País entre dezembro de 2022 e novembro do ano passado, avançando de US$ 319,634 bilhões para US$ 336,336 bilhões, numa variação mais do que compensada pelo aumento nas reservas internacionais mantidas pelo País.

No setor público, contemplando setores não financeiros e financeiros, a dívida registrou baixa de 8,0% desde dezembro de 2022, caindo de US$ 120,431 bilhões para US$ 110,785 bilhões, que dizer US$ 9,649 bilhões a menos. O aumento foi integralmente explicado pelo crescimento observado no estoque de dívidas em poder do setor privado, que experimentou alta de 13,23% na mesma comparação, subindo de US$ 199,20 bilhões para US$ 225,551 bilhões, num acréscimo de US$ 26,351 bilhões. Parte do crescimento pode ser associado ao movimento do câmbio num período mais recente, marcado pela valorização do real diante do dólar – o que, por sua vez, reforça mais uma vez as análises indicando que os juros domésticos continuavam em níveis exageradamente elevados. Entre o final de novembro de 2022 e igual período do ano seguinte, a cotação do dólar em reais havia anotado queda de 6,8%, passando de R$ 5,29 para quase R$ 4,94, conforme acompanhamento do BC.

“Chuva” de dólares

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Não por outra razão, a entrada líquida de dólares destinados a aplicações em títulos de dívida pública e privada disparou no ano passado, com salto de 476,96% apenas em novembro. Naquele mês, a alta especulação internacional destinou ao mercado de dívida brasileiro pouco mais de US$ 2,604 bilhões, o que se comparou com “meros” US$ 451,41 milhões no mesmo mês de 2022. Os ingressos totais, ainda sem descontar os dólares que saíram do Brasil para aplicações em títulos de dívida fora do País, atingiram US$ 7,991 bilhões apenas em novembro passado, crescendo 56,37% em relação a igual mês de 2022, quando esse tipo de ingresso havia alcançado perto de US$ 5,110 bilhões. Em 12 meses, mais de US$ 40,314 bilhões engrossaram o fluxo de dólares estacionados no mercado brasileiro de dívida, elevando o valor acumulado nos 11 meses iniciais do ano de US$ 53,799 bilhões em 2022 para US$ 94,113 bilhões, correspondendo a um incremento de 74,93%.

Balanço

  • O crescimento relativo da dívida bruta total, correspondendo a um valor adicional de US$ 16,702 bilhões, foi amplamente compensado pelo avanço das reservas internacionais, que subiram 7,30%, de US$ 324,703 bilhões em dezembro de 2022 para US$ 348,406 bilhões em novembro do ano passado. Registrou-se um acréscimo, portanto, de US$ 23,703 bilhões. Vale dizer, o valor dos dólares acrescidos às reservas foi praticamente 41,9% mais elevado do que o avanço do estoque da dívida em valores absolutos.
  • Além disso, descontadas as reservas, o País continuava como credor líquido em suas relações com o restante do mundo, com crédito de US$ 35,222 bilhões, o que correspondeu a um aumento de 28,17% em relação a dezembro de 2022, quando o saldo credor líquido do País havia alcançado US$ 27,483 bilhões.
  • A estratégia de investidores/especuladores estrangeiros e mesmo de brasileiros que decidiram trazer de volta dólares aplicados no exterior tem sido orientada claramente pelas possibilidades de ganhos fáceis e rápidos abertas pela política de juros altos praticada pelo BC. Ao longo do ano, os investimentos estrangeiros pretensamente destinados ao setor produtivo vinham em tendência decrescente, com modesta reação em novembro – o que não chegou a alterar os rumos observados de forma geral para o conjunto dos investimentos diretos no País ao longo de 2023.
  • Em novembro, de fato, registrou-se um leve crescimento, com o investimento direto variando de US$ 7,583 bilhões em novembro do ano passado para praticamente US$ 7,780 bilhões no mesmo mês deste ano, num tímido incremento de 2,60%. No acumulado dos primeiros 11 meses do ano passado, foram investidos no País algo próximo a US$ 52,716 bilhões, o que representou uma retração de 35,9% frente a US$ 82,243 bilhões em igual período de 2022, numa queda de US$ 29,526 bilhões.
  • Parcela relevante dessa redução pode ser explicada pelo tombo de 85,59% nas operações entre empresas, envolvendo filiais e matrizes de empresas estrangeiras e brasileiras com operações fora do Brasil. Esse tipo de investimento encolheu de alguma coisa acima de US$ 17,190 bilhões para US$ 2,477 bilhões, numa redução de US$ 14,713 bilhões.
  • Os dados parecem reforçar o caráter meramente especulativo que tem caracterizado a conta de capitais do País, com maior parte dos dólares que entram no mercado brasileiro sendo destinada a aplicações no mercado de juros. O investimento líquido (entradas menos saídas) em ações aqui dentro, por exemplo, desabou 81,86% no acumulado entre janeiro e novembro do ano passado em relação aos mesmos 11 meses de 2022. Em dólares, esse tipo de aplicação despencou de US$ 8,789 bilhões para US$ 1,593 bilhão, ou seja, perto de US$ 7,196 bilhões a menos.
  • Com saldo comercial recorde, impulsionado pela redução das importações, o déficit na conta de transações correntes (que resume as relações do País com o resto do mundo) desabou 47,35% em 2023, considerando os dados acumulados nos 11 meses iniciais do exercício, caindo de US$ 42,165 bilhões entre janeiro e novembro de 2022 para US$ 22,200 bilhões – uma melhora equivalente a US$ 19,964 bilhões.