Indústria pisa no freio, devolve ganhos e retorna aos níveis de fevereiro de 2020

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 04 de agosto de 2021

A indústria pisou literalmente no freio em junho, emitindo mais uma vez sinais de falta de dinamismo para sustentar uma recuperação mais duradoura e de maior intensidade. A produção do setor só tem conseguido apresentar resultados positivos quando cotejados com os números do ano passado, quando o desempenho havia sido drasticamente afetado pela pandemia e pelas medidas que se seguiram de distanciamento social e de suspensão de atividades em diversos setores da economia. Conforme a pesquisa mensal da produção industrial do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a produção empacou na saída de maio para junho e retornou aos níveis de fevereiro do ano passado – vale dizer, em um ano e quatro meses, a indústria virtualmente não saiu do lugar.

Na avaliação do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), junho deste ano “foi mais um mês de obstrução da retomada industrial (…), confirmando que o primeiro semestre poderia ter sido muito melhor do que foi, se o País não tivesse demorado tanto para avançar na vacinação contra a Covid-19 e não tivesse interrompido as medidas emergenciais em meio ao segundo surto de coronavírus”.

No balanço da primeira metade do ano, quando considerada a variação mês a mês, com os devidos ajustes sazonais entre um período e outro, a indústria registrou “três meses de perda de produção, dois meses de estabilidade e apenas um único mês de crescimento, em maio”, anota ainda o instituto. Para acrescentar em seguida que o cenário foi ainda pior no caso da indústria de transformação, que enfrentou cinco meses de baixa e somente um positivo (em maio deste ano a produção do segmento havia avançado 1,2% frente a abril, quando havia sofrido baixa de 2,1%). Na comparação entre junho deste ano e dezembro do ano passado, a produção no setor de transformação encolheu 5,8%, diante de retração de 3,2% acumulada pela indústria como um todo. “Isso significa que boa parte do que foi conquistado na recuperação de 2020 foi perdido em 2021”, reforça ainda o Iedi.

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Celebração excessiva

Na verdade, a celebração em torno dos números de maio parecia carregar certo excesso diante dos resultados apresentados pela indústria nos meses imediatamente anteriores. Como mostra o IBGE, os dados atualizados mostram que a produção acumulou perdas de 4,7% entre fevereiro e abril, o que nem de longe havia sido compensado pela elevação de 1,4% colhida em maio, sempre em relação ao mês anterior. Em junho deste ano, tomando dados sazonalmente ajustados, entre os 26 setores da indústria, a parcela maior (14) produziu em junho volumes mais baixos do em fevereiro de 2020, antes da pandemia. Para 12 setores, a produção continuou a superar aquela realizada no último mês antes de o Sars-CoV-2 desembarcar no País, com destaque para os setores de máquinas e equipamentos, com alta de 23,1% na comparação entre junho deste ano e fevereiro do ano passado, e para outros equipamentos de transporte (mais 16,6%). No lado mais negativo, confecções e montadoras de veículos registravam perdas de 15,9% e de 15,2% respectivamente.

Balanço

  • A comparação com períodos idênticos do ano passado tem sido favorecida pelo nível muito baixo da produção. Como observa o Iedi, “se a indústria como um todo registra avanço acumulado de janeiro a junho de 2021 (+12,9%) frente ao mesmo período do ano passado é, em grande medida, devido a uma base de comparação extremamente deprimida e ao carregamento estatístico provocado pela reação do segundo semestre de 2020, quando houve melhora no quadro sanitário e medidas emergenciais mais robustas para lutar contra os efeitos econômicos da pandemia”.
  • O ganho acumulado no primeiro semestre deste ano deve ser comparado com a retração de 10,9% registrado pela pesquisa do IBGE na primeira metade do ano passado. Mas mesma a comparação anual tem apresentado certa desaceleração mês a mês, na medida em que a base do ano passado vai se tornando menos achatada, o que apenas reafirma o pouco poder de fogo da indústria para sustentar taxas mais alentadas de crescimento.
  • Em fevereiro deste ano, a produção havia avançado 0,3% diante do mesmo mês de 2020, quando a indústria chegou a anotar recuo de 0,3%. Em março, a produção avançou 10,5% neste ano, mais caiu 3,9% em igual mês de 2020. O salto de 34,7% em abril deu-se frente ao tombo de 27,7% registrado no mesmo mês do ano passado. O crescimento atingiu, em maio, 24,0%, o que compara com o retrocesso de 21,9% no mesmo mês de 2020.O ritmo do avanço industrial caiu pela metade em junho, com a taxa passando a indicar alta de 12,0% frente ao mesmo mês do ano passado, período em que a produção havia sofrido baixa de 8,7%.
  • Puxado pelo setor de veículos, a indústria de bens duráveis ilustra melhor essa tendência. A produção havia desabado 85,0%, 69,7% e 34,8% em abril, maio e junho do ano passado, na comparação com os mesmos meses de 2019. Neste ano, na mesma sequência, apresentou saltos impressionantes de 431,1%, 149,4% e, por último, já em junho, de 31,0%. As montadoras de veículos, num salto de 81,5%, responderam por um terço do crescimento de 12,0% registrado por toda a indústria em junho deste ano (sempre em relação ao mesmo período de 2020).
  • Analisados mais detidamente, com base nas séries estatísticas da Associação Nacional de Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), a produção de veículos em geral, incluindo automóveis, ônibus e caminhões, superou 1,148 milhão de unidades na primeira metade deste ano, crescendo 57,5% diante dos 729,27 mil veículos montados nos seis primeiros meses de 2020. Comparada ao primeiro semestre de 2019, no entanto, a produção encolheu 22,1%, saindo de 1,474 milhões de unidades.
  • Foi o terceiro pior resultado da indústria, superando apenas os números de 2020 e de 2016 (com 1,034 milhão de veículos montados), quando a economia estava em recessão. Comparada ao seu melhor momento, registrado em 2013 (em torno de 1,884 milhão de unidades produzidas), a queda chega a 39,0%. Esse parece ser uma das razões para o número de empregados no setor ter chegado a junho deste ano ao menor nível desde outubro de 2007. Para comparar, as montadoras empregavam 119.442 pessoas em junho passado, diante de 118.600 há quase década e meia. Entre outubro de 2013 e junho de 2021, as montadoras demitiram 40.206 trabalhadores, afastando um quarto dos empregados.