Quase 70% dos trabalhadores por conta própria gostariam de ter emprego fixo

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 13 de dezembro de 2022

A retrato apresentado pela Sondagem do Mercado de Trabalho, apenas recém-lançada pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), parece bem menos lisonjeiro do que sugerem os números apurados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (PNADC), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Não que um trabalho “contrarie” o outro. Na verdade, são leituras complementares do mercado de trabalho, já que a sondagem do Ibre acrescenta uma avaliação mais qualitativa sobre o setor, o que a pesquisa quantitativa do IBGE não se propõe a fazer, considerando-se o foco definido pelos institutos para cada um dos trabalhos.

Como mostra o economista Luiz Guilherme Schymura, diretor do Ibre, a mais recente edição da PNADC, cobrindo o trimestre entre agosto e outubro deste ano e divulgada em 30 de novembro, mostra queda na taxa de desemprego para 8,3% e um avanço da população ocupada para 99,661 milhões, o dado mais elevado da série histórica da pesquisa, iniciada em 2012, com variação em torno de 1,0% frente aos três meses imediatamente anteriores e de 6,1% em relação ao trimestre encerrado em outubro de 2021.

“São números que podem sugerir um mercado de trabalho pujante, mas a sensação de muitos observadores é de que a situação do emprego e da renda no Brasil não é exatamente radiosa”, acrescenta Schymura, que assina a Carta do Ibre da edição deste mês da revista Conjuntura Econômica, da FGV. A mais nova sondagem do Ibre, iniciada em agosto deste ano, mas que teve sua primeira edição divulgada recentemente, reforça o economista, “revela aspectos qualitativos do mercado de trabalho nacional, com destaque para a insegurança em relação à renda, bem menos róseos que a imagem a partir apenas dos dados quantitativos”.

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Insatisfação

Entre outras conclusões, a sondagem mostra que um largo contingente dos trabalhadores atualmente incluídos entre aqueles que trabalham por conta própria preferiria – se pudesse – exercer outro tipo ocupação, que oferecesse maior segurança e qualidade de vida para si mesmo e para sua família. Conforme a sondagem do Ibre, “69,6% dos trabalhadores por conta própria no Brasil gostariam de se tornar empregados numa empresa privada ou pública”, sublinha Schymura. Os demais 30,4% prefeririam continuar onde estão, seja porque esse tipo de ocupação permite certa flexibilidade no trabalho, seja por alegrarem ganhar mais do que se tivessem um emprego fixo, com carteira assinada.

Balanço

  • Entre os que gostariam de deixar a condição de “conta própria”, nome mais “chique” para os não menos famigerados “bico”, ambulantes e variantes do tipo, em torno de 64,5% gostariam de ter acesso a benefícios negados aos trabalhadores por conta própria, mas acessíveis àqueles com empregos formais, ou ter rendimentos fixos, que assegurem alguma previsibilidade em relação a fluxos de renda – o que notoriamente não se observa nos trabalhos por conta própria, posto que os rendimentos neste segmento flutuam mês a mês.
  • A proporção dos trabalhadores que gostariam de ter um emprego formal, com carteira assinada, salário assegurado ao final do mês e benefícios adicionais, sobe para 74,9% entre os trabalhadores com renda mensal de até dois salários mínimos.
  • Os trabalhadores por conta própria responderam em novembro deste ano por 25,50% do total de ocupados e foram colocados nessa posição, em grande parte, pela necessidade de assegurar meios de sobrevivência, já que são ocupações que não asseguram direitos e nem benefícios, como se sabe. Esse contingente, que somava em torno de 25,410 milhões de trabalhadores ao final do trimestre agosto a outubro deste ano, não recebe 13º salário, não tem direito a férias, descanso semanal, seguro desemprego e nem à aposentadoria.
  • Entre os informais, que se aproximavam de 38,965 milhões de trabalhadores também no trimestre finalizado em outubro passado, representando perto de 39,1% do total de ocupados, “o desejo de formalização é de 87,7%”, registra ainda Schymura. Usando os dados da sondagem, o economista aponta mais uma vez que esse percentual chega a ser maior entre aqueles informais com renda de até dois salários mínimos, atingindo 89,5%. O percentual recua para 75,8% nas categorias de informais com rendimentos mensais superiores a dois salários mínimos, mantendo-se, no entanto, em níveis bastante expressivos.
  • Desde que o mercado de trabalho chegou a seu ponto mais baixo, com o total de ocupados desabando para 82,590 milhões no trimestre junho a agosto de 2020, em meio à fase mais crítica da pandemia (quase 12,925 milhões a menos do que em dezembro de 2019, num tombo de 13,5%), o total de informais aumentou 25,3%, saindo de 31,096 milhões para 38,960 milhões. A informalidade foi responsável por 46,1% dos 17,071 milhões de empregos gerados entre agosto de 2020 e outubro de 2022.
  • Considerando o total de pessoas ocupadas, a sondagem identificou que em torno de 31,8% delas conseguiriam se manter e à sua família por um mês caso venham a perder seu emprego e principal fonte de renda e 34,2% teriam reservas para um a três meses. Num cenário de perda de emprego, portanto, dois terços dos ocupados (66,0%) “se aguentam financeiramente por no máximo três meses”, registra ainda Schymura. Por classes de rendimento, essa proporção sobe para 72,5% entre os que recebem até dois salários mínimos mensais. O dado sugere, na sua avaliação, “uma capacidade de poupança não muito expressiva das famílias brasileiras”.
  • Olhando para um prazo mais amplo, nada menos do que 67,6% dos que responderam à sondagem declararam-se muito preocupados com a perspectiva de “não estarem tão bem financeiramente quanto gostariam”. Na sequência, em torno de 61,9% preocupavam-se com o risco de suas famílias não estarem “bem financeiramente”, um nível elevado de incerteza em relação ao futuro.