Coluna

“Reação” em maio ainda deixa a indústria 34% abaixo do seu pico

Publicado por: Sheyla Sousa | Postado em: 03 de julho de 2020

Antes
que comecem a soltar rojões lá pelas bandas da Esplanada de Ministérios, não há
analista sério que reconheça nos números da indústria em maio o vislumbre de
uma retomada digna do nome. A produção avançou 7,0% frente a abril, segundo
apurou a pesquisa mensal realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), mas veio de um tombo de 18,8% na passagem de março e abril
– que, na visão de alguns, pode ter sido o “fundo poço” para a atividade
industrial. A continuidade dessa tendência dependerá da evolução da pandemia e,
como consequência evidente, das medidas adotadas ou que vierem a ser adotadas
por governadores e prefeitos para conter seu alastramento.

Em
maio, na descrição do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial
(Iedi), “depois de definir e adotar protocolos de segurança sanitária e
reorganizar seus processos internos, o setor conseguiu religar unidades e
linhas de produção que tinham sido paralisadas no final de março e em abril”.
Assim, conseguiu “compensar parte das perdas” que havia sofrido no bimestre anterior,
ainda conforme o Iedi. Num complicador adicional, os dados do IBGE mostram que
o percentual de produtos que apresentaram crescimento em relação a maio do ano
passado não passou de 17,3% – ainda abaixo dos 19,1% registrados em abril

A
evolução, no entanto, foi suficiente apenas para trazer a produção para níveis
ainda 22,9% abaixo daqueles registrados em abril de 2018, antes da greve dos
caminhoneiros ocorrida naquele ano. Comparado a seu melhor momento, registrado
em maio de 2011, o setor acumula perdas de 34,1%. Vale dizer, foram perdidos no
caminho, ao longo de meses de baixo crescimento e duas crises severas (a
recessão de 2015/16 e o retrocesso experimentado atualmente em função da
pandemia e das medidas de restrição à circulação de pessoa), pouco mais de dois
terços da produção.

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Os
dados mais recentes não significam, reforça o Iedi, “necessariamente, que a
indústria já esteja no caminho da recuperação, tanto é que o nível de produção
permaneceu 21% abaixo daquele de fevereiro de 2020, isto é, antes do impacto da
pandemia de Covid-19 e das medidas de isolamento social”. Na comparação com
maio, por exemplo, a produção apresentou baixa de 21,9%, no sétimo resultado
mensal consecutivo, o que mostra, nunca é demais reforçar, que o setor já
enfrentava dificuldades para conseguir operar muito antes da crise sanitária se
instalar. Para relembrar, a queda havia sido de 27,3% em abril. Há um longo e
penoso caminho a ser percorrido antes de considerar a recuperação como favas já
contadas.

Distorções

Na
leitura do Banco Fator, por isso mesmo, “apesar do avanço de abril para maio, a
indústria deve encerrar o segundo trimestre do ano com forte queda em relação
ao primeiro, pelo peso da contração de abril. A produção acumulada de março a
maio registrou queda de 18,2% em relação ao trimestre móvel imediatamente
anterior”. O Iedi, por sua vez, considera que o “recente acirramento da
concorrência global”, com o acúmulo de ociosidade em toda a economia ao redor
do globo, tem tornado mais explícitos os problemas de competitividade
enfrentados pela indústria brasileira e “comprometido as exportações da
indústria, que, por possuir cadeias produtivas mais longas, está mais exposta às
distorções da economia brasileira”.

Balanço

·  
O
avanço registrado de abril para maio foi puxado principalmente pelo aumento de
92,5% registrado na produção de bens duráveis, por sua vez influenciado
decisivamente pelo salto de 244,4% na produção de veículos. Analisados dura e
simplesmente, esses números poderiam dar a impressão de que as montadoras
teriam embarcado num surto de crescimento não apenas surpreendente, mas
totalmente anômalo.

·  
Mas
importa prestar atenção em outros indicadores para evitar conclusões
precipitadas e francamente equivocadas. Primeiramente, a indústria de bens
duráveis anotou perdas de 79,1% e de 24,2% nos dois meses anteriores, o que
deixa o setor ainda em posição “devedora”. Tomando o mês de fevereiro como 100,
a produção ainda acumula retração de quase 94,0% no período.

·  
Comparado
a maio do ano passado, a produção de bens duráveis encolheu 69,7%. Para ser
mais claro, como se isso fosse necessário, a indústria do setor perdeu quase
dois terços de sua produção.

·  
A
produção de veículos vem, da mesma forma, de dois meses de forte retração, com
baixas de 28,0% em março e de 89% em abril, acumulando queda de 41,5% entre
março e maio, a despeito de ter mais do que triplicado a produção em maio.
Claro, a comparação se deu em relação a um mês durante o qual praticamente não
se produziu carros no País. Comparada a maio, a produção de veículos
automotores registra tombo de 74,5%.

·  
A
segunda maior influência parece ter vindo do setor de bens de capital, que
conseguiu elevar a produção em 28,7% de abril para maio, depois de despencar
16,2% e 40,7% nos dois meses anteriores. Frente a fevereiro, a perda acumulada
gira em torno de 36%. Na comparação com iguais períodos de 2019, a produção no
setor, que sinaliza para onde caminha o investimento na economia, sofreu baixas
de 4,8% e de 4,6% em fevereiro e março e desabou 51,8% e 30,4% em abril e maio.
Nos cinco meses iniciais deste ano, a queda frente ao mesmo período de 2019
chega a 21,0% (com retração de 9,6% nos 12 meses encerrados em maio passado).

·  
“Coração”
da indústria, por alimentar todas as cadeias da produção industrial, o setor de
bens intermediários avançou 5,2% em maio, na comparação com abril, depois de
cair 3,7% e 15,1% em março e abril. Comparado aos níveis de fevereiro, a
produção do setor ainda estava 14,0% mais baixa. Em relação aos mesmos períodos
de 2019, a produção no setor registrou perdas de 1,5% em março, de 17,4% em
abril e de 14,6% em maio, fechando os cinco meses com queda acumulada de 6,7%.

·  
Nos
cinco primeiros meses deste ano, os setores de fabricação de veículos, máquinas
e equipamentos, confecções, metalurgia e bebidas responderam por 61,4% da
queda.