Quinta-feira, 28 de março de 2024

Ritmo de avanço da bioeletricidade desacelera fortemente desde 2016

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 05 de agosto de 2021

A capacidade instalada de geração elétrica no setor de biomassa chegou a crescer 67,3% entre 2010 e 2015, saltando de 7.927 para 13.259 megawatts, passando a representar 9,4% da capacidade total no País, saindo de 7,0% no início daquele período. Mas, entre 2015 e o ano passado, o avanço ficou limitado a 16,1%, com a capacidade final atingindo 15.396 MW. A fatia da biomassa na geração total retrocedeu para 8,8% segundo dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE). O crescimento médio entre 2016 e 2020, aponta Helder Gosling, diretor comercial e de logística da São Martinho, “não passou de 2,0% ao ano”. Ele lembra que há grande espaço para crescimento da bioeletricidade, considerando que somente 60% das usinas sucroenergéticas venderam excedentes de energia elétrica para a rede integrada no ano passado.

De acordo com a União da Indústria de Cana de Açúcar (Unica), considerando todo seu potencial técnico, com aproveitamento integral de todos os resíduos do processamento da cana e demais biomassas, reforma e modernização das caldeiras e ampliação do número de usinas que trabalham com a  cogeração de energia, o setor de bioeletricidade poderia entregar para a rede algo em torno de 200 mil gigawatts/hora (GWh), praticamente nove vezes mais o total de energia vendida em 2020, próxima a 22,6 mil GWh. “A mensagem é que estamos aproveitando apenas 11% do nosso potencial”, completa Gosling. A contribuição do setor ganha nova importância neste momento de crise hídrica, com os reservatórios registrando níveis historicamente baixos no Sudeste e Centro-Oeste, que concentram maior capacidade de geração hidráulica.

O setor espera, no entanto, uma melhora no cenário daqui em diante, especialmente a partir da consolidação do RenovaBio. Ricardo Busato Carvalho, diretor comercial BP Bunge Bioenergia, prevê que a oferta e a demanda de Créditos de Descarbonização (CBios) na B3 tenda a se equilibrar nos próximos dois anos, o que exigirá das usinas investimentos adicionais na expansão dos canaviais para dar suporte ao avanço esperado da cogeração. Segundo levantamento do Itaú BBA, o volume de CBios emitidos em 2020 havia superado a meta, reduzida para 14,9 milhões de títulos em função da pandemia, em pouco mais de 24,0%, alcançando 18,5 milhões de certificados. Até a primeira quinzena de julho deste ano, as emissões somaram 15,89 milhões de certificados, correspondendo a 63,8% da meta de 24,9 milhões de títulos. “O RenovaBio passará a ser a locomotiva do setor”, anima-se Busato.

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Previsibilidade

O programa, avalia Zilmar José de Souza, gerente de bioeletricidade da Unica, tende a assegurar maior previsibilidade ao setor, além de “agregar uma receita pela descarbonização, gerando mais investimentos”, com impactos positivos sobre a indústria de base e nos setores de serviços e produtos associados à cadeia, a exemplo da bioeletricidade. A biomassa chegou a responder por 32,5% do aumento anual da capacidade instalada de geração no país em 2010, somando 1.750 MW ao sistema, conforme Souza. Para 2024, espera-se que a fonte “agregue apenas 185 MW, representando apenas 3,0% da expansão total prevista”. Souza lembra que a marca histórica alcançada em 2010 resultou dos investimentos mais intensos realizados em meados da década anterior “e o RenovaBio pode ajudar na construção de condições institucionais semelhantes” daqui em diante.

Balanço

  • A expectativa do mercado, acrescenta Ricardo Kenzo, vice-presidente do Instituto de Engenharia, é de que as emissões de CBios atraiam perto de R$ 30,0 bilhões, o que deverá movimentar o “ciclo de retrofits de caldeiras, assim como a migração para novas tecnologias mais modernas e eficientes”. Muitas dessas tecnologias já estão disponíveis, a exemplo de sistemas que utilizam leito fluidizado borbulhante, que trazem ganhos de eficiência entre 8,0% e 15,0% frente aos sistemas de queima em grelha.
  • A partir da fusão, concluída em 1º de novembro de 2019, o grupo BP Bunge Bioenergia dedicou-se a otimizar o fluxo de biomassa entre suas 11 plantas, que operam em São Paulo, Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Tocantins, e definiu como prioridade ocupar toda sua capacidade nominal, próxima de 32,4 milhões de toneladas de cana por safra. No ciclo 2019/20, adianta Busato, as usinas exportaram para o grid de energia em torno de 1,193 mil GWh.
  • Diante da quebra da safra de cana na região Centro-Sul, numa redução próxima de 12,0% na previsão mais recente, saindo de 605,0 milhões para 535,0 milhões de toneladas – a depender o comportamento do clima até o final do ciclo –, a BP Bunge vai reforçar a utilização das caldeiras com a queima de 60,0 mil toneladas de cavaco de eucalipto na safra atual, o que deverá acrescentar, conforme Busato, mais 5,0% à geração de energia elétrica projetada para a safra 2021/22.
  • As nove unidades distribuídas pelos Estados de São Paulo, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul asseguram ao grupo Atvos uma capacidade nominal de geração de 857 MW, correspondendo a um potencial para gerar 3,1 mil GWh por safra, dos quais 2,7 mil GWh (ou 87,0% do total) estão disponíveis para venda ao mercado e 400 GWh são reservados para consumo próprio. “Como há ainda uma capacidade ociosa a ser preenchida, atualmente a venda de energia elétrica da Atvos é da ordem de 2 mil GWh, o que representa cerca de 16% do resultado da companhia”, completa Luiz Ricardo Fazzi, diretor comercial de energia do grupo.
  • Com ativos de geração de energia no estado da arte, conforme Fazzi, a Atvos tem concentrado investimentos em expansão e ganhos de produtividade nos seus canaviais e em aquisições de biomassa de terceiros como forma de otimizar a produção de etanol. Especificamente no setor de geração, o grupo avalia adequações nas caldeiras para permitir o uso de outros tipos de biomassa, além do bagaço de cana, que possam resultar em “melhoria do fator de capacidade para as térmicas”.
  • Em sua mais recente movimentação no mercado de energia renovável, a São Martinho contratou, em outubro de 2019, no leilão de energia nova A-6, a entrega de 177 GWh a partir de 2025, o que exigirá um investimento estimado em R$ 320,5 milhões, destinado à compra de equipamentos, a exemplo de caldeira e gerador, “além de ajustes nas instalações atuais” de sua planta em Pradópolis (SP). “Esse novo projeto representará um crescimento de cerca de 20% na capacidade de comercialização de energia pela São Martinho”, afirma Gosling.