Gás de cozinha representa 22% de gastos do orçamento básico familiar

As classes mais baixas foram as mais prejudicadas com esse aumento, seu gasto médio anual cresceu 25%, aponta pesquisa

Postado em: 13-04-2022 às 08h06
Por: Daniell Alves
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As classes mais baixas foram as mais prejudicadas com esse aumento, seu gasto médio anual cresceu 25%, aponta pesquisa | Foto: Pedro Pinheiro

Os consumidores têm percebido os aumentos sucessivos no preço do gás de cozinha nos últimos anos. Atualmente, o gás representa 22% dos gastos dos serviços públicos, aponta pesquisa feita pela Kantar, líder global em dados. O crescimento afetou os lares das famílias e principalmente os estabelecimentos comerciais, que chegam a gastar mais de R$ 10 mil com gás por mês. 

Em 2021, o gasto do brasileiro com gás de cozinha subiu 2 pontos percentuais em comparação com 2020, representando 17% do total desembolsado com serviços públicos (energia elétrica, água e esgotos, gás encanado, telefone fixo, gás de botijão, taxas). 

O proprietário de um restaurante em Goiânia, Boni Melo, explica que o estabelecimento adotou a estratégia de contenção, um processo de controle do local. As chapas e elétricos são desligados, além de qualquer equipamento que contenha o uso de gás. 

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“Não tem outra forma de permanecer no mercado sem repassar o valor ao cliente. Está muito complicado porque o descontrole da inflação no país desajustou nossa rotina de trabalho diariamente”, revela. 

O restaurante gasta em torno de 2,2 mil kilos de gás por mês na unidade matriz, o equivalente a cerca de R$ 12 mil por mês. “A pandemia nos afetou de uma forma muito drástica com o fechamento da casa por quatro meses. Há um histórico de dívidas e acertos trabalhistas. Se você fica sem faturar, os compromissos vencem e trazem um impacto bastante negativo”, avalia. 

Para atrair mais clientes, Boni ressalta que tem seguido o padrão de atendimento, além de realizar ações promocionais, a exemplo de happy hour e dobradinha de bebidas, e divulgação nas redes sociais. 

Classe mais baixa 

Conforme aponta a pesquisa, as classes mais baixas foram as mais prejudicadas com esse aumento, seu gasto médio anual cresceu 25% na comparação com 2020. Na classe DE o valor destinado para a compra de gás saltou de 18% do total das despesas com serviços públicos no lar em 2020 para 22% em 2021. Na classe C, o incremento foi de 15% para 17% e na classe AB subiu 1 ponto percentual, de 12% para 13%. 

A aposentada Rita Pereira, 69 anos, afirma que o preço do gás não está mais acessível como era antes. “Aqui perto de casa está R$ 115, eu acho um absurdo porque deveria ser um preço mais barato. Nós usamos gás todos os dias para tudo que vamos fazer, aqui não tem micro-ondas”, explica. 

Ela conta que as confraternizações e reuniões da família sempre acontecem na casa dela. “Minhas filhas fazem a comida. São umas 20 pessoas, então a gente acaba usando muito gás. Com esse preço a gente tem que economizar”, avalia. 

Abusivo

Para o professor e economista Aurélio Troncoso, o preço cobrado é abusivo. “Quando a gente fala de gás de cozinha, mostra que tivemos aumento esse ano. O preço do gás está sendo vendido a 4,48 o quilo. Nessa brincadeira, baixou para 4,23. O gás de 13 kg, por exemplo, teve R$ 3 de recuo nas refinarias”, explica.

“O problema é que ele vai para a distribuidora. A Petrobras gasta para retirar esses gás e levar até às distribuidoras cerca 51% do valor do gás. Já as distribuidoras gastam em torno de 36%. Cerca de 13% é o valor que o revendedor ganha”, completa. 

De qualquer forma, a pequena redução não chegará ao bolso do consumidor. “Pode acontecer de estabilizar esse preço durante certo período de tempo. As pessoas podem economizar tentando utilizar o mínimo possível de fogão. Não ficar acendendo o fogo para qualquer tipo de coisa. Fazer quantidade suficiente para almoçar e jantar e depois esquentar no micro-ondas”, recomenda. 

Acidentes 

Com o preço do gás nas alturas, as pessoas tem buscado outras formas de preparar as refeições, com álcool comprados em postos de combustíveis. Contudo, pode acarretar em acidentes. Na cidade de São Vicente (SP), uma mulher de 26 anos morreu após sofrer queimaduras por álcool 

Ela ficou gravemente ferida enquanto cozinhava com álcool combustível. Segundo familiares, a jovem utilizou do produto, pois não tinha condições para comprar gás de cozinha. “Ela não tinha dinheiro para comprar o gás, com o aumento do preço ainda, a única maneira que ela conseguiu foi cozinhar com álcool”, disse a tia da vítima. 

A mulher achou que a chama do potinho tinha acabado, virou o galão de álcool, o fogo veio para cima do galão e pegou no corpo dela. “Ela se assustou, sacudiu o galão, e foi para o corpo dela todo”, relatou a mãe da jovem. Após o acidente, a moça ficou internada por alguns dias no Hospital Municipal de São Vicente, aguardando uma vaga para ser transferida a um hospital de referência, mas não resistiu. 

Em fevereiro, outra jovem ficou em estado grave depois de uma explosão enquanto tentava acender o fogo com álcool para cozinhar. A vítima teve 10% do corpo queimado. O caso ocorreu na cidade de Curitiba (PR). 

Consumidores podem denunciar preços abusivos 

Caso o consumidor suspeite de preços abusivos, o Procon orienta fazer a denúncia para o telefone 151 (Goiânia) ou (62) 3201-7124 (interior). No último mês, o órgão fiscalizou depósitos de gás de cozinha localizados em Goiânia e em Aparecida de Goiânia para verificar uma possível prática de preços abusivos na venda do produto aos consumidores. A fiscalização ocorreu após o reajuste de 16,06% autorizado pela Petrobras, que entrou em vigor nas refinarias, no último dia 11.

Em visita aos revendedores de gás, os fiscais vão pedir a apresentação das notas fiscais dos últimos 30 dias, sendo uma por semana, para comparar os preços de compra e venda dos diversos segmentos que compõem essa cadeia de fornecimento e como o aumento foi repassado aos consumidores. Caso seja constatada prática abusiva, as empresas serão autuadas pelo órgão.

O gás de cozinha teve um aumento de 23,2% nos últimos 12 meses, entre março de 2021 e março de 2022, segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

Redução 

Já no último dia 8, a Petrobras anunciou redução no preço do gás de cozinha. De acordo com a companhia, a diminuição no valor de R$ 0,25 por quilo foi possível graças à taxa de câmbio, que tem refletido uma valorização do real frente ao dólar.

“Acompanhando a evolução dos preços internacionais e da taxa de câmbio, que se estabilizaram em patamar inferior para o GLP, e coerente com a sua política de preços, a Petrobras reduzirá seus preços de venda às distribuidoras. A partir de 9/4, o preço médio de venda de GLP da Petrobras para as distribuidoras passará de R$ 4,48 para R$ 4,23 por kg, equivalente a R$ 54,94 por 13kg, refletindo redução média de R$ 3,27 por 13 kg”, informou em nota. 

A Petrobras também reiterou seu compromisso com a prática de preços competitivos e em equilíbrio com o mercado, ao mesmo tempo em que evita o repasse imediato para os preços internos, das volatilidades externas e da taxa de câmbio causadas por eventos conjunturais.

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