Educação sofre sem estrutura, mas professores são otimistas
Professores querem continuar dando aulas apesar dos desafios do ensino público
Um dos maiores desafios da rede pública de ensino no pós pandemia é a falta de estrutura adequada para comportar os alunos e professores. Quantidade de banheiros insuficientes, poucas torneiras para milhares de alunos, salas cheias e alimentação inadequada agravam um dos maiores gargalos do poder público brasileiro.
Angélica Oliveira é professora da rede municipal de Goiânia há 21 anos. Ela atua na Escola Municipal de Tempo Integral Rui Rodrigues, que fica na Colonia Santa Marta. Oliveira aponta que a maior dificuldade encontrada com o retorno presencial das aulas foi com relação à higiene dos próprios estudantes que não tinham uma noção de limpeza, muitos devido à pobreza.
Além disso, ela relata que a própria precariedade da escola contribuiu para transtornos. “A escola que eu trabalho tem um bebedouro com duas torneiras para 150 alunos e apenas dois banheiros. Então, a questão sanitária está muito comprometida. Muitas pessoas se contaminam por Covid na escola”.
Angélica acredita que o grande diferencial do ensino público é o “material humano”. “Os professores gostam muito de trabalhar com a educação . Mas, as dificuldades são os projetos que vem de cima para baixo e muitas vezes não somos consultados. Então, quando a gente começa um trabalho de alfabetização sério , isso tudo é interrompido com outros projetos que não fazem parte de algo essencial, projetos mal pensados pela secretaria porque não são dialogados com quem realmente está na escola”, lamenta.
Ela acredita que a educação a distância não substitui o educador e que apesar das dificuldades e medos de pegar as doenças outro problema é a situação precária de internet e falta de condição de arcar com material como computadores e tablets de qualidade. Oliveira destaca três coisas que são essenciais para melhorar a educação pública, são eles: salários dos professores, estrutura das escolas e projetos que se preocupem com o aprendizado dos estudantes.
Enfrentando desafios
Apesar das dificuldades, quase a totalidade dos professores têm expectativa de melhora. Pesquisas do Núcleo de Novas Arquiteturas Pedagógicas da Universidade de São Paulo (USP) com o Instituto Iungo, apontam que 97% dos educadores também acreditam que a escola pode melhorar. A pesquisa com o tema “O professor da escola pública brasileira: seus sonhos, desejos e projetos de vida” , teve como participação na primeira etapa cerca de 2 mil docentes, destes 83% indicaram que a Educação ocupa papel central em seus projetos de vida e que pretendem seguir atuando na educação pública.
Resultado
As informações da pesquisa foram coletadas em 2021, com o cenário pandêmico e de aulas remotas. O que chama a atenção é que os questionários aplicados não eram de múltipla escolha, mas descrição pessoal dos próprios educadores, ou seja, um perguntas de resposta aberta. Ao falar sobre projetos de vida, um professor conta que vê no concurso público uma forma de mudar de vida.
“Quero passar em um concurso público, e com isso poder atuar por mais tempo em uma escola, para realizar alguns projetos. Quero passar em um concurso público para ter estabilidade e mais liberdade de ação com meus alunos. Quero fazer um mestrado em educação especial, gosto muito de trabalhar com esse público”.
No que se refere a continuar dando aulas, outro professor afirma que pode ajudar ainda mais na educação pública. “Já com 28 anos de magistério, ainda tenho muito fôlego e desejo contribuir mais. Tenho planos de criar um espaço mais envolvente para o ensino de ciências, um clube de ciências no contraturno, um espaço da robótica”.
O segundo estudo intitulado “A escola pública dos sonhos para os educadores brasileiros”, teve como base 1500 professores na qual 97% possuem a opinião de que a escola ideal seria diferente da atual e com mais inovação, com foco no protagonismo dos estudantes em seu processo de aprendizagem, com melhoria na infraestrutura, relações mais democráticas e um currículo mais flexível e conectado à formação de cidadãos.
Conclusão
Segundo o diretor do Instituto Iungo, Paulo Andrade, o instituto tem foco no desenvolvimento profissional do professor, uma forma de apoiar o professor ao longo de sua carreira, daqueles que têm a Educação como um aspecto central de seu projeto de vida. “O papel do professor não é simples, é de grande complexidade e para que isso aconteça na prática a gente precisa ter um conjunto de condições. Ter uma escola que acolha a criança e o adoslecente de forma adequada, com estrutura, tecnologia e boas condições de trabalho para os professores”.
Sobre o resultado da pesquisa, Andrade destaca que foi mostrado um forte compromisso por parte dos professores com a educação e com a própria profissão. A pesquisa mostra que eles querem ser professores cada vez melhores, aprender outras metodologias de ensino , ter um impacto maior na vida dos alunos. Outro aspecto apontado pela pesquisa é que os professores realmente se preocupam com o aluno , mas a maioria dos docentes afirmam que a escola dos sonhos seria diferente das que eles têm hoje – em organização , relações mais democráticas e inclusivas e trabalhar conteúdos como ética e cidadania.
Paulo Andrade conclui que ter um projeto de vida é o que o move a olhar criticamente para o entorno, desejar e buscar ferramentas para tornar o sonho, o mais real possível. “Não tem como construir uma escola melhor, que acolha melhor os estudantes , que valorize a comunidade, que promova o movimento integral dos alunos sem o professor”, destaca.