“Vape é diabólico”, diz pneumologista sobre riscos de cigarros eletrônicos

Anvisa decidiu manter a proibição de comercialização dos cigarros eletrônicos no Brasil devido aumento de doenças pulmonares e cardíacas

Postado em: 23-04-2024 às 12h00
Por: Ronilma Pinheiro
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O uso de dispositivos de cigarros eletrônicos, os famosos ‘vapes’, têm se popularizado entre os jovens | Foto: Joédson Alves/ABr

Em uma sociedade cada vez mais digital e conectada, surge uma preocupação crescente com o uso de dispositivos de cigarros eletrônicos, os famosos ‘vapes’, que têm se popularizado entre os jovens como uma alternativa aparentemente mais segura ao tabagismo tradicional. 

Depois de fumar cigarros tradicionais por uma década, o Luiz Fernando Moura Souto decidiu experimentar cigarros eletrônicos na esperança de reduzir os danos à saúde. No entanto, o que inicialmente parecia uma alternativa mais segura rapidamente se transformou em um pesadelo. Poucos meses depois que ele começou a usar cigarros eletrônicos, passou a sentir uma falta de ar persistente e tosse crônica.

“Consultei um médico e fui diagnosticado com problemas pulmonares graves, incluindo bronquite e enfisema. Fiquei chocado ao descobrir que minha tentativa de melhorar minha saúde havia causado danos ainda maiores aos meus pulmões. Agora, estou lutando para reverter os danos causados pelo uso de cigarros eletrônicos e estou determinado a abandonar completamente o hábito do tabagismo”, relata o jovem de 29 anos que trabalho como auxiliar de almoxarifado.

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No entanto, o pneumologista Marcelo Rabahi, lançou uma luz contundente sobre os perigos por trás  dessa tendência emergente. Ele enfatiza que, embora muitos possam perceber o vape como uma opção menos prejudicial à saúde em comparação com os cigarros convencionais, a realidade é muito mais complexa. Ele descreve os dispositivos de vape como “algo diabólico”, ressaltando múltiplos fatores que contribuem para sua periculosidade.

Um dos aspectos mais preocupantes destacados pelo médico é a rapidez com que a nicotina é absorvida pelo organismo quando inalada por meio do vape. As partículas extremamente finas liberadas pelos dispositivos alcançam as regiões mais profundas dos pulmões, permitindo uma rápida entrada da substância no sistema circulatório e, consequentemente, no cérebro. “Isso desencadeia um processo vicioso de liberação de neurotransmissores, resultando em uma dependência crescente e rápida”, explica.

Além da questão da dependência, o pneumologista alerta para os danos diretos causados pelos componentes químicos presentes nos líquidos vaporizados. A alta temperatura atingida durante o processo de vaporização pode causar lesões agudas nos tecidos pulmonares, aumentando o risco de doenças respiratórias graves, como bronquite e enfisema. Essas condições, que tradicionalmente se desenvolvem ao longo de décadas de exposição ao tabaco, estão agora emergindo em uma faixa etária muito mais jovem devido ao uso generalizado desses dispositivos entre os adolescentes.

Outro ponto destacado por Rabahi é a natureza atrativa dos sabores adicionados aos líquidos de vape, que podem ser especialmente sedutores para os jovens. Esses aromas, que variam de frutas a sobremesas, podem mascarar o sabor amargo da nicotina, tornando o vape mais palatável para os iniciantes. De acordo com o especialista, essa estratégia de marketing representa um risco significativo de iniciação precoce ao hábito de fumar, levando a uma escalada rápida do vício e a consequências devastadoras para a saúde a longo prazo.

À medida que a popularidade dos dispositivos de vape continua a crescer, Rabahi faz um apelo urgente às autoridades de saúde e aos legisladores para implementarem medidas rigorosas de regulamentação e controle. Ele destaca a importância de campanhas de conscientização pública e programas de prevenção direcionados aos jovens, a fim de desestimular o uso desses dispositivos e proteger a saúde das gerações futuras.

Ao falar sobre os impactos desses dispositivos na saúde pública, o médico expõe as preocupações em três frentes principais: a preparação do Sistema Único de Saúde (SUS) para lidar com a nova carga de pacientes, a disponibilidade de tecnologia para tratar essas doenças emergentes e as lacunas na legislação que permitem a proliferação do vape em espaços públicos.

Em relação à capacidade do SUS de lidar com o aumento de casos de doenças respiratórias relacionadas ao vape, Rabahi é categórico ao afirmar que o sistema não está preparado para essa nova demanda. Com o previsível aumento do número de pacientes procurando tratamento, especialmente entre os jovens, o SUS enfrentará desafios significativos para oferecer cuidados adequados e oportunos.

Quanto à disponibilidade de tecnologia para tratar essas doenças emergentes, o pneumologista reconhece que, embora os profissionais de saúde possuam conhecimento para lidar com os efeitos do vape, os recursos e equipamentos especializados podem ser limitados. Ele destaca a necessidade de investimentos adicionais em tecnologia médica e pesquisa para compreender melhor essas novas condições e desenvolver abordagens de tratamento mais eficazes.

No que diz respeito à legislação, a preocupação é com as lacunas que permitem o uso generalizado de dispositivos de vape em locais públicos, apesar das restrições rigorosas impostas ao tabagismo convencional. “Esta experiência me serviu como um alerta crucial sobre os perigos de todas as formas de tabagismo e me incentivou a buscar um estilo de vida mais saudável. Só sentindo na pele para ver os danos do vape”, conta Luiz.

Assim, Rabahi observa que a falta de regulamentação eficaz torna fácil para os fabricantes e comerciantes contornar as leis existentes, expondo os jovens ao risco de desenvolver dependência de nicotina e doenças respiratórias graves.

Ranahi também comenta sobre a recente decisão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) de manter a proibição da comercialização de dispositivos de vape no Brasil, uma medida que ele aplaude como crucial para proteger a saúde pública. Ele destaca a importância de uma fiscalização mais rigorosa para coibir o comércio ilegal desses dispositivos e evitar que mais pessoas sejam expostas aos seus perigos.

Por fim, Ranahi conclui ressaltando a necessidade de uma abordagem abrangente e coordenada para enfrentar os desafios apresentados pelo aumento do uso de cigarros eletrônicos. “Isso inclui investimentos em educação pública sobre os riscos associados ao vape, fortalecimento das políticas de controle do tabaco e promoção de estilos de vida saudáveis entre os jovens”, destaca.

O médico salienta que à medida que a discussão em torno dos dispositivos de vape continua a evoluir, é evidente que a colaboração entre autoridades de saúde, legisladores, profissionais de saúde e a sociedade civil será fundamental para mitigar os danos à saúde pública e proteger as gerações futuras dos perigos do vape.

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