Goiânia é dadaista

A cidade será batizada a “capital brasileira do dadaísmo” como parte das comemorações dos 100 anos deste movimento artístico

Postado em: 24-02-2016 às 00h00
Por: Redação
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A cidade será batizada a “capital brasileira do dadaísmo” como parte das comemorações dos 100 anos deste movimento artístico

Júnior Bueno

Se você é da opinião de que nada acontece em Goiânia, repense, porque, definitivamente, tudo acontece nesta cidade, como por exemplo, ela ser considerada a Capital Brasileira do dadaísmo. Sim, de todas as cidades que existem no Brasil, apenas a capital do pequi será a embaixadora nacional do movimento artístico que completou 100 anos neste mês. O dadaísmo foi um movimento da chamada vanguarda artística moderna iniciado em Zurique, na Suíça, em 1916, durante a Primeira Guerra Mundial, no chamado Cabaret Voltaire. Formado por um grupo de escritores, poetas e artistas plásticos – dois deles desertores do serviço militar alemão – liderados por Tristan Tzara, Hugo Ball e Hans Arp.

Dada, em francês, é o nome que se dá a um brinquedo de madeira em forma de cavalo. Reza a lenda que o nome surgiu ao se abrir o dicionário e apontar uma palavra ao acaso. Sua marca principal como estilo artístico é destruir todo sistema e código estabelecidos no mundo da arte. Trata-se de um movimento antipoético, antiartístico, antiliterário, visto que questiona até a existência da arte, da poesia e da literatura. O dadaísmo é uma ideologia total, usada na forma de viver e como a absoluta rejeição de todo e qualquer tipo de tradição ou esquema anterior. A partir de Zurique, o movimento tomou o mundo através da revista Dada e chegou a Barcelona, Berlim, Colônia, Hannover, Nova York e Paris.

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Até aí, tudo é história, mas a maneira com que o dadaísmo chegou a Goiânia é das mais interessantes. O artista plástico Babidu Barboza organizou, em 2002, um festival paralelo ao congresso da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) evento realizado na UFG. A ideia do artista, licenciado pela Faculdade de Artes Visuais (FAV) daquela universidade, era fazer uma série de exposições, manifestações artísticas e festas em sua casa, a que batizou de Cabaret Voltaire, em homenagem ao bar que foi berço do Dadaísmo em Zurique. Após o evento, festas temáticas foram organizadas sistematicamente no local e alcançaram algum sucesso.

Festas com nomes sugestivos como Ou Dada ou Dedesce atraíram a nata da classe criativa de Goiânia e suas performances ficaram marcadas, como uma sessão de sadomasoquismo como atração artística ou uma pin-up sentada em um balanço por horas, se balançando metros acima dos convidados. Outra performance foi a reprodução do quadro Nu Descendo a Escada, de Marcel Duchamp, em que pessoas nuas se movimentavam entre os convidados. Segundo Babidu, além das festas temáticas, o local serve também de base para produção e ensaio das manifestações artísticas do grupo que faz parte, o Grupo EmpreZa (não confundir com a empresa de RH). “Eu faço parte do grupo, que faz performances artísticas e como os dez membros do grupo estão espalhados pelo Brasil, o Cabaret funciona como pon­to de encontro,” diz ele. 

Todo esse burburinho chegou até Zurique. E o resultado é que o Cabaret Voltaire de cá, situado numa pacata rua do Conjunto Itatiaia, vai se tornar um braço do Cabaret Voltaire de lá. O projeto prevê uma exposição em Goiânia em setembro, chamada Dadá Itinerante, que terá Adrian Notz, diretor do Cabaret original e artistas com material sobre o movimento em texto, vídeo e áudio, além de documentos históricos. Antes disso, em abril, Babidu e outros dois artistas, Rafael Abdala e Jássica Goes irão a Zurique, para uma residência artística com Notz. 

Para essa comemoração dos 100 anos do movimento, o Voltaire de Goiânia vai receber intervenções, saraus e uma mostra coletiva. E então o espaço será consagrado como “se­de oficial do Dadá no Brasil”. O projeto de captação foi submetido e aprovado pelo Fundo Estadual de Cultura e Ar­te. A programação ainda não está totalmente definida, mas Babidu adiantou com exclusividade ao Essência que pretende convidar o poeta concretista Torquato Neto para participar do evento, e que o Grupo EmpreZa vai dar um suporte artístico e logístico. E sim, festas inesquecíveis também vão acontecer. “Pelo menos duas, uma de lançamento e outra de encerramento,” diz Babidu.

O movimento dadaísta se notabilizou pelo apreço ao nonsense em suas manifestações. Goiânia, a cidade mais acidentalmente nonsense do Brasil é de longe, a mais indicada para ser a embaixada do dadaísmo no País. Numa cidade onde as leis de cultura, a polícia, a gestão da educação e a mobilidade urbana não obedecem a qualquer lógica possível, nada mais justo que, pelo menos como manifestação artística, o caos nos torne mais notórios. 

 

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