A essência da arte indígena brasileira
Curso destaca a riqueza dos grafismos e a importância da valorização da produção artística dos povos originários
Por: Luana Avelar
A arte indígena brasileira vem ganhando cada vez mais espaço e reconhecimento no cenário contemporâneo. Com o objetivo de discutir e valorizar essa importante expressão cultural, a Vila Cultural Cora Coralina, em Goiânia, sediará o curso ‘Tradição, grafismos, curadoria e expografia dos bancos indígenas do Brasil’ de 13 a 17 de maio.
Ministrado pelo doutor em Artes Visuais Danilo Garcia, curador e produtor executivo da Coleção BEÏ, o workshop de 20 horas propõe um aprofundamento nas ricas tradições artísticas dos povos originários brasileiros. “Esse curso é uma oportunidade única para que os participantes possam mergulhar na compreensão da arte indígena, desde a sua simbologia e significados até os processos curatoriais e expográficos que envolvem a sua apresentação ao público”, afirma Danilo.
Durante as aulas, os alunos terão acesso a um conhecimento abrangente sobre a tradição, a confecção e a simbologia dos bancos indígenas brasileiros. Esses objetos, além de serem peças funcionais no cotidiano de diversas comunidades, carregam consigo uma riqueza de significados e expressões artísticas.
“Os participantes terão contato com os mecanismos de realização de uma curadoria e expografia, podendo aplicar esses conceitos em suas próprias obras ou na de outros artistas. O curso vai ter os bancos indígenas do Brasil como ponto de partida”, explica Danilo Garcia.
Grafismos indígenas: significados e técnicas
Um dos destaques do curso será a participação de Mayaware Mehinako, da aldeia Kaupüna, na Terra Indígena Xingu, em Mato Grosso. Mayaware é professor, graduado em Línguas, Artes e Literaturas, além de ser um renomado artista especializado em design estético em madeira.
Durante três dias do workshop (15 a 17 de maio), Mayaware irá abordar os grafismos indígenas, explorando seus significados, simbologias e técnicas de produção. “Irei falar sobre o grafismo de arte indígena, quais são os significados desses grafismos, em que momento que são usados, para que servem, quais são os símbolos de grafismos tradicionais do povo Mehinako e também do povo do Alto Xingu; sobre as técnicas das tintas, quais são as receitas, tudo mais”, detalha o artista.
Mayaware é um destacado defensor da visibilidade e do reconhecimento da arte indígena no Brasil. Ele ressalta a importância de discutir os desafios e as conquistas dessa expressão cultural, que vem ganhando cada vez mais espaço no cenário artístico nacional e internacional.
“Também irei discorrer sobre a situação de como é que é a arte indígena, quais são os desafios, quais são as importâncias da visibilidade e reconhecimento da arte criada por indígenas e como é que a gente está chegando no nível da exposição internacional e nacional, geração de renda dessa arte”, afirma.
Sua trajetória como artista é marcada pelo aprendizado com seu pai, Kawakanamu, desde a infância. Mayaware foi iniciado nos processos de produção de diversos objetos artísticos, como bancos esculpidos, cestos, colares, pás de beiju, zunidores, máscaras, remos e cerâmicas.
“Aprendi a lixar os bancos desde meus oito anos de idade com o ensinamento do meu pai, Kawakanamu, que me mostrava os processos, as técnicas de acabamentos do produto e os grafismos mehinaku. Eu sempre prestava atenção nas práticas de produção das peças e seguia sua orientação”, relata Mayaware.
Bancos indígenas: símbolos de tradição e utilidade
Os bancos indígenas, além de serem objetos utilitários no cotidiano de diversas comunidades, carregam consigo uma riqueza de simbologias e expressões artísticas. Esses assentos, esculpidos manualmente em madeira, são produzidos com técnicas e grafismos que refletem a identidade cultural de cada povo.
“No geral, os artistas utilizavam as seguintes madeiras: lixeira, ami, uluta, waxü e pé de pequi. Assim acompanhava e observava as obras de artes dos meus tios e primos verificando as características das peças de cada artista”, conta Mayaware.
Segundo ele, os bancos são frequentemente esculpidos na forma de animais, pássaros e peixes encontrados no território indígena do Xingu. Essa escolha de representação não é aleatória, mas carrega significados profundos relacionados à mitologia, cultura e costumes desses povos. “Isso também traz valorização de uso no cotidiano para o povo mehinaku. Os bancos se originam em nossos antepassados e continuamos mantendo a sua utilidade e produção. Através disso, a nova geração terá a pesquisa viva e registro sobre a estetização de bancos mehinaku”.
Visibilidade e reconhecimento da arte indígena
Mayaware acredita que a arte indígena brasileira ainda enfrenta desafios no que diz respeito à sua valorização e reconhecimento no âmbito público. Ele ressalta que, muitas vezes, essas expressões artísticas são classificadas apenas como ‘artesanato’ ou ‘arte popular’, negligenciando sua riqueza simbólica e cultural.
“Do meu ponto de vista, a arte indígena nunca foi debatida e discutida no âmbito público e as lojas não pagavam os preços justos para vendedores e artistas indígenas. Portanto, iniciei uma reflexão sobre divulgação da obra de arte dos artistas que são meus irmãos, primos e tios e que cujos trabalhos necessitam reconhecimento”, afirma.
Essa preocupação em valorizar e dar visibilidade à arte indígena é um dos principais objetivos do artista. Ele planeja cursar um mestrado com o tema do processo de estetização de bancos de madeiras para o povo mehinaku e sua importância de utilidade no cotidiano, buscando assim divulgar essa pesquisa de forma científica para a sociedade nacional e internacional.
“Outro intuito é divulgar essa pesquisa de forma cientifica para a sociedade nacional e internacional, que precisa conhecer e valorizar a arte indígena”, conclui Mayaware.
As inscrições para o curso ‘Tradição, grafismos, curadoria e expografia dos bancos indígenas do Brasil’ são gratuitas e podem ser feitas pelo link https://bit.ly/3QsM0yM. A programação faz parte da mostra ‘Bancos Indígenas do Brasil – Grafismos’, em cartaz na Vila Cultural até o dia 26 de maio.