Dados do IBGE desmentem recorde do emprego formal

Recorde? Emprego com carteira assinada encolhe quase 18% desde abril de 2015 | Foto: Reprodução

Postado em: 01-04-2021 às 08h00
Por: Sheyla Sousa
Imagem Ilustrando a Notícia: Dados do IBGE desmentem recorde do emprego formal
Recorde? Emprego com carteira assinada encolhe quase 18% desde abril de 2015 | Foto: Reprodução

Lauro Veiga

Você
compraria um fusca usado do ministro Paulo Guedes? Reflita atentamente antes de
tomar uma decisão, para não comprar gato por lebre. Pois o senhor ministro e
sua equipe têm vendido ao País uma recuperação esplendorosa da economia,
baseado principalmente nos números trazidos pelo Cadastro Geral de Empregados e
Desempregados (Caged). O saldo entre contratações e demissões, na versão
“turbinada” do Caged, que passou por alterações na forma de coleta dos dados e
igualmente nas categorias de empregados, tornando obrigatório o registro da
movimentação de temporários e empregados domésticos, escalou para 258,1 mil em
janeiro e saltou para 401,6 mil em fevereiro. Dois “recordes” consecutivos para
o mercado formal de trabalho.

Os
recordes alegados, no entanto, parecem ter tanto valor quanto uma nota de três
reais. Não parece mesmo fazer muito sentido esse crescimento vigoroso dos
empregos formais num momento em que a escalada da pandemia obriga o País a
conviver com recordes consecutivos de mortes, diariamente. O número igualmente
não bate com o aumento da incerteza e da desconfiança empresarial anotado pelas
pesquisas da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Quais empresários estariam
contratando pessoal a rodo num cenário tão ameaçador?

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A
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apresenta um cenário bem diverso
e, aparentemente, mais realista. O dado mais recente, referente ao trimestre
finalizado em janeiro deste ano, mostra que o total de empregos com carteira
assinada, incluindo trabalhadores dos setores público e privado e ainda
empregados domésticos, havia estacionado em 32,252 milhões, representando 37,5%
do total de pessoas ocupadas. Em seu melhor momento, o setor formal havia
registrado, nos três meses encerrados em abril de 2015, perto de 39,178 milhões
de trabalhadores com carteira, o que na época representava 44,3% de todas as
ocupações. Recorde de fato veio no total de pessoas desempregadas, que atingiu
o mais número da série histórica iniciada em 2012, chegando a 14,272 milhões de
trabalhadores, 1,5% acima do trimestre imediatamente anterior e 19,8% mais do
que no trimestre terminado em janeiro de 2020.

Estagnação

Na
comparação entre os dois dados, o mercado fechou 6,926 milhões de vagas com
carteira assinada, numa queda de 17,7% entre abril de 2015 e janeiro deste ano,
com perda de direitos para os trabalhadores, que deixaram de receber 13º
salário e férias, além de perderem a cobertura da Previdência Social.O ministro
e sua equipe escamoteiam a verdade, mais uma vez, quando alegam que o emprego
formal estaria em forte recuperação. A PNADC indica que as contratações de
pessoal com carteira assinada estão estagnadas praticamente nos mesmos níveis
de novembro do ano passado, mostrando leve recuo.

Balanço

A
série de dados da pesquisa mostra que o total de ocupados com carteira havia
desabado de 36,629 milhões no último trimestre de 2019 para 31,597 milhões
entre junho e agosto de 2020, nível mais baixo desde o começo da pandemia, até
aqui pelo menos. Foram fechadas, portanto, 5,032 milhões de vagas formais
naquele intervalo, demonstrando redução de 13,7%.

A
normalização de uma série de atividades que haviam sofrido restrições na
primeira onda da pandemia permitiu que o total de empregos com carteira
apresentasse ligeira reação nos meses seguintes, atingindo 32,386 milhões de
trabalhadores com carteira assinada no trimestre setembro-novembro (mais 2,5%).
Mas a “reação” significou a reabertura de 789,0 mil vagas de um total superior
a 5,0 milhões de empregos perdidos até agosto.

Até
janeiro deste ano (sempre considerando os dados trimestrais aferidos pela
pesquisa do IBGE), não houve mais contratações. Ao contrário, o setor formal do
mercado de trabalho fechou mais 136,0 mil vagas – o que, estatisticamente, é
considerado como “estabilidade”.

Desde
o quarto trimestre de 2015, quando os dados sobre informalidade passaram a ser
publicados integralmente, o número total de pessoas ocupadas baixou 6,3%,
saindo de 91,8 milhões para 86,025 milhões no trimestre encerrado em janeiro
deste ano – quer dizer, 5,775 milhões de trabalhadores foram demitidos no
período. Mas o total de trabalhadores com carteira encolheu ainda mais
fortemente, caindo de 38,586 milhões para aqueles 32,252 milhões, numa redução
de 16,4%, com fechamento de 6,334 milhões de vagas.

O
número de ocupados na economia vem sofrendo baixas desde o trimestre
fevereiro-abril do ano passado, na comparação com idênticos períodos do ano
anterior. Considerando um total de 94,552 milhões de ocupações geradas no
trimestre final de 2019, até janeiro deste ano foram liquidados 8,527 milhões
de empregos, num retrocesso de 9,0%.

Na
passagem do trimestre agosto-outubro de 2020 para os três meses encerrados em
janeiro deste ano, o total de ocupados avançou em torno de 2,0%, com abertura
de 1,725 milhão de vagas (um quinto do total perdido desde dezembro de 2019).
Ainda assim, 81,4% de todas as novas ocupações criadas no período foram
destinadas a informais (categoria que inclui trabalhadores sem carteira,
trabalhadores por conta própria e empregados sem CNPJ e trabalhadores que
prestam serviços à própria família, sem remuneração). Esse contingente avançou
de 32,714 milhões para 34,118 milhões, ou seja, em torno de 1,404 milhão a
mais.

Embora
o total de desempregados tenha sido recorde em janeiro deste ano, a taxa de
desemprego praticamente não se moveu entre o trimestre agosto-outubro de 2020 e
os três meses imediatamente seguintes, saindo de 14,3% para 14,2%. Incluindo as
pessoas em desalento e aquelas fora do mercado, mas que gostariam de trabalhar,
caso tivessem oportunidade, a taxa de desemprego se aproximaria de 26,8%.

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