Regulamentação de IA nas eleições combate fake news

Jurista, especialista em tecnologia de informação e presidente de partido corroboram importância da medida

Postado em: 29-02-2024 às 11h59
Por: Francisco Costa
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O TSE aprovou o uso de inteligência artificial nas eleições. Ficam proibidas manipulações para criar ou substituir imagem ou voz para prejudicar ou favorecer candidaturas | Foto: ABr

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aprovou, na terça-feira (27), resolução que regulamenta o uso de inteligência artificial (IA) nas eleições municipais deste ano. Nos destaques, ficam proibidas manipulações para criar ou substituir imagem ou voz (conhecidas como deepfakes) para prejudicar ou favorecer candidaturas e está obrigado o aviso claro para conteúdos desenvolvidos com o auxílio da IA. 

Ao Jornal O Hoje, o advogado Clodoaldo Moreira, professor e doutor em Direito Constitucional, vê as medidas como importantes para proteger a integridade das eleições e combater a disseminação de fake news em massa. “O TSE deu um passo importante com a aprovação da resolução referente ao uso inteligência artificial (IA, as quais destacam-se Sinalização de Conteúdos com IA, Proibição de Deepfakes, Restrição de Chatbots e Avatares, Responsabilidade das Redes Sociais, Apoio de Artistas e Influenciadores entre outros dispositivos)”, ressalta.

Para ele, contudo, é fundamental haver fiscalização rigorosa e conscientização por parte dos eleitores para garantir o sucesso dessas ações. “O avanço tecnológico exige constante adaptação das regras eleitorais e o TSE está buscando enfrentar esses desafios de maneira eficaz”, observa.

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Presidente do MDB em Goiânia, Agenor Mariano vê uma tentativa dos órgãos de controle em manter a maior transparência do processo eleitoral possível e essas medidas visam isso. “Precisamos, sim, nos adequar a modernidade. Não podemos proibir se ela pode contribuir para esclarecer e melhorar a compreensão do eleitor, mas se abre margens para manipulações fraudulentas, desinformação, é necessário criar medidas de controle que diminuam essa possibilidade”, observa.

Ele vê na resolução do TSE a ideia de não proibir, mas criar mecanismos para clarificar a transparência ou dificultar as falcatruas. “Não sabemos se isso vai dar certo. Teremos que esperar a eleição e entender os casos que ocorrerem, e melhorar para o próximo pleito o que for apreendido.” Para ele, trata-se de um processo de atualização constante, sempre baseado de uma eleição para outra. “Estamos vivendo um processo piloto que só a prática poderá dizer. Mas é uma medida que visa preservar a democracia”, arremata.

Tendência

Doutor em Ciências da Comunicação e Especialista em Políticas Públicas, o professor Luiz Signates, observa que as decisões do TSE seguem uma tendência mundial de estruturar cada vez mais o Estado e as leis ao combate à desinformação. “Neste caso específico, dentro das campanhas eleitorais, já que temos na história recente exemplos suficientemente descritos de malefícios provocados pelo uso estratégico das IAs especialmente para o combate a adversários”, elucida.

Ao enumerar sobre as tendências, ele cita duas principais. “Primeiro, a de conferir sinalização jurídica negativa (como contravenção ou crime, mas sempre algo a ser perseguido e punido) às diferentes formas de manipulação da informação e da imagem.” Em segundo lugar, a de responsabilizar por esses tipos de manipulação não apenas os seus autores, pessoas físicas ou jurídicas, mas também as plataformas de circulação dos conteúdos. “Com isso, o sistema jurídico tenta obrigar os sujeitos envolvidos a cumprir as regras do jogo”, observa.

Assim como Agenor, ele aguarda para saber a efetividade da medida. “Resta saber a efetividade disso. Não é incomum que as dinâmicas da internet consigam escapar na prática às restrições legais e jurídicas, já que não raro incluem sujeitos e atividades que extrapolam o âmbito das territorialidades nacionais e, portanto, da capacidade jurídica do Estado. Além disso, novas formas de manipulação não previstas podem surgir, gerando novos desafios ao sistema jurídico”, pontua. Para ele, esta luta é um dos preços da democracia. Além disso, afirma que é interessante que o sistema jurídica siga aprendendo a cada desafio.

Visão técnica

Especialista em Cibersegurança, Cleyton Salomé explica que a IA tem pontos positivos e negativos. “É um campo ainda em estudo. Se por um lado auxilia em tarefas do cotidiano e ajuda a poupar tempo em atividades profissionais, por exemplo, por outro, pode induzir uma pessoa desatenta – ou com nenhum conhecimento técnico sobre o assunto –  a cometer erros.” 

Ele acredita que, objetivamente, a IA tenha vindo para facilitar a vida das pessoas e das empresas, em um mundo que cada vez exige mais.  Desta forma, trata-se de uma ferramenta interessante, mas que pode acarretar consequências desastrosas. “Logo, o trabalho de conscientização e educação é tão importante. Entendo que esse trabalho é a base, somado ao uso de ferramentas de detecção de conteúdo falso para sinalizar as pessoas e, principalmente, punição severa para as plataformas e pessoas que publicarem conteúdo falso.” 

De acordo com o especialista, um vídeo ou áudio falso pode causar estragos irreversíveis e destruir a vida de muitas pessoas. Nestes casos, ele sugere que a pessoa faça pesquisa e busque por fontes oficiais. “Caso a pessoa tenha dúvida em relação à veracidade de um vídeo ou de parte dele, basta fazer uma busca reversa em sites de busca, por exemplo. Funciona assim: tira um print do frame do vídeo. Ou seja, pausa ele e tira um print. Depois envia esse print para o Google imagens, TinEye, Yandex ou Bing Imagens para investigar o histórico online do vídeo que há dúvida quanto à veracidade.”

Segundo ele, é possível identificar outros lugares em que esse vídeo foi postado, inclusive, sua possível versão original antes de ser alterada. Desta forma, ele vê as medidas como necessárias, mas talvez não suficientes. “O fato de existir regulamentação não impede que cibercriminosos manipulem informações para favorecer ou prejudicar determinado candidato. Precisa haver medidas de rastreamento e punitivas para coibir tal prática, além do trabalho de conscientização junto à população, orientando e ensinando a identificar conteúdos falsos.” 

Resoluções

Essa e outras resoluções foram relatadas pela vice-presidente do TSE, ministra Cármen Lúcia. Inclusive, entre as outras está a determinação às redes sociais para tomarem medidas que impeçam ou diminuam a circulação de fake news, ou fatos descontextualizados. Caso as plataformas não retirem conteúdos antidemocráticos ou com discursos de ódio, haverá a responsabilização.

Em outra resolução, ficou permitido que artistas e influencers demonstrem apoio a candidatos durante apresentações. Contudo, estas só são permitidas se voluntárias e gratuitas. Além disso, a Corte proibiu o transporte de armas e munições no dia do leito, medida já adotada em 2022 e que, a partir deste ano, se torna normal geral.

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