Obras de Hidasi mudam de museu

O museu, que está fechado, já teve o maior acervo de animais empalhados do mundo

Postado em: 23-03-2019 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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O museu, que está fechado, já teve o maior acervo de animais empalhados do mundo

Igor Caldas*

O Museu de Ornitologia de Goiânia foi criado e mantido durante muitos anos na casa de seu fundador e idealizador, o imigrante húngaro José Hidasi, que fundou o local em 1968, no bairro de Campinas em Goiânia. O museu, que está fechado, já teve o maior acervo de animais empalhados do mundo. A coleção do professor conta com mais de 120 mil peças e já foi avaliado em US$ 15 milhões. José Hidasi está com 92 anos e ainda consta no quadro de funcionários da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, que está catalogando suas peças para compor o termo de doação que será direcionado ao Memorial do Cerrado, instituição que faz parte da Universidade.

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O diretor administrativo do Instituto do Trópico Sub-Úmido da PUC Goiás, professor José Rubens Pereira, um dos profissionais envolvidos no trabalho de catalogação da coleção de Hidasi, fala sobre o fechamento do museu, em Campinas. “Devido à idade avançada, ele [José Hidasi] não estava dando conta de manter e trabalhar no museu por conta própria. Por isso o museu foi fechado. As peças vão ser doadas à Universidade. Ainda não foi feito por que temos que catalogar o acervo da coleção para fazer o termo de doação”, afirma. Até agora, aproximadamente 2.000 peças foram catalogadas por profissionais da área da ciências agrárias e biológicas juntamente com professores do Instituto.

Além de espécimes do Cerrado, a coleção conta com peças pré-históricas, mamíferos dos mais primitivos (canguru, ornitorrinco, coala), até os mais evoluídos (boto, macacos). Possui um acervo das mais belas e raras aves do mundo, como quetzal – ave sagrada dos astecas, pingüins, albatroz e a menor beija-flor do mundo. Répteis, peixes, moluscos e artrópodes fazem parte do acervo e compõem grupos ecológicos da Austrália, Estados Unidos, Canadá, Europa, Nova Guiné, Nova Zelândia, África, Cuba e espécimes animais brasileiros da Ilha do Bananal, Beira Mar e Pantanal.

Para Ribeiro, a coleção constitui um valor inestimável para a sociedade em geral e não só para a área das ciências naturais. “O acervo é muito importante, principalmente devido a sua história. Ele foi criado com intuito de estudar tanto as manifestações culturais do Cerrado, quanto a fauna e flora do bioma. Esse é o objetivo do Instituto, contribuir com a sociedade para entender o bioma do Cerrado”. O professor Hidasi já era um profissional ativo nesta área, ele veio a compor o quadro do Instituto, ficando com o trabalho da fauna. Como o húngaro já tinha coleções de animais de todas as partes do mundo, sua contribuição para a sociedade vai muito além da relação com o bioma Cerrado.

Animal

Mesmo com toda tecnologia atual de vídeo e fotografia que aproxima as pessoas da fauna e flora de lugares longínquos, Ribeiro acredita que nada substitui a experiência do contato visual com o animal em sua própria pele. “Mesmo com toda tecnologia que temos hoje para ver, ler e se inteirar sobre os animais, ainda sabemos que a visão e o contato visual próximo trazem mais realidade para o ser humano. Ele se sente mais conhecedor daquele tipo de animal, que existiu ou que ainda existe na nossa fauna”, pontua. Ele leva a carrega a bandeira do professor Hidasi que afirmava que era preciso conhecer os animais para poder protegê-los.

 

O caminho brilhante do Professor José Hidasi 

José Hidasi nasceu em Makó, no sul da Hungria, em 1926. Ele se formou na Escola Superior de História Natural e Geografia e foi combatente na Segunda Guerra Mundial pelo exército húngaro como segundo-tenente. Depois da guerra, morou na Alemanha e na França, onde se formou em Ciências Naturais. A trajetória deste verdadeiro amante dos animais impressiona.

O professor chegou ao Brasil em 1950. Ele morou primeiro no Rio de Janeiro, onde trabalhou no Museu de História Natural. Lá, dividiu suas pesquisas e ofício com o ornitólogo Helmut Sick que é considerado um dos maiores cientistas do mundo nesta área. Com ele viajou por várias regiões do Brasil e do planeta atrás de espécimes para compor seu acervo.

Hidasi chegou à Goiás em 1952, quando veio trabalhar no município de Aragarças na Fundação Brasil Central, que fazia parte do projeto de ocupação da Amazônia. Ele tinha a missão de catalogar os animais que pudesse encontrar. Nesta trajetória o professor desenvolveu sua própria técnica de taxidermização. Anos depois, ela permitiu que ele fundasse o Museu de Ornitologia de Goiânia em sua própria casa em Campinas, no ano de 1968. O local que já foi tipificado como bem cultural da cidade está fechado e Hidasi vive atualmente em uma casa de repouso.

Segundo Ribeiro, o professor húngaro já não estava sendo assistido corretamente com apenas uma pessoa que o ajudava no bairro de Campinas. A família achou por bem enviá-lo a uma casa de repouso para idosos onde teria médicos e enfermeiros à disposição. “Pelo que sei, ele está bem, lúcido e feliz. Só está um pouco debilitado por causa da idade”, declara o diretor.

Taxidermia eterniza espécies  

O termo correto dos seres vivos que se transformaram em objetos de estudo seria animais taxidermizados. É uma técnica de preservação da forma da pele, planos e tamanho dos animais para reproduzi-los para exibição e estudo como se ainda estivessem vivos. Hidasi desenvolveu sua própria técnica de taxidermia que levou, por meio de cursos, à Europa, Austrália e países da África.

A taxidermização constitui uma ferramenta importante de conservação e traz também uma alternativa de lazer e cultura para a sociedade. Seu principal objetivo é o resgate de espécimes descartados, recuperando suas características físicas e, muitas vezes, simulando seu habitat natural para que possam ser usados como na educação ambiental ou como material didático.

Além disso, pode atender uma pluralidade de públicos como donos de animais domésticos, pescadores e caçadores desportistas, criadouros de animais comerciais, o teatro e a televisão e museus de história natural, entidades conservacionistas, zoológicos, universidades, entidades que estão ligadas com o trabalho de uma vida inteira do professor José Hidasi.

As peças ficaram conhecidas popularmente como animais ‘empalhados’, mas atualmente não se usa mais manequins de palha e barro para sustentar os corpos dos animais. Outros tipos de materiais são usados para este fim como o poliuretano, além de próteses de olhos, cauda, nariz, orelhas, mandíbulas e língua.

No Brasil, a técnica começou a ser utilizada com a vinda dos imigrantes europeus, como foi o caso de José Hidasi, quando a caça era permitida e muitos animais eram embalsamados para laboratórios de biologia de escolas e faculdades. O Húngaro que sempre esteve envolvido na luta de preservação das espécies nadava contra a corrente da matança dos animais em caça desportiva.

Quando a caça ainda era legalizada, o professor inventou que o tatu-canastra, espécie ameaçada de extinção, espalhava hanseníase. Ele fez isso para afastar os caçadores do animal. José Ribeiro ainda destaca uma atividade que José Hidasi fazia junto à Secretaria do Meio Ambiente. “Outra questão é o grande número de animais que são atropelados no Estado. Os corpos eram recolhidos juntamente com a Secretaria do Meio Ambiente para serem recuperados e taxidermizados”.

Hoje, a maior parte dos profissionais qualificados a exercer a função adequadamente, está em idade avançada e geralmente ligados a instituições de ensino e pesquisa. (*Especial para O Hoje)  

 

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