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quinta-feira, 26 de dezembro de 2024
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Música

A união faz a força

José Abrão Longe das grandes gravadoras e muitas vezes apenas com o apoio de pequenos selos locais e muita coragem dos próprios membros, as bandas goianas enfrentam uma rotina complicada. Embora muitos queiram se dedicar integralmente à carreira musical, muitos são os impedimentos financeiros. Como fazer turnê, gravar, lançar disco? A maior parte das pequenas […]

Postado em 22 de março de 2016 por Sheyla Sousa
A união faz a força

José Abrão

Longe das grandes gravadoras e muitas vezes apenas com o apoio de pequenos selos locais e muita coragem dos próprios membros, as bandas goianas enfrentam uma rotina complicada. Embora muitos queiram se dedicar integralmente à carreira musical, muitos são os impedimentos financeiros. Como fazer turnê, gravar, lançar disco? A maior parte das pequenas bandas aposta em leis de incentivo e outros auxílios vindos dos governos municipal, estadual e federal. Mas aí o problema passa a ser a burocracia. Mesmo cheios de planos, os grupos acabam muitas vezes presos em limbos e é preciso sempre correr atrás do prejuízo para manter algum fluxo de caixa.

Para tentar fugir do marasmo governamental e poder tocar projetos mais ambiciosos e autorais, algumas bandas goianas estão buscando um caminho alternativo bastante interessante: o financiamento coletivo. A ideia é confiar na força e no apoio mais sólido que uma banda pode ter: os fãs. Uma das primeiras a embarcar nessa ideia foi a DogMan. Com o financiamento, eles fizeram o disco Homo Homini Canis. “A DogMan escolheu o caminho do financiamento coletivo por um motivo muito simples: falta de grana! (risos). Temos muitos fãs e amigos que acreditam em nosso trabalho, e bancaram a ideia de produzir esse LP junto com a gente. Praticamente não tivemos custo de produção, pois fizemos tudo em casa, mas a fabricação do vinil é bastante cara, por isso a necessidade da ajuda da galera”, contou Haig Berberian, vocalista da banda.

Para ele, o financiamento coletivo é o caminho ideal para os circuitos alternativos de música da cidade: “Para uma banda do nosso porte (e do nosso estilo, com letras em inglês e tudo mais), é bem difícil conseguir uma grana do governo. Aí é a hora que a qualidade do seu trabalho e o relacionamento com as pessoas falam mais alto. Fizemos tudo com financiamento privado, o que, em minha opinião, é bem mais legal. Adoramos a experiência e recomendamos para qualquer banda que seja realmente boa e que esteja disposta a trabalhar duro pra alcançar seus objetivos”.

E, quanto mais de nicho ou alternativa a banda, melhor. Quem está com um grande projeto de crowdfunding, atualmente, é a banda Projekto Barok. Eles estão tentando levantar uma grana para cobrir os custos de uma curta turnê na Europa. “Quando a banda surgiu em 2007, fizemos contato com a gravadora Vinil Cosmo, da França. Aí, em 2013, lançamos um single e falamos com ele sobre um projeto de disco. Nesse ano, lançamos um EP digital e estamos começando a gravar o disco completo que deve ser lançado em CD. Nós cantamos em esperanto, aí, por isso, fomos convidados a tocar no Congresso Internacional de Esperanto, na Eslováquia, e no Encontro da Juventude Esperantista, na Polônia, em julho. Eles financiam o encontro com o dinheiro das inscrições e não receberam inscrições o suficiente, aí queriam cancelar os shows”, contou Rafael Muniz, um dos membros do grupo.

E, como dá para perceber, é uma banda de heavy metal, mas com uma pegada muito específica, o que justifica buscar um caminho diferente: “A gente queria cantar em latim, mas é uma língua muito complicada. O esperanto foi mais lógico, é uma língua fácil de aprender, bem simples. Sempre procuramos uma sonoridade diferente. Conhecemos bandas que não possuem letras, apenas vocalizações; outras que cantam em gaélico, e queríamos algo diferente assim”, disse Muniz.  

Nesse meio tempo, a campanha segue firme e forte: “Para não cancelar, tivemos a ideia do financiamento coletivo para custear pelo menos a metade das despesas ou senão as passagens e translado da banda lá na Europa. Pelas nossas contas, essa meta é de 15 mil euros e em reais isso é muito dinheiro (risos). Temos dificuldades, porque por sermos uma banda recente, não temos uma base de fãs muito grande, então estamos tendo que trabalhar muito nessa campanha, o dia todo nas redes sociais, para chamar a atenção para o nosso projeto”.

Para Rafael, mesmo se o projeto não der certo, a banda deve voltar a tentar financiamentos da mesma forma: “Mesmo não dando certo, vamos correr atrás. O financiamento coletivo é um termômetro para tirar as ideias do papel e para ver o que as pessoas estão achando do seu trabalho. É uma tendência do mercado que não tem como voltar atrás; através dele, projetos e obras muito legais estão chegando ao público”. Atualmente, eles estão compondo disco novo; metade foi paga pelo próprio bolso e metade pelo selo francês. “Estamos trabalhando muito com mitologia. Fã de heavy metal gosta muito de História. Tem muita banda que fala sobre mitologia grega, nórdica, e para esse disco nós estamos buscando fazer cada música inspirada em um mito tupi, com lendas brasileiras. Vai ficar uma obra muito nacional”, disse.

“Acho que o financiamento do governo é muito duvidoso. Apesar de que conseguimos custear muitas produções através de leis de incentivo, o atual momento cultural de âmbito nacional não esta favorável para projetos. Eu considero um plano B, porque o ideal é que a banda tenha seu fluxo de caixa com show e que esse fluxo pague suas produções. Mas sabemos que é complicado, né?”, falou Bullas Attekita, vocalista da Girlie Hell. 

Ela contou sobre a experiência da banda para lançar um vinil: “Na época, era uma novidade a possibilidade de fazer um financiamento coletivo. Como lançar um vinil era um sonho muito antigo da banda, achamos que seria bacana fazer os fãs participarem dessa conquista. Não só pela viabilidade econômica, mas acredito que o financiamento coletivo aproxima os o artista do seu público, no sentido que ele sente que está contribuindo diretamente para algo. Foi uma experiência muito boa para a gente”.

Ela ressaltou porém que, para conseguir atingir a meta, é necessário ralar: “Mas exige um certo engajamento, então da um certo trabalho para a banda divulgar e arrecadar. Não é tão simples assim”. Mesmo assim, Bullas não exclui a possibilidade de fazer uma campanha novamente: “Acho que faria de novo sim, se fosse preciso. Se tivéssemos um projeto bacana para isso”.

Uma banda que está cogitando fazer uma campanha de financiamento coletivo é a Mugo. Eles estão prestes a gravar seu terceiro disco, que deve ser feito com cachê de um show, mas a opção existe para a gravação e, quem sabe, para lançamentos futuros. “O primeiro disco foi lei de incentivo e, o segundo, foi com o cachê do Fica. O terceiro a gente estava pensando em fazer no Kickante, mas nós tocamos no Canto da Primavera, e estamos esperando essa grana para gravar o disco. Porém não sabemos se, com ela, vai dar para cobrir produção, gravação e a prensagem. A gente acha que a grana não vai dar para prensagem e, por isso, vamos ter que correr atrás disso de outra forma. Aí estamos pensando no crowdfunding, mas não chegamos a conversar sobre isso ainda. Mas é uma boa opção”, explicou Guilherme Aguiar, guitarrista do grupo.

Ele disse que o disco deve ser feito e lançado, nos próximos meses, e que a banda ainda vai conversar sobre o assunto: “Estamos compondo o disco, faltam umas três músicas para fechar. Essa grana saindo já vamos entrar para o estúdio. O disco deve estar na mão até agosto. É a opção mais plausível para descolar essa grana para a prensagem, porque ajuda quem bota fé no trabalho da banda. E não é muita coisa; é um valor pequeno, que já vai ajudar a levantar o merchandising do novo disco, camisetas, etc. Se for rolar, ainda temos que planejar muita coisa, como show de lançamento e as recompensas”.

Uma banda das antigas que não se inscreve em leis de incentivo é a Ressonância Mórfica, um dos principais nomes do rock pesado goiano. Embora ainda analógica e sem nunca ter feito campanha de crowdfunding na internet, a banda sempre contou com o apoio e boa vontade dos fãs para seguir fazendo turnês e lançando músicas novas. “Nunca esperamos pelo governo. A dificuldade sempre será monstruosa para uma banda independente que sobrevive num País com uma logística muito cara e, muitas vezes, até desumana. Em 2009, fizemos uma tour nacional de três meses e assumimos todos os riscos. Até em BR com mendigo dormimos, e fizemos muitos shows memoráveis”, contou Marcos Campos, membro da banda.

Em junho, eles vão embarcar em uma turnê sul-americana, organizada por um parceiro de longa data, o Ícaro Lima, vulgo Kaká, da Xaninha Discos: “Essa tour sulamericana, em junho, já vai ser uma coisa mais organizada, até porque não somos mais tão jovens assim (risos). Escolhemos esse caminho, porque somos loucos de pedra e acreditamos no tipo de som que fazemos”, relatou Campos. Ele contou que fecham um contrato com o produtor que organiza a turnê, e aí começa a correria atrás do dinheiro. “Isso tem um custo. Conseguimos ajuda de amigos, fãs, shows e afins. E do próprio bolso”, finalizou. 

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