Esgoto vai parar em córrego
Córregos Santo Antônio e Almeida, em Aparecida de Goiânia, sofrem com poluição e degradação
Igor Caldas
O forte odor de fezes faz parte do cotidiano de quem mora no Setor Buriti Sereno em Aparecida de Goiânia. O motivo é a água parcialmente tratada pela Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) do bairro que é despejada diretamente no leito do córrego Santo Antônio. O dano da poluição é visível pela água turva e espuma formada no curso d’água. De acordo com moradores do setor, o cheiro insuportável começou depois que o condomínio Residencial Buriti Sereno foi construído ao lado do córrego.
O líder comunitário, Cristiano Pereira (Zói), acompanha de perto a destruição do córrego. No dia primeiro de março deste ano, ele e um dos moradores do bairro foram até o Ministério Público de Goiás (MP-GO) para denunciar a situação degradante que o recurso hídrico se encontra. Na ocasião, destacou que o curso d’água tem recebido esgoto in natura lançado pela Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) da BRK Ambiental e além da poluição hídrica, denunciou também a poluição atmosférica causada pelo odor insuportável no local.
“Após a construção do Residencial Buriti Sereno começou a ter uma descarga muito grande de esgoto dentro do córrego. A população começou a reclamar muito. Quando a gente veio aqui e constatamos a situação, já era tarde. Tinha muito esgoto caindo no córrego. Ele não está sendo tratado. Este problema persiste desde outubro de 2018. Já tem quase um ano que a situação está desse jeito. Já fomos até no Ministério Público, mas até agora nada foi feito”.
Na época, o MP-GO afirmou que a empresa BRK Ambiental alega que há superpopulação no condomínio edificado e que o esgoto produzido é superior à capacidade de tratamento da ETE. “Visivelmente, até hoje nenhuma ação foi tomada para que coíba este crime ambiental. A quantidade de esgoto vem só aumentando e está bem maior do que anteriormente”. Fotografias e vídeos comprovam que a água contaminada percorria mais de cinco quilômetros de extensão do córrego.
De acordo com o líder comunitário, houve um laudo realizado pela BRK Ambiental que afirma não haver problemas na ETE. “Basta qualquer pessoa olhar para a água e ver que a condição é totalmente divergente do que era anteriormente. Há poucos metros acima do despejo, temos uma água totalmente transparente e abaixo dele, temos uma água turva, fedida, cheia de espuma e sujeira. Abaixo do descarte, há uma grande quantidade de peixes mortos. São peixes pequenos, mas estão todos mortos”, afirma Cristiano.
Poluição adoece moradores
A família de Fábio Soares mora há cerca de 300 metros do córrego Santo Antônio. O cheiro forte no fim da tarde tirou o prazer deles se reunirem para fazer uma refeição. Fábio tem vergonha de convidar amigos para visitá-lo. Nos horários de pico do fedor, as portas de sua casa têm que ser fechadas e produtos como odorizadores de ambiente são usados para amenizar o cheiro insuportável que entra na residência.
Outro horário em que o cheiro fica mais intenso é no início da manhã. “O principal problema aqui é o odor forte de esgoto. Como eu levo minhas filhas para escola e passo próximo daqui, às 7h30 fica um fedor de fezes muito intenso até as 8h30. À tarde, após as 17:30, fica insuportável. Os mosquitos também aumentaram muito. Eu morro de medo que minha família contraia alguma doença por causa disso”, lamenta o morador do bairro.
Fábio lembra quando o problema do córrego não existia. “Isso aqui era uma nascente. Hoje, está sendo poluído pelo esgoto do Residencial Buriti Sereno. Depois disso, minha vida ficou muito difícil. Não tenho mais prazer de me alimentar reunido com a família. Não chamo mais ninguém para ir lá em casa. Minhas filhas estão doentes, com muita febre. Expliquei para o médico sobre o odor e ele falou que essa febre pode ser consequência da poluição”.
Fábio faz um apelo às autoridades para salvar o córrego. “Aqui, mesmo na seca, tem água em abundância. Então que tirem esse esgoto daqui o mais rápido possível. A tecnologia está avançada e há muitas formas de tirar isso daqui. Essa água pode ser retornada para a população usá-la de outras formas”, suplica o morador.
Programa habitacional
A Companhia de Saneamento de Goiás (Saneago) informa que a Estação de Tratamento de Esgoto Buriti Sereno foi construída pelo responsável pelo empreendimento para atendimento ao residencial de mesmo nome, pertencente ao Programa Minha Casa Minha Vida.
A BRK Ambiental, subdelegada da Companhia para os serviços de esgotamento sanitário em Aparecida de Goiânia, realizou vistoria e apresentou um levantamento de todas as pendências que impactavam na operação do ativo. Desde então, está acompanhando as adequações técnicas realizadas pela construtora responsável pelo empreendimento e que constituem condição prévia para que a empresa receba e opere a estação.
A Saneago destaca que a ETE Buriti Sereno é uma estrutura provisória, pois a região onde o residencial está localizado será atendida pelo sistema público de esgotamento sanitário. As obras estruturantes têm previsão de conclusão para o segundo semestre de 2021, quando a ETE será desativada. A BRK Ambiental não tem emitido faturas para esse residencial.
A Prefeitura de Aparecida por meio da Secretaria de Meio Ambiente, afirma que está atuando junto a empresa de saneamento básico e a construtora da obra do Residencial Buriti Sereno para melhor resolver a situação e evitar que o esgoto seja jogado no córrego.
Pipa sofre com lançamento de esgoto há mais de 10 anos
Desde setembro de 2018 corre uma Ação Civil Pública Ambiental movida pelo Ministério Público de Goiás com pedido de liminar contra o Município de Aparecida de Goiânia, a Saneago e a BRK Ambiental. Trata-se da condenação da Saneago e BRK pela execução parcial do saneamento básico do município e o lançamento de esgoto diretamente nos Córregos Pipa e Almeida.
Inicialmente, o problema chegou ao conhecimento do Ministério Público de Goiás por meio de denúncia de uma cidadã em 2010. Apesar do MP-GO tomar conhecimento da situação há cerca de nove anos, na ação, consta que o Município de Aparecida de Goiânia e a Saneago tinham conhecimento do lançamento de esgoto desde 2004, mas se limitaram a descrever o problema e tentar entupir o cano de esgoto com uma bananeira. Após o episódio, a Saneago noticiou que faria obras para resolver o problema até o fim de 2011.
A ação ainda narra as afirmações contraditórias por parte tanto do Município de Aparecida de Goiânia quanto da própria Saneago, nas tentativas de apresentar uma solução para o problema. No entanto, de acordo com o Agente da Defensoria Pública do Município, Juliano Cardoso, após mais de 10 anos de esgoto caindo no córrego, o problema ainda persiste. Ele auxiliou, coordenando às vistorias e inspeções técnicas, as quais deram suporte a ação do MP.
Inclusive, além deste problema específico de lançamento de esgoto, destacou que existem lançamentos de efluentes no curso d’água, tanto por particulares, quanto pela própria Saneago. Na época, ele denunciou a companhia de saneamento por cobrar taxa de coleta e tratamento de esgoto dos particulares, mas ela própria destinava os efluentes não tratados no manancial. “Portanto, a Saneago não pode alegar desconhecimento, pois ela própria constrói as redes de esgotamento sanitários nos corpos hídricos”.
A BRK Ambiental informa que já está construindo uma Estação Elevatória de Esgoto Compacta, que irá bombear o esgoto dos bairros Vila Sul, Jardim Progresso e Vila Brasília até a Estação de Tratamento de Esgoto. As obras devem ser concluídas até dezembro deste ano e estão incluídas no cronograma de investimentos para Aparecida de Goiânia em 2019.