Serra da Areia sob ameaça
Falta de fiscalização da Prefeitura de Aparecida coloca em risco o maior patrimônio ecológico do município
Igor Caldas
Especial para O Hoje
Desde o último dia 30, a Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Aparecida de Goiânia tem feito o trabalho para mapear e cadastrar ribeirinhos das propriedades que compõem a Área de Proteção Ambiental (APA), da Serra da Areia. Cerca de 80% da APA está dentro de propriedades particulares. Em gestões passadas, o município tentou indenizar os proprietários para transformá-la em parque ecológico, mas o processo não avançou. Hoje, a natureza da serra está em apuros com falta de fiscalização e turismo agressivo descontrolado e invasivo.
Donos de uma das maiores propriedades que compõem a Serra da Areia, Edmar Pereira de Sousa se lembra quando a administração municipal tentou transformá-la em parque. “Na época, a prefeitura transformou lá em parque e prometeu indenizar todo mundo. Mas não pagou ninguém e houve a invasão de um homem na minha terra. Ele cercou cinco hectares e está morando lá. Já tentei colocar muitas placas, mas o povo rouba. Na verdade, lá não tem fiscalização nenhuma, é uma terra sem lei”, afirma o proprietário.
Edmar fala sobre a destruição da natureza e a dificuldade de coibir a ação destrutiva dos invasores. “Todas as nascentes estão sendo degradadas. A população joga muito lixo em vários locais, cortam as árvores, espantam os bichos. Por enquanto, eu não tenho nada em mente programado para tentar impedir. Até porque, do jeito que está lá hoje, a gente não dá conta de conter invasão.
O dono das terras lamenta que o local tenha ficado perigoso e violento por falta de ações do poder público. “Está muito complicado a situação na serra. Ficou um lugar perigoso, uma terra onde os malandros invadem e fazem o que querem. Até chacina eles fazem lá. Levam um monte de gente para algum lugar inóspito e matam”. Em abril deste ano, um jovem foi julgado em Aparecida de Goiânia, acusado de matar quatro jovens na Serra da Areia. O crime ocorreu no dia 19 de agosto de 2013.
Ele ainda afirma que não vê solução viável para a Serra da Areia. “Eu acho difícil melhorar essa situação. Promessas existem aos montes. Mas a conclusão delas, acho difícil. Infelizmente, o caminho que eu vejo daqui para frente é só a degradação mesmo. Grande parte da área de preservação da Serra da Areia ficou todinha no meu terreno”. Edmar ainda afirma que não há intenção de indenizar ninguém e ele não pode fazer uso de sua terra que acaba ficando à mercê de bandidos.
Área quase virou Parque Municipal
Segundo o agente da Defesa Civil, Juliano Cardoso, a Serra da Areia quase virou um parque municipal de domínio público no passado, devido à lei municipal N° 2018 e uma Determinação Judicial. No entanto, para isso ocorrer era necessário que o poder público municipal, desapropriasse e indenizasse as terras particulares que compõe a área da Serra da Areia. O local representa 20% da área de Aparecida de Goiânia.
Ele explica que houve falta de condições financeiras do município para as indenizações e a serra foi mantida como área protegida, na modalidade de Área de Proteção Ambiental (APA). Porém, nesta modalidade, os proprietários das áreas continuam sendo donos de suas terras, apenas o seu uso é que tem limitações conforme a legislação ambiental vigente.
O agente reitera que existem muitas pessoas que acreditam que a área é pública. “Muitas pessoas que moram próximas e em outras regiões têm a ilusão que a serra é território de ninguém, onde tudo pode”. A tentativa de transformar a Serra da Areia em parque municipal ocorreu entre 1995 e 1998.
Invasões históricas
Juliano ainda afirma que alguns bairros limítrofes à Serra da Areia tiveram origem em invasões de áreas de proteção na década de 1990. Bairros como Comendador Valmir, Fabrício, parte do Riviera e Independência Mansões foram formados dessa forma. Ele ainda firma que são bairros consolidados, mas em anos pré-eleitorais, sempre nas áreas contíguas desses bairros no sopé da Serra, há movimentações e ações de promoção de invasão e ocupação de áreas protegidas.
“Bairros limítrofes sempre foram alvo de politiqueiros disfarçados de líderes comunitários. Por várias vezes, eles promoveram invasões na região da Serra da Areia nesses bairros limítrofes. Algumas delas foram impedidas por órgãos ambientais.
Prática ilegal de esportes prejudica natureza
Proprietário de boa parte da região conhecida oficialmente como estágio 2 da Serra da Areia, Ronaldo de Brito, afirma que suas terras são invadidas constantemente para prática de esportes radicais há pelo menos 10 anos. “As pessoas não respeitam as placas de propriedade privada, não respeitam as cercas. É a mesma coisa de não existir sinalização. Os motoqueiros e jipes entram e acabam com tudo. A Defesa Civil, que acompanha a destruição da propriedade, já me mostrou fotos da destruição desenfreada desse povo. E eles sempre vêm de bando”.
Ronaldo ainda diz que além de afetar a fauna do local, os invasores causam grandes prejuízos para o solo da região. “Eles acabam com a vegetação para abrirem trilhas de motocross e fazem rally com jipes na minha propriedade. O barulho intenso provocado pela prática desses esportes afugenta os animais que moram na área de preservação. Além disso, o solo fica todo danificado após eles irem embora”, conta.
O agente da Defesa Civil, Juliano Cardoso, explica que os danos causados ao solo da Serra da Areia não ficam restritos apenas à região. Os prejuízos ambientais reverberam para toda população da Região Metropolitana de Goiânia. “É na Serra da Areia que nascem as principais nascentes dos córregos que abastecem toda grande Goiânia. Se essas nascentes morrerem a população vai ficar sem água. Vai virar também um deserto de desempregados porque nenhuma grande empresa ou indústria se instala em locais sem água”.
O Secretário do Meio Ambiente de Aparecida de Goiânia, Cláudio Everton, afirma que uma das maiores dificuldades que a pasta enfrenta atualmente é a falta de fiscais. Ele afirma que já enviou um pedido para realização de concurso para dobrar o número desses profissionais na Secretaria. Atualmente, a pasta conta com 15 fiscais do meio ambiente. O titular afirma que ainda vai demorar cerca de 12 meses até que os fiscais sejam contratados.
“A necessidade de fiscais na Secretaria é muito importante e independente do que vai acontecer na serra. Se o município indenizasse os moradores de lá, teria que ter os fiscais para cuidar dela. Se continuar do jeito que está, com 80% dela dentro de propriedades particulares, eles também vão ter que estar presentes. Se houver uma parceria público privada, o trabalho dos fiscais é fundamental. Então, não existe nenhuma possibilidade de qualquer atividade na Serra da Areia sem prejuízos ambientais se não existirem fiscais suficientes para monitorar a área”.
No entanto, o secretário ressalta que a atividade de fiscalização deve ser um trabalho em conjunto com os proprietários. “Estamos cadastrando e notificando os donos das terras para que cerquem e coloquem placas de identificação nas propriedades. Além disso, estamos criando um canal de aproximação para que, caso haja invasões, as autoridades competentes sejam acionadas de forma mais rápida para coibir ação destrutiva dos invasores”.
Ele ainda afirma que o trabalho de mapeamento das propriedades que compõem a Serra da Areia não havia sido feito em outras gestões. “A Secretaria teve o trabalho de identificar essas áreas públicas e privadas. Isso não havia sido feito por nenhuma administração e foi o mais importante dentro desse programa até agora. Já foram 26 ribeirinhos cadastrados. Tivemos a primeira etapa de identificar, cadastrar com nome, CPF, telefone, e mapear a área”. A parte privada da Serra da Areia é composta por 136 propriedades.