MP-GO analisa movimentação financeira de padre Robson e outros de R$ 1,7 bi
Além do religioso, há funcionários e empresas, como postos de combustíveis, citados por promotores | Foto: Reprodução.
Nielton Soares
O Ministério Público de Goiás
(MP-GO) acusa o padre Robson de Oliveira, pároco da Basílica do Divino Pai
Eterno de Trindade e outros, por praticar supostos crimes de apropriação
indébita, lavagem de capitais, organização criminosa, sonegação fiscal e
falsidade ideológica em três associações ligadas à Igreja Católica na cidade,
que, de acordo com os promotores, recebiam doações em dinheiro de fiéis.
A operação, batizada de Vendilhões
(que remente à passagem bíblica onde Jesus Cristo expulsa mercadores do tempo),
foi coordenada pela MP-GO, por
intermédio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco).
E, já foram bloqueados judicialmente R$ 60 milhões em bens imóveis e valores em
contas bancárias dos envolvidos, por autorização da juíza Placidina Pires,
titular da Vara de Feitos Relativos a Organizações Criminosas e Lavagem de
Capitais.
O promotor de Justiça Sebastião
Marcos Martins, que coordenou a ação, deflagrada na sexta-feira (21), contou
que está sendo analisada uma movimentação financeira em torno de R$ 1,7 bilhão.
Ele explicou que a fraude não
atinge o montante integramente, mas, a partir da documentação apreendida, será
possível definir o valor exato que o esquema desviou. Segundo as apurações, teriam
sido beneficiados com recursos da fraude o próprio padre Robson de Oliveira
Pereira, então preside da Associação Filhos do Pai Eterno (Afipe), Associação
Filhos do Pai Eterno e Perpétuo Socorro e Associação Pai Eterno e Perpétuo
Socorro; além de uma rede de empresas e pessoas em torno dessas entidades
ligadas à Igreja Católica.
Investigações de 2019
A investigação que resultou na
Operação Vendilhões iniciou no ano passado, quando houve a condenação de um
grupo criminoso, que extorquiu dinheiro do padre Robson. Na época, cinco
pessoas exigiram mais de R$ 2 milhões para que não fossem divulgadas imagens e
mensagens eletrônicas com informações pessoais, amorosas e profissionais do religioso
e, assim, prejudicassem a imagem dele.
Após isso, o caso foi enviado ao
Gaeco para apurar a origem do dinheiro utilizado para pagamento de parte do
valor ao grupo criminoso. Nesse período, segundo secretário de Segurança Pública
de Goiás (SSP-GO), Rodnei Miranda, informou que representantes do Vaticano estiveram
no Estado para acompanhar as investigações e se surpreenderam com o volume de
arrecadação das instituições, que foram relatos por eles, como superiores ao
que é movimentado pela Basílica de Aparecida do Norte, em São Paulo.
Teia financeira
Ao analisar a movimentação
financeira das Afipes, o Gaeco descobriu, segundo Sebastião Marcos Martins, uma
grande teia de movimentações financeiras, envolvendo a compra e venda de
imóveis. Dentre as quais: casas, apartamentos e fazendas, em Goiás e outros
Estados. Foram constadas ainda muitas transferências de valores entre contas
bancárias.
Segundo o promotor de Justiça, as
três associações juntas recebiam dinheiro separadamente, proveniente de doações
de fiéis, e eram feitas as transferências de valores com a utilização de contas
bancárias de terceiros. Para o promotor de Justiça, as associações passaram a
ser administradas como verdadeiras empresas financeiras.
Ao todo, foram cumpridos 16
mandados de busca e apreensão, expedidos pela juíza Placidina Pires, na sede
das associações, empresas e residências em Goiânia e Trindade, dentre as quais
na própria residência de padre Robson, onde foram encontrados valores em espécies.
Também foram encontrados dinheiro
em outros locais das buscas e apreensões, cujo valor ainda está sendo
contabilizado. Participaram da operação 20 promotores de Justiça, 52 servidores
do MP-GO, 4 delegados, 8 agentes da Polícia Civil e 61 policiais militares.
Contribuições
O procurador-geral da Justiça de
Goiás, Aylton Flávio Vechi, destacou que é apurado as doações e que foram respaldadas
para a nova Basílica de Trindade. Para ele, é necessário garantir a reparação
dos danos que podem ter sido causados pela conduta. Nesse sentido, o secretário
de Segurança Pública, há índices que os recursos tenham algum tipo de
ilegalidade cometida pelos dirigentes das associações religiosas.
Outros envolvidos
Considerada ‘braço direito’ do
padre Robson, Rouane Carolina Azevedo Martins, aparece na decisão judicial. Ela
é funcionária da Afipe, possuindo procuração para movimentar contas bancárias,
com participação ativa nos pagamentos realizados pelas associações, inclusive no
processo referente à extorsão ao padre, há cerca de dois anos.
Além dela, constam como
integrantes da fraude o empresário Onivaldo Oliveira Cabriny Costa Júnior, o
vice-prefeito de Trindade Gleysson Cabriny de Almeida Costa e Bráulio Carbiny
de Almeida Costa. Eles teriam efetuado “inúmeras” operações com as associações.
Onivaldo e Gleysson estariam ainda
nos quadros societários de pessoas jurídicas diversas do ramo de comunicações
do grupo (Sistema Alpha de Comunicação Ltda. e Rede Demais Comunicação Ltda.), que
receberam repasses “vultuosas quantias em dinheiro das Afipes, tendo ainda
realizado diversas transações imobiliárias”.
A investigada mira também a conselheira
fiscal da Afipe, Celestina Celis Bueno, que é apontada como sendo sócia, junto
com o advogado da Afipe, Anderson Reiner Fernandes, da Rede Demais, de Gleysson
e Onivaldo, entre 2014 e 2018, chegando a depositar, em julho de 2016, mais de R$
2,700 milhões. E, a mesma empresa de comunicação recebendo outros mais de R$ 2
milhões da Afipe, no mesmo período. Ao deixar a instituição, porém, não ocorreu
pagamento relacionado à venda das cotas dela, o que foi diferente de outro
caso.
O advogado Anderson teria se tornando
o único sócio da Rede Demais, com a saída de Celestina. E, segundo os autos, os
dados bancários dele apontam cinco transações imobiliárias com a Afipe: 7 de
julho de 2016, no montante de R$ 2.589.570 e, no mesmo dia, a associação
transferiu, de acordo com a decisão, imóveis adquiridos desta instituição do
advogado para a empresa Vilela e Araújo Agropecuária, em torno de R$ 7 milhões.
Já as empresas citadas no texto
da juíza Placidina, são o Posto Kurujão – considerada a maior rede de postos de
combustível de Goiás – e da KD Administradora de Bens, pertencentes ao pré-candidato
a prefeito de Trindade, Douglas Reis. Ambas consta com série de transações
imobiliárias, entre 2018 e 2019.
Outra são a Sul Brasil, que manteve
negócios com a Afipe, ocorridas nos anos de 2017 e 2018, e chamou a atenção dos
investigadores. Inicialmente, essa empresa de comunicação depositou R$ 1,250
milhão para Onivaldo Júnior, que depois foram devolvidos por ele à Sul Brasil
dois meses, sobrando para ele R$ 180 mil.
As aquisições pela associação foi
a Fazenda Serenta e Monjolinho, da Agropecuária Nova e Eterna Aliança Ltda. Avaliada
em R$ 6,308 milhões em março de 2016. Mas, depois de três anos, a Afipe vendeu
o imóvel para a Terra Nobre pelo mesmo valor, sendo a única transação da
empresa.
Mudanças de sócios
A Afipe também teria adiantado,
em 2016, conforme notas explicativas de 2018, R$ 67,406 milhões a Sul Brasil e
29.999.999,99 a WKS Empreendimentos Imobiliários. Esta última foi criada por
Wander Divino e pela pessoa jurídica Work Show Produções e Entretenimento
Artísticas Ltda. (também de Wander). Contudo, em 2019 Wander deixou a sociedade
e os sócios da Sul Brasil, Ademar e Marcos Antônio, entraram.
No entanto, o promotor Sebastião
Marcos Martins reforçou que todos os documentos apreendidos ainda serão
analisados, e serão verificadas todas as irregularidades. Como também, serão
ouvidos todos os identificados no supostos esquema, já na próxima semana. Porém,
já foram autorizado, em março deste ano, o bloqueio de valores nas contas do
Auto Posto Kurujão, Kurujão Administradora de Bens, KD Administradora de Bens,
Sul Brasil e Afipes, que somaram R$ 60 millhões.