Canalização de Córrego Cascavel agride meio ambiente
Obras viárias no Córrego Cascavel altera microclima e aumenta enchentes, diz especialista – Foto: Wesley Costa
Igor Caldas
O Córrego Cascavel está sendo canalizado no trecho entre as Avenidas T-9, no Setor Bueno, e C-12, na Vila Alpes, numa extensão de 1,76 quilômetros. Além de trazer prejuízos ambientais, a obra deve contribuir para piora das enchentes que já são recorrentes na região em época de chuva. A bacia do Córrego Cascavel abarca uma área de aproximadamente 42 quilômetros quadrados. O alto curso da bacia localiza-se na região sul do município de Goiânia e abrange setores como Jardim América, Jardim Atlântico e Parque Anhanguera.
O córrego Cascavel tem grande importância para a Capital e também para a vida do Rio Meia Ponte, principal fonte de abastecimento de água da Região Metropolitana de Goiânia. A conselheira titular do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Goiás (CAU-GO), Maria Ester de Souza afirma que a obra de canalização do Córrego Cascavel causa impacto ambiental grave. “Toda dinâmica do ecossistema em torno do rio é alterada porque após a canalização, não há mais rio”, explica.
Ela analisa que a canalização do curso do rio e a obra viária nas margens do córrego são apresentadas como uma solução rápida e barata para a cidade, mas não mede os reais impactos ambientais e urbanos da alteração. “É uma proposta que acontece na contra mão do que ocorre nas obras viárias do resto do mundo que cada vez mais passam a considerar os impactos no meio ambiente”.
Enchentes
Maria Ester aponta que a obra deve contribuir para o aumento de enchentes que são recorrentes em épocas de chuva ao longo do curso do Córrego Cascavel. Ela ressalta que o bairro Jardim América é atingido todos os anos por problemas de enchentes causadas pela impermeabilização no solo, principalmente nas Avenidas T-8 e T-9. “Quando você imagina que é um dos maiores bairros em extensão, também é uma das áreas mais asfaltadas da cidade. Isso faz com que a água empoce ou vire uma enxurrada porque ela não é absorvida pelo solo”, explica.
A conselheira do CAU-GO afirma que a canalização do Córrego Cascavel causa inundação das suas bordas e amplia erosões no seu entorno. O volume de águas que corre em suas calhas aumenta consideravelmente e se torna um potencial causador de problemas ao longo do curso d’água. “Pode derrubar pontes, aterros, aumentar enxurradas e causar muitos danos por onde passa”, aponta.
Meio Ambiente
A arquiteta e urbanista ainda afirma que após sofrer o processo de canalização, o curso d’água passa a correr em uma espécie de ‘calha’, toda a vegetação em volta dele é desmatada e a topografia da região sofre alteração brusca com destruição do microclima local. “O rio atrai animais, sua vegetação ciliar mantém o microclima e ajuda na manutenção de índices de permeabilidade que previne as enchentes”, diz.
Maria Ester ressalta que ao retraçar o desenho de um rio por meio de calhas, todos os benefícios da existência do curso natural de água desaparecem. “Estão fazendo o contrário do que deve ser feito com os rios urbanos que é manter suas matas ciliares originais, replantar e recuperar o que foi degradado, afastar as construções próximas ao seu curso e evitar ligações de esgoto e lixo”, pontua.
A canalização proposta para esse trecho do Córrego Cascavel é composto por uma estrutura de concreto armado feita com segmentos com 19,98 metros de extensão, interligadas por juntas de dilatação, com fundo plano interligado a paredes verticais com as dimensões projetadas. O canal foi dimensionado para atender a uma vazão de 171,668 metros cúbicos por segundo e tempo de recorrência de 100 anos para pontes e canais em concreto e borda livre aproximada de 38,50 centímetros para o topo das paredes do canal.
Estudos de impacto ambiental podem ser encomendados
A conselheira titular do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Goiás (CAU-GO), Maria Ester de Souza, afirma que a legislação brasileira permite que os estudos de impacto ambiental de obras públicas sejam encomendados pelas próprias empresas que conduzem as obras em licitações. “O órgão municipal deve analisar a competência dos estudos, mas no caso de obras viárias, as prefeituras também estão interessadas que ela sejam feitas de forma rápida”, afirma.
Instrumento importante para redução de prejuízos ao meio ambiente decorrentes de obras de infraestrutura, o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) é uma condição para o licenciamento de uma série de obras. De acordo com resolução do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) destacam-se obras de saneamento, irrigação e drenagem, incluindo a canalização de córregos urbanos e a retificação de cursos d’água.
De acordo com a arquiteta e urbanista, esse mecanismo de aprovação de projetos faz com que muitos trabalhos que medem impactos ambientais sejam feitos às pressas ou de forma a mascarar o verdadeiro dano ambiental causado pela obra. “Em Goiânia temos vários exemplos de obras cujos estudos foram feitos de forma parcial ou à revelia, em favorecendo a construção de prédios, vias e edifícios em áreas de proteção ambiental e nascentes de rios”, pontua. Ela cita a obra da duplicação da Rua da Divisa, no Setor Jaó, como exemplo.
A equipe do jornal O Hoje entrou em contato com a Secretaria de Comunicação da Prefeitura de Goiânia e requisitou os Estudos de Impacto Ambiental da obra da canalização do Córrego Cascavel, mas não obteve resposta até o fechamento da reportagem.
Licitação
A empresa Sobrado Construções Ltda venceu a concorrência pública, do tipo menor preço, para a execução das obras de construção das pistas marginais e de acesso e de canalização do Córrego Cascavel, no trecho entre as Avenidas T-9, no Setor Bueno, e C-12, na Vila Alpes, numa extensão de 1,76 km. O contrato contempla ainda a sinalização horizontal e vertical e a construção de calçadas acessíveis.
Orçada em R$ 25.349.847 a licitação foi fechada por R$ 18.961.679, um deságio de mais de 25%. De acordo com o projeto, a pista a ser construída varia de 9 metros a 11,98 metros de largura, com acessos de 6 metros a 6,73 metros de largura, e camada de revestimento em concreto betuminoso na espessura de 10 centímetros, dividido em uma camada de cinco centímetros de pavimento asfáltico, recoberta por outro camada de cinco centímetros de capa para as vias marginais. (Especial para O Hoje)