País paga alto custo com a inação e incompetência da equipe econômica
A equipe do senhor Paulo Guedes continua persistindo na mesma política econômica que se mostrou malsucedida desde o final da recessão de 2015/16 – Foto: Divulgação
Lauro Veiga
A
inação da equipe econômica nos últimos anos e uma política monetária
essencialmente imobilista e conservadora ao longo de todo o período, com a
manutenção de taxas de juros excessivamente elevadas na maior parte do
percurso, têm cobrado um preço alto de toda a sociedade, agravado, muito
evidentemente, pela pandemia que se instalou no País a partir da segunda metade
de março deste ano – um custo, neste caso, imprevisível, mas que poderia ter
sido amenizado não fossem o negacionismo e o terraplanismo de um governo movido
essencialmente por impulsos homicidas. Parece inacreditável, sob certo ponto de
vista, que a atual equipe sob comando do economista abilolado, mas ainda
favorito dos mercados, pareça situar-se ainda mais à direita do que o Fundo
Monetário Internacional (FMI) e sua mundialmente reconhecida sanha fiscalista.
Recentemente,
duas economistas instaladas em altos cargos na estrutura da instituição
internacional recomendaram, ora vem só, uma atuação fiscal mais ampla dos
governos como forma de enfrentar a pandemia, ainda muito distante de seu
“finalzinho”. Trocando em miúdos, trata-se de uma recomendação para que os
governos gastem mais, invistam mais – sim, em meio a uma retração generalizada
da economia global, lançando mão de mais emissões de dívidas e de moeda.A
prioridade, neste caso, é literalmente salvar vidas, preservando empregos e
renda das famílias em meio à crise. Os desequilíbrios entre receitas e despesas
e o endividamento daí decorrente deverão ser enfrentados mais adiante, por meio
de políticas e medidas de ajuste graduais, de médio a longo prazo.
Mas
a equipe do senhor Paulo Guedes continua persistindo na mesma política
econômica que se mostrou malsucedida desde o final da recessão de 2015/16 – o
que se comprova pelos índices de crescimento muito baixos, historicamente, verificados
nos anos seguintes, antes mesma da pandemia, muito inferiores à própria
capacidade de crescimento da economia, como tem alertado, entre outros, Bráulio
Borges, economista-sênior da área de Macroeconomia da LCA Consultores e
pesquisador-associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio
Vargas (Ibre/FGV).
Negligência
mortal
Ao
negligenciar esse dado, observa mais uma vez Borges, em recente artigo
publicado no Blog do Ibre, a equipe econômica tem agravado os riscos fiscais
(sim, o crescimento econômico inferior ao chamado Produto Interno Bruto
“potencial” gera perda de arrecadação e agrava o desequilíbrio das contas
públicas) e causado danos que podem se tornar permanentes para toda a
sociedade, porque dificilmente poderão ser recuperados mais adiante. Derrotada
a pandemia, em algum ponto no futuro próximo, como se espera, a economia brasileira
enfrentará dificuldades muito maiores do que outras para conseguir retomar
taxas de crescimento mais aceleradas, além de partir de níveis muito reduzidos,
atrasados em relação aos demais países.
Balanço
·
O
cardápio seguido desde o governo anterior, mas incrementado na atual gestão,
entre outras medidas, incluiu a instituição do tal teto de gastos, que achatou
o investimento público – “despesa com multiplicador fiscal tipicamente acima de
1,0”, como destaca Borges. Isso significa que o investimento público se paga ao
longo do tempo, gerando novas receitas e compensando, de alguma forma, o gasto
inicial realizado pelo poder público.
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Além
do teto, que limita o crescimento das despesas à inflação de um ano antes, a
decisão de “reduzir bastante do tamanho do Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES)” ajudou a compor a coleção de medidas que impediram
crescimento mais alentado da economia, assim como a “postura excessivamente
conservadora da política monetária” (ou seja, os juros foram mantidos em níveis
abusivos por um período muito longo, desestimulando o crescimento mesmo quando
as condições macroeconômicas já permitiam taxas mais elevadas).
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O
baixo crescimento, como já mencionado, trouxe consequências para as contas
públicas, já que um ritmo mais acelerado de avanço da atividade econômica
poderia ter respondido por metade do ajuste fiscal necessário para reequilibrar
receitas e despesas, então estimado em 4,0% do PIB, nos cálculos de Borges,
logicamente realizados antes da crise sanitária.
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A
pandemia alterou todo o quadro econômico de forma radical e reforçou, ao redor
do mundo, as preocupações em relação aos efeitos da crise sobre a capacidade
futura de crescimento, sustenta o economista, para quem esse debate “ainda
parece não sensibilizar boa parte dos analistas” no Brasil.
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O
impacto mais evidente, mostra ele, está na proporção muito mais elevada das
pessoas que continuavam desempregadas um ano ou mais depois de perderem o
emprego, embora não tenham desistido da busca por nova colocação no mercado. Em
2014, por exemplo, esse contingente de desempregados representava perto de
35,0% do total de pessoas desocupadas no País, algo ao redor de 2,3 milhões de
pessoas. Em 2019, a participação elevou-se para 42,5% e o total de pessoas há
um ano ou mais sem emprego atingiu 5,3 milhões de pessoas, ou seja, mais do que
dobrou, num salto de 128%. No mesmo período, o número total de desocupados
cresceu pouco menos de 88%.
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Pode-se
considerar que esse, de fato, deveria ser um dos pontos centrais no debate
sobre o ajuste fiscal e sobre os custos gerados pela incapacidade federal de
formular políticas econômicas adequadas. O fiscalismo cego e ideológico acabará
empurrando a economia para mais uma década perdida, a custos sociais ainda mais
insuportáveis depois da pandemia.