Acusados usam evangelho para cometer crimes
Pastores em Goiás já foram acusados de crimes de estupro de vulnerável, assédio e importunação sexual | Foto: Reprodução
Daniell Alves
A Igreja Evangélica também se viu envolvida em escândalos após seus líderes serem acusados de crimes como assédio, importunação sexual e estupro de vulnerável. A série de reportagem sobre crimes cometidos em nome da fé continua neste fim de semana, abordando os escândalos que envolvem denominações religiosas. Desta vez, a edição aborda os casos ocorridos com pastores no Estado.
Em março de 2020 o pastor Davi Passamani foi acusado de assédio pela veterinária Gabriella Palhano. Na época, ela informou que o crime teria ocorrido dois anos antes ela formalizar a denúncia na Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam). Segundo ela, em uma conversa, o pastor teria perguntado sobre a vida sexual dela, disse que queria sentir seu beijo e que teve um sonho com ela, o qual a vítima classifica como “horrível e nojento”. O pastor negou o crime.
Em sua rede social, Gabriella explicou que resolveu denunciar o pastor porque teve informação de que o assédio também teria ocorrido com outra mulher. No vídeo divulgado por ela, a veterinária disse que precisou se reerguer antes de procurar a polícia e que pode provar o assédio. “Eu tenho testemunhas, as provas, áudios, prints, SMS, tudo”, afirmou.
Diante da situação, ela procurou ajuda e foi orientada pelo sogro, que é policial e também pastor, a continuar a conversar para ver qual era o intuito do pastor. Eles fizeram uma chamada de vídeo e, segundo ela, o pastor teria pedido para que passasse a mão no pescoço e na barriga. No entanto, quando ele pediu que ela tirasse a blusa, a mulher afirmou que não aguentou mais a situação e desligou.
Após a denúncia, a igreja A Casa, onde Davi atuava, anunciou o afastamento de suas funções ministeriais para tratamento médico especializado e informou que o Conselho Pastoral estaria tomando providências jurídicas e eclesiásticas com relação ao caso. No mês seguinte, a Justiça de Goiás determinou o arquivamento da denúncia. Conforme explicou o advogado do pastor, Wilson Carlos de Almeida, as provas apresentadas não tinham relevância para fins penais.
“O Ministério Público, ao analisar as provas levadas pela senhorita Gabriela Palhano, entendeu que não houve crime algum. Assim como a autoridade policial o havia feito dias atrás”, destaca. O caso corre em segredo de Justiça. Atualmente o pastor Davi segue com os cultos na igreja A Casa.
Pastor afirma ser inocente
Em vídeo publicado no Instagram, dias após ser acusado, Davi afirmou que era inocente e pediu perdão à igreja. Mas ele não explicou sobre qual situação estava se desculpando. “Estou aqui para pedir perdão a todos vocês, para a igreja no Brasil, de Goiânia, pedir perdão para minha família, meus filhos, que hoje estão vendo a internet tomada por uma acusação muito séria”, disse.
Anjo Mau
Durante a Operação Anjo Mau, da Polícia Civil de Goiás (PC-GO), o pastor Roberto Silva, 52 anos, (nome fictício) foi preso após praticar o crime de estupro de vulnerável em uma criança de 10 anos. O caso aconteceu em 2019, no município de Cidade Ocidental, a 197 quilômetros de Goiânia.
Segundo apurado, Roberto era pastor da igreja frequentada pela mãe da vítima. Aproveitando-se das dificuldades econômicas enfrentadas pela mãe da menor, o investigado ganhou a amizade e confiança da família. Ele oferecia ajuda financeira, muitas vezes angariada junto a outros fiéis.
Ao saber que a mãe da vítima trabalhava como diarista em Brasília e não tinha com quem deixar seus filhos durante o horário de trabalho, o pastor convenceu-a de fazer uma cópia da chave da casa para permitir que ele frequentasse o local nos períodos em que a mãe se ausentava, sob o pretexto de cuidar dos menores.
Porém, nos períodos de ausência da mãe da vítima, o autor aproveitava para praticar os estupros. A mãe da criança suspeitou dos estupros sofridos pela filha por conta do ciúme excessivo apresentado pelo investigado em relação à menor e, de imediato, procurou a unidade policial para relatar o ocorrido.
A criança contou à polícia que era estuprada pelo autor desde os 5 anos de idade. Ela confirmou que os crimes ocorriam quando sua mãe se ausentava do lar para ir ao trabalho, ocasião em que era obrigada a fazer sexo oral e a manter relações sexuais com Roberto. O laudo do IML comprovou que a vítima sofreu abuso sexual.
Com base nos fortes indícios de autoria e materialidade do crime de estupro, a autoridade policial determinou a prisão preventiva do autor junto ao Poder Judiciário local, que decretou a prisão. O pastor foi preso quando chegava em casa. Em seu interrogatório, o investigado confessou a prática do crime.
Casal de pastores
No município de Edéia, a 131 quilômetros de Goiânia, a PC indiciou os pastores Antônio Carlos de Jesus e Jéssica Teles da Cruz por estupros de fiéis, inclusive adolescentes. As investigações apontaram que eles diziam às vítimas que deveriam ter relações sexuais com o homem para quebrar maldições. Após ser preso, o casal negou à polícia ter cometido os crimes.
À época, o delegado responsável pelo caso, Quéops Barreto, explicou como o pastor teria agido. “Com as maiores de idade, Antônio falava que tinha uma maldição para quebrar e dava duas opções, uma opção era ter relação sexual com o cunhado ou o sogro e a outra, com ele. Se não fizesse, dizia que a vítima ou parentes iam morrer, ameaçava. Nas menores ele não dava a opção esdrúxula, dizia que tinha de quebrar a maldição com ele”, disse.
Antônio Carlos foi indiciado pelo estupro de cinco fiéis da Igreja Falando com Deus, incluindo uma de 13 e outra de 14 anos. Já a mulher dele pelos abusos cometidos contra as duas adolescentes. “Constatamos que ela teve participação e deve responder pelos crimes porque ajudava a amedrontar as vitimas, instigava o medo e ajudava a convencê-las de fazer o ‘sacrifício’”, explicou o delegado.
De acordo com o Ministério Público de Goiás (MP-GO), em depoimento, a vítima afirmou que, no início de 2015, ainda com 13 anos, ela teria sido abordada por Antônio, que dizia que ela teria uma doença hereditária, e que, para curá-la, precisava oferecer em sacrifício sua virgindade. Ainda de acordo com a adolescente, a esposa dele teria relatado que obteve uma revelação divina autorizando o ato.
O sistema do MP aponta que o processo deste caso ainda está em tramitação no Judiciário. Pelo o que consta, o processo está em fase de recurso (apelação) no Tribunal de Justiça, em apelação interposta pelos réus. Isso significa que os réus foram condenados em primeira instância. Em março do ano passado, o MP-GO ofereceu contrarrazões nesse recurso, defendendo que a sentença condenatória fosse mantida.
Apesar de condenados, os acusados tiveram garantido na sentença o direito de recorrer em liberdade. No site do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) a busca aponta que o processo corre em segredo de Justiça, o que não permite acesso à sentença. A reportagem não conseguiu localizar a defesa dos acusados.
“Momento de fraqueza”
No ano de 2016, o pastor Wilson Antônio (nome fictício), de 43 anos, foi indiciado pelo crime de estupro de vulnerável, previsto no artigo 217-A do Código Penal Brasileiro, que prevê uma pena de oito a 15 anos. O caso aconteceu na cidade de Goianésia, a 178 quilômetros de Goiânia.
A responsável pelo caso naquele ano, delegada Poliana Bergamo, informou que os pais da criança teriam deixado a menina com o pastor durante dois dias, período em que o crime teria sido praticado. “Ele aproveitou-se da credibilidade depositada pelos pais na sua condição social de pastor para abusar de uma criança inocente”, afirmou a delegada.
Ao ser preso preventivamente, ele confessou o abuso, alegando que cometeu o delito em um “momento de fraqueza”. De acordo com a delegada, ele pediu perdão e admitiu ainda que já havia abusado sexualmente de uma enteada há aproximadamente 6 anos. (Especial para O Hoje)