Acidentes com moto acompanham crescimento de deliveries
Quantidade de motociclistas para entrega aumentou em 979,8% de 2016 até 2021
Durante a pandemia e a necessidade de isolamento social, o comércio virtual foi impulsionado no Brasil. O mercado de entregas se tornou algo necessário, consequentemente aumentando a presença de motoboys e cicloboys nas ruas. Assim, diante da necessidade de se manter em casa, os aplicativos de entrega – como iFood, 99pop, Rappi e UberEats – transformaram a visão de serviços de delivery. Com o aumento de motoristas trafegando pelas cidades, a quantidade de acidentes também cresceu.
Uma pesquisa da consultoria CVA Solutions de 2020, a maior plataforma de delivery de comida e mercado, o iFood, é responsável por cerca de 75% do mercado nacional. No Brasil, em 2019, o número de restaurantes cadastrados no aplicativo era 116 mil, já em 2020, a quantidade atingiu 236 mil.
Segundo o levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea – 2021), aproximadamente 4,4 milhões de pessoas trabalham no setor de transporte, sendo que destes, 1,4 milhão são entregadores e motoristas de aplicativo. Em relação a transporte de passageiros, no primeiro trimestre de 2016 havia cerca de 840 mil motoristas e para transporte de mercadorias havia cerca de 30 mil. Entretanto, no segundo trimestre de 2021, a quantidade de motoristas para delivery sofreu alta de 979,8%, chegando à marca de 278 mil.
O engenheiro de Transportes e professor do Instituto Federal de Goiás (IFG), Marcos Rothen, afirma que o uso intensivo de motos nas entregas aumentou a quantidade do veículo circulando pelas ruas. “O número aumentou, mas muitos desses não tiveram o devido treinamento para transitarem com aqueles baús de entrega. Como eles ganham por produtividade, querem sempre andar mais rápido e muitas vezes desrespeitam as leis de trânsito, trafegam nas calçadas, na contra mão e avançam os semáforos andando em velocidade excessiva”.
Conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Covid do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (PNAD Covid do IBGE), os trabalhadores totalizam 700 mil pessoas. Segundo Miguel Ângelo Pricinote, coordenador técnico do Mova-se Fórum de Mobilidade, com o aumento de entrada de novos trabalhadores no setor de delivery de alimentos, é necessário que a legislação de trânsito seja aperfeiçoada, ressaltando que a “exigência de entregas rápidas, desrespeito às leis de trânsito e a necessidade de fazer lucro com o delivery estão provocando sérios efeitos”, além de afirmar que há “motociclistas mutilados e mortos”.
De acordo com Marcos, as motos devem seguir o Código de Trânsito Brasileiro que, segundo ele, “ficou em aberto se elas podem circular pelo corredor entre os carros” e que, como ficou em aberto, elas circulam, causando acidentes. Marcos afirma ainda que as leis sempre precisam de aprimoramento, mas que o Código de Trânsito é bem-feito, sendo que os condutores dos veículos pecam na falta de educação e que os órgãos competentes não realizam a fiscalização com a intensidade que deveria. “O Brasil é um dos locais mais perigosos e para melhorar isso é necessária muita educação, mas acompanhada de um grande aumento de fiscalização. Somos criados em muitas situações em que não fazemos algo para não sermos punidos. Em geral, as pessoas sabem que estão fazendo algo errado e contam com a falta de fiscalização para levarem vantagem”, afirma.
No Brasil, a quantidade de indenização por morte pagas pelo Seguro Obrigatório de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (seguro DPVAT), era de 48% em vítimas por acidentes em automóveis e 38% em motocicletas, em 2011. Já em 2020, 51,9% das indenizações foram destinadas à familiares de motociclistas que se envolveram em acidentes fatais e 33,52% para famílias de condutores de automóveis.
A realidade brasileira retratada por Pricinote reflete em Goiânia, sendo que o aumento de acidentes com vítimas fatais com motocicletas, representa 57,2% de mortes no trânsito. Além disso, dados da Secretária Municipal de Saúde de Goiânia (SMS) apontam que a morte de ciclistas quase dobrou no período entre 2019 e 2020, saindo de 9 para 17 mortos.
No que se refere à fiscalização, Marcos a avalia como deficiente e afirma que “falta quase tudo”. “Em muitas cidades brasileiras vemos uma sinalização mais cuidada. Aqui, as faixas apagam com pouco tempo de uso e os semáforos também não são bem cuidados e os tempos de verde e vermelho são muitas vezes mal distribuídos”, diz.
Vale ressaltar que, de acordo com dados do Ipea, 2021, o Brasil assume o quinto lugar no ranking mundial de vítimas de trânsito, acumulando cerca de 22 mortes por 100 mil habitantes, sendo que mais de um terço ocorrem por acidentes envolvendo motociclistas.