Setembro Amarelo: a importância de uma rede de apoio
Tamara Mendonça é professora de psicologia
Tamara Mendonça
O Brasil é um dos países com a maior taxa de suicídio do mundo, segundo uma pesquisa produzida pelo DataSUS. Os dados são de julho deste ano e indicam que o número de casos de suicídio no Brasil subiu de 7 mil para 14 mil nos últimos 20 anos, o que significa que há mais de um suicídio cometido a cada hora, sem contar os casos não notificados. Nesse sentido, é importante que haja uma conscientização da população e uma intervenção por meio das políticas públicas para compreender e mudar este cenário.
A campanha do Setembro Amarelo é uma ação organizada por diferentes entidades da área da saúde para prevenção ao suicídio. A campanha tem por enfoque trazer o tema à tona para discussão, uma vez que por muitas vezes é abordado como um tabu, para que sejam elaboradas estratégias de promoção de saúde mental.
Para tanto, é necessário compreender que produzir saúde mental envolve uma ampla gama de fatores. Dessa forma, não há como prever quem cometerá suicídio, mas é possível avaliar alguns riscos individuais e sociais.
No âmbito individual, o principal fator de alerta está relacionado à verbalização da ideação suicida. Se a pessoa faz constantes menções à insustentabilidade de um desgaste emocional, ao fato de ‘não aguentar mais’, se se mostra profundamente desesperançosa quanto à possibilidade de sair de uma crise, é necessário ficar em alerta. Outros possíveis sinais de risco podem estar relacionados a um isolamento persistente dos meios sociais, ausência de perspectiva de vida ou de desejo de maneira generalizada (inclusive para a execução de atividades cotidianas que antes não se mostravam tão penosas). De toda forma, é necessário analisar caso a caso.
É importante também compreender que tais questões estão entrelaçadas a aspectos psicossociais. Dessa forma, é importante verificar se a pessoa possui acesso a uma rede de apoio sócio-afetiva; a lazer; a condições de trabalho, renda e sobrevivência dignas; ao acesso à saúde e condições de sono e descanso de qualidade. A mobilização de uma rede de apoio para a prevenção do suicídio é fundamental, tanto como um suporte para casos de emergência, quanto porque os laços sociais são muito potentes para a produção de sentidos para o sujeito, para que este se veja amparado e como alguém cuja vida tem importância para aqueles que estão à sua volta.
Para além disso, a construção de uma rede de cuidado, que pode envolver apoio multiprofissional (se tratando de saúde) e de diversos âmbitos da vida do indivíduo (família, trabalho, escola, círculos de amigos, campos de lazer), é extremamente relevante no sentido de proporcionar um cuidado integral ao sujeito. Posto que, sendo a prevenção do suicídio um processo multifatorial, este requer, portanto, ações integradas, mas que partam de diversas vias, desde que sempre pautadas pelo acolhimento.
As principais vias de ação e prevenção são, portanto, o acolhimento, o acionamento de uma rede de apoio e a viabilização do acesso à informação. É importante que o sujeito seja ouvido/acolhido por aqueles a quem solicitar ajuda, sem julgamentos, comparações, e outras tentativas de diminuição de seu sofrimento. Isso é possível principalmente através de uma escuta profissional. Por essa razão, é importante orientar o indivíduo em risco a buscar esse tipo de auxílio, de preferência já disponibilizando possíveis serviços que prestem atendimento a este tipo de demanda – seja no âmbito público ou privado.
Dessa forma, é importante que aqueles que compõem a rede de apoio do indivíduo e se disponham a estar com ele compreendam que seu papel é diferente de um acompanhamento profissional. Ambos são relevantes ao processo de acolhimento, mas tratam-se de vias diferentes. Por isso, é importante garantir que, além de uma rede de cuidado, o indivíduo tenha acesso a uma escuta e tratamento conduzidos por profissionais capacitados. Além disso, é fundamental mobilizar a rede de apoio mais próxima e de confiança do indivíduo para que esse suporte venha de múltiplas direções.
Por fim, é fundamental que o Setembro Amarelo não seja tratado como uma campanha pontual e puramente mercadológica, como se vê em algumas estratégias empresariais e publicitárias. Mas que, por outra via, a prevenção ao suicídio seja uma preocupação constante, um compromisso tanto da população quanto dos governos em relação ao cuidado à saúde mental – uma vez que os índices podem ser atenuados, entre outros fatores, pela implementação de políticas públicas e ações coletivas efetivas.
Tamara Mendonça é professora de psicologia