Governadores observam taxação do agro, que pode desaguar em outros estados
Nos bastidores, informação é que Goiás tem sido encarado como “termômetro” para governadores que não descartam seguir pelo mesmo caminho de Ronaldo Caiado
Nos bastidores do alto escalão da política goiana o comentário é que governadores de todo o Brasil estão com os olhos voltados para Goiás. O estado passou a ser visto como “termômetro” para os demais gestores depois que o governador Ronaldo Caiado (UB) optou por buscar equilíbrio nas finanças por meio do setor produtivo.
Conforme mostrado pelo O HOJE, Caiado enviou à Assembleia Legislativa de Goiás um projeto de lei que cria o Fundo de Investimento em Infraestrutura (Fundeinfra). O objetivo é compensar as perdas na arrecadação oriundas do reajuste do ICMS. Para isso, a proposta do governo passa pela taxação do agronegócio, que, por sua vez, enxerga a matéria com desconfiança.
A investida contra o setor, claro, trouxe forte reação. A leitura é que governadores, especialmente de segundo mandato, analisam replicar a iniciativa em seus respectivos estados. Porém, aguardam as cenas dos próximos capítulos e avaliam a iniciativa “vale o desgaste” com a categoria.
“Já pensou se essa moda pega? Quem não cria, copia. Principalmente aqueles que não tem que se preocupar com a reeleição e que buscam, de igual forma, uma nova fonte de receita para os cofres do estado”, avaliou uma das fontes consultadas pelo O HOJE quando questionada sobre o olhar atento dos demais gestores.
Na última sexta-feira, vale lembrar, o movimento Agro pela Democracia encabeçado por grandes lideranças do setor divulgou uma nota à imprensa para demonstrar sua “preocupação” em relação ao projeto de lei. O documento frisa que a iniciativa onera o setor agropecuário.
Os dirigentes argumentam que a matéria traz em seu bojo, sob o manto de uma alegada facultatividade, uma condição que basicamente obriga o produtor rural a aderir compulsoriamente ao modelo que o Governo de Goiás quer instituir, “sob pena de perder benefícios fiscais que desoneram o setor” e de não poder usufruir de regimes especiais que privilegiam o seu fluxo de caixa.
“Na Argentina há um consenso de que os direitos de exportação – as “retenciones” – tiveram importante parcela de culpa na deterioração ao longo dos últimos vinte anos do ambiente de negócios, impactando negativamente não só a agropecuária, com a perda de mercados e a redução significativa de investimentos no setor, mas toda a economia daquele país”, argumenta.
Em outro trecho do documento, o movimento Agro pela Democracia diz entender que a defesa do setor rural deve ser despida de vieses ideológicos e acredita que, se assim não for feito, a atenção continuará a ser desviada de temas importantes, como, por exemplo, o do potencial boicote de empresas de países importadores às exportações de parte da produção de grãos do Cerrado.
“Por acreditar na força do diálogo e no poder da representação institucional, o movimento jamais fechará as portas para o estabelecimento de canais de comunicação com as autoridades governamentais competentes, sempre que os temas envolverem os interesses do setor rural”, acrescentou.
E continuou: “as centenas de milhares de produtores rurais que se dedicam à agricultura familiar – em quase cem mil estabelecimentos agropecuários – e toda uma cadeia que gira em torno da agricultura comercial e de outras atividades ligadas ao setor rural, com toda a certeza anseiam por uma representação institucional alicerçada nos mais altos valores democráticos e que ajude a colocar o estado na vanguarda do agronegócio responsável no Brasil, mediante práticas ambientais sustentáveis, mais investimento em ciência, tecnologia, inovação e maior rastreabilidade e conectividade no campo”.
Do agro para o agro
Em entrevista recente, o governador justificou que os recursos arrecadados com a nova contribuição do setor agropecuário vão retornar imediatamente aos produtores rurais, em forma de investimentos em manutenção e pavimentação de novas rodovias, garantindo melhores condições de escoamento da produção e maior competitividade ao setor. Caiado falou sobre o projeto, que está em tramitação na Assembleia Legislativa, ao programa Hora H do Agro, e Jovem Pan News.
“É algo que está sendo, em um primeiro momento, recebido como contribuição e imediatamente será transferido para o setor em rodovias, pontes, viadutos, aquilo que é necessário nessa área. Agora, não querer contribuir para ele mesmo? Não contribuir para ter rodovia asfaltada na porta dele, para ter ponte onde ele possa atravessar? O dinheiro sai do agro e volta para o agro em forma de rodovia”, disse o governador.
“Em 2019, quando peguei o estado em crise fiscal, para aprovar o RRF (Regime de Recuperação Fiscal) exigiram de nós que tributássemos em 14,25% o aposentado que recebia salário. Essa foi a condição para que Goiás deixasse de pagar R$ 3 bilhões (de dívida) por ano para o governo federal e passasse a pagar R$ 480 milhões. Durante todos esses anos, eu venho segurando essa conta. Será que nesse momento em que enfrentamos mais uma crise, uma queda de R$ 5 bilhões na arrecadação do Estado, na única hora em que o setor foi solicitado, uma contribuição que não vai passar de 1,65% é motivo para tanta inquietude?”, questionou.
Entenda
O governador Ronaldo Caiado enviou para apreciação dos deputados, na manhã da última quinta-feira (10/11) um projeto de lei que cria uma espécie de “contribuição agropecuária” em Goiás. Na prática, o texto acarretará na taxação de produtos ligados ao setor. O dinheiro arrecadado será destinado a um fundo de investimento em infraestrutura. O assunto que já movimentava os corredores da Alego na noite de quarta, foi potencializado a partir da chegada formal da matéria ao Parlamento.
O texto foi protocolado na Assembleia Legislativa de Goiás (Alego) a partir do sinal verde do líder do governo, deputado Bruno Peixoto (UB). Imediatamente deputados de oposição se levantaram contra o texto e anunciaram para a próxima quarta-feira (16/11) um “tratoraço” nas intermediações do Legislativo. Diversas lideranças do setor já confirmaram participação no movimento que pode se estender até o Palácio Pedro Ludovico Teixeira, sede do poder administrativo goiano.