Dólar a R$6,15 e queda da bolsa marcam reação ao pacote fiscal de Haddad
Em meio às reações negativas do mercado, uma notícia alegrou o governo: a taxa de desemprego caiu para 6,4%, o melhor resultado desde o início da série histórica
O anúncio do pacote fiscal pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, provocou forte reação negativa no mercado. Nesta sexta-feira (29), o dólar chegou a R$ 6,15 pela manhã, antes de encerrar o dia cotado a R$ 6,0005, enquanto o Ibovespa sofreu queda acentuada. A principal fonte de preocupação entre investidores é a isenção de Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil por mês, considerada por alguns uma medida populista e inoportuna.
A proposta de isenção ofuscou outras ações do pacote, como cortes de despesas projetados para gerar uma economia de R$ 70 bilhões em dois anos. A repercussão negativa começou logo após o anúncio em rede nacional pelo ministro, mas foi amenizada por declarações dos presidentes da Câmara e do Senado, Arthur Lira (PL) e Rodrigo Pacheco (PSD), dadas nesta sexta-feira (29), que defenderam uma análise criteriosa das medidas fiscais e tentam desvincular aa proposta de isenção de IR do pacote.
Acalmando o mercado
Arthur Lira afirmou que a Câmara terá “boa vontade” na análise dos cortes de gastos e que iniciativas que impliquem renúncia de receitas, como a isenção do IR, só serão discutidas em 2024. “Vamos avaliar com cuidado as fontes de financiamento”, disse. Já Rodrigo Pacheco reforçou que a isenção só será implementada se houver “condições fiscais” adequadas.
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Em um evento em São Paulo, Haddad defendeu o pacote fiscal como parte de um esforço contínuo para ajustar as contas públicas, destacando que “a caixa de ferramentas é infinita” e indicando que mais medidas podem ser anunciadas no futuro.
Arriscado
A economista Greice Fernandes, entrevistada pelo O Hoje, classificou a proposta de isenção como um erro. “A infelicidade do governo foi propor essa isenção para quem ganha até R$ 5 mil e taxar rendas acima de R$ 50 mil em um momento inoportuno. Isso não resolve o problema fiscal e só aumenta a incerteza no mercado”, avaliou.
Greice alertou que o alívio prometido à classe trabalhadora pode ser ilusório. “Esse benefício será devolvido em forma de inflação. Com o dólar em alta, os preços sobem, a Selic precisa ser ajustada para conter o consumo, e o crédito desaparece do mercado. O governo precisa controlar seus gastos para evitar que a economia desacelere ainda mais”, enfatizou.
Ela também apontou que o aumento da taxa de juros, previsto entre 0,75% e 1%, até o fim deste ano, pode inibir o consumo das famílias e os investimentos das empresas, reduzindo o crescimento econômico. “Se as famílias deixam de consumir e as empresas de investir, o país cresce menos. É um círculo vicioso.”
Bolsa em queda, desemprego também
A b3, bolsa de valores brasileira, caiu cerca de 3 mil pontos nesta quinta-feira (28), em parte devido ao pacote fiscal, mas também por causa do feriado de Ação de Graças nos Estados Unidos, que reduz a liquidez global. Apesar disso, Greice avaliou que a reação é natural e que o mercado brasileiro permanece robusto.
Segundo especialistas, se o governo não implementar cortes eficientes, o Brasil pode enfrentar uma crise fiscal severa até 2027, possivelmente antes. A inflação, atualmente em 4,76%, corre o risco de atingir dois dígitos, agravando o poder de compra das famílias e as condições de investimento no país.
Um cenário que não pode ser ignorado é o global, que tem contribuido para a volatilidade. Com duas guerras em andamento, as perspectivas econômicas são hostis e adversas. “O governo precisa urgentemente controlar seus gastos para evitar que o Brasil caminhe para uma recessão profunda nos próximos anos”, concluiu Greice.
Mas, em meio a agitação do mercado, uma boa notícia foi divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – a maior queda de desemprego, já registrada desde o início da série histórica, em 2012. A taxa de desocupação recuou para 6,4% no trimestre de julho a setembro de 2024. Em relação ao mesmo trimestre móvel de 2023, a queda é 1,3%. Naquele momento a taxa era 7,7%.
Para Greice, este é um ponto positivo, mas atribuiu o resultado à reforma trabalhista de 2017, durante o governo Michel Temer, que flexibilizou as regras de contratação. “A terceirização permitida naquela época propiciou o cenário de recuperação que vemos hoje”, explicou.
O pacote fiscal será debatido no Congresso nas próximas semanas, e seu desfecho será decisivo para determinar o rumo da economia brasileira, que agora enfrenta uma combinação de desafios internos e externos em um ambiente de alta volatilidade.