Guilherme D’Lucca conquista o Brasil com piadas que nasceram nas ruas de Goiânia
Criado na região Noroeste da capital, o humorista transformou experiências da infância periférica em esquetes que viralizaram nas redes durante a pandemia e o consagraram como um dos grandes nomes da comédia digital

Na última segunda-feira (7), o humorista e influenciador digital Guilherme D’Lucca, conhecido popularmente como “Gardenal”, foi o entrevistado do podcast MandaVê, apresentado por Juan Allaesse. Natural de Goiânia, o comediante ganhou projeção nacional durante o período da pandemia de Covid-19, quando se tornou uma das figuras mais populares nas redes sociais, especialmente por seu conteúdo humorístico que ironiza situações do cotidiano.
Nascido e criado na região Noroeste de Goiânia, no bairro Floresta, o comediante de 26 anos relembra, com ironia, que durante sua infância não era apenas morador da periferia, era sobrevivente. “Era tudo rua de terra. Sempre fomos eu, minha mãe e meu irmão mais novo. As coisas chegavam por último pra gente”, conta. Antes de fazer o público rir, ele carregou muito peso: começou a trabalhar como servente de pedreiro aos 11 anos. Hoje, ainda brinca dizendo que, dependendo do valor da diária, é só chamar, porque foi mais tempo servente do que comediante.
A infância foi marcada por dificuldades, mas também por descobertas importantes. Ele diz que sempre assistiu muita televisão. Em uma dessas fases, o padrasto – que era advogado – conseguiu negociar a instalação da Sky na casa. “Ter TV por assinatura era um luxo. Aquilo era o hype da época”, lembra. Foi assistindo aos programas de comédia que teve o primeiro estalo: “Percebi que fazer rir podia ser uma profissão. Achei incrível”.
Antes disso, já era conhecido pelas piadas na escola. Mas foi com a ajuda de uma tia que deu o primeiro passo no teatro. Ela o apresentou a uma menina, que tinha uma namorada, e ambas faziam teatro. Levaram-no para conhecer o diretor da peça, que logo o convidou para participar. Sem questionar, aceitou: “Bora!”, respondeu. Assim, em 2014, começou sua trajetória na Associação de Moradores do Setor Pedro Ludovico, onde atuou principalmente em peças infantis.
A paixão pelo palco foi imediata. De 2014 a 2016, participou de diversas apresentações, tanto em feiras quanto em festas privadas. “Fazer teatro era incrível. Mas nas festas, a gente era meio jogado. Não tem palco, não tem estrutura. É preciso dignidade pra quem vive disso”, desabafa. Segundo ele, muitos contratantes ainda colocam os comediantes como ‘apresentação surpresa’. Para ele, isso desvaloriza o trabalho. “O ideal é abrir o evento com o humorista. Depois que entra música, as pessoas não prestam atenção mais”.
Mesmo enfrentando essas dificuldades, continuou se apresentando. Seu primeiro maior cachê foi de R$ 600, por um show em Anápolis. “Na volta, comprei lichia, que sempre quis experimentar. Comi e odiei”, ri. Durante esse período, conciliava apresentações e teatro, sempre na base do improviso – não só nos palcos. “Dormia em posto de gasolina pra economizar. Tinha dia que a diária era pouca, então a gente comia com vinte reais na estrada”.
A virada veio acompanhada do caos da pandemia. Em março de 2020, estava em Aracaju para sua primeira temporada de shows fora de Goiás. A ideia era usar a primeira semana para pagar as contas e guardar dinheiro nas semanas seguintes. Mas o lockdown veio como um balde de água fria. “Era dia 14, meu aniversário. Mas foi no dia 16 que recebi o ‘presente’, o diretor reuniu a equipe e disse: ‘Peguem suas coisas, temos que voltar. Tá tudo fechado’”.
De volta a Goiânia, enfrentou o impacto emocional e financeiro do isolamento. “Era o mundo inteiro parado. E eu precisava me sustentar”. Até então, nem usava o Instagram. Mas, com os palcos fechados, teve que se reinventar. “No stand up, a gente gosta da resposta imediata. A piada, o riso. Na internet, você posta e espera alguém reagir”.
Aos poucos, começou a publicar vídeos curtos. Amigos compartilhavam, incentivavam. As poucas curtidas que recebia foram suficientes para despertar um novo caminho. Começaram a surgir pedidos de roteiros e vídeos. E foi aí que ele passou a conhecer de verdade o universo digital e os criadores de conteúdo.
Segundo ele, a comédia sempre foi um caminho natural, mas foi no cenário adverso da quarentena que surgiu a oportunidade de transformar o ofício em ofício digital. “Na pandemia vi a necessidade de fazer comédia de alguma maneira, pois os shows haviam paralisado”, relatou o artista.
Com humor escrachado e personagens caricatos, Guilherme conquistou o público com vídeos como ‘Se meu cachorro falasse’ e ‘Sobrevivendo à natureza’. Durante o isolamento social, seu conteúdo ajudou a aliviar a rotina dos brasileiros. Um dos quadros mais populares é o ‘Gardena’s Bar’, conhecido como ‘o bar mais aleatório do Brasil’, onde situações absurdas geram identificação e boas risadas.
Atualmente, Guilherme integra um coletivo de criadores de conteúdo humorístico ao lado de Fidelis Falante, Jhonatham Coelho, Lucas Batt, Alexandre Aires, Lívio Mateus e Áureo. O grupo, além de produzir vídeos colaborativos, compartilha trechos de sua rotina nos stories do Instagram, ampliando a conexão com o público e transformando o dia a dia em palco permanente. Essa convivência também gera colaborações criativas que alimentam a produção de conteúdo contínuo nas redes.
Seu trabalho, marcado por uma comunicação direta, irreverente e acessível, segue conquistando espaço e cativando públicos de diferentes faixas etárias. Seja nos esquetes improvisados, nas lives ou nas colaborações com outros criadores, D’Lucca mantém firme o propósito de fazer rir sem abrir mão da escuta e da humanidade que o consagraram como um dos nomes mais promissores do humor digital da atualidade.