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sábado, 6 de dezembro de 2025
e-commerce

Como o home office transformou o consumo digital no Brasil

Trabalho remoto muda rotina e impulsiona crescimento do e-commerce, que se adapta a uma nova lógica doméstica de compra e venda

Luana Avelarpor Luana Avelar em 28 de maio de 2025
Home office transformou o e-commerce em parte da rotina doméstica: compras online crescem entre reuniões, cafés e mensagens no celular. Foto: Divulgação
Home office transformou o e-commerce em parte da rotina doméstica: compras online crescem entre reuniões, cafés e mensagens no celular. Foto: Divulgação

O despertador ainda mal tocou, o café ainda está quente e o notebook acaba de ser ligado. Em vez de enfrentar o trânsito ou o transporte público, milhões de brasileiros começam o dia no mesmo lugar onde passarão a maior parte dele: em casa. E é entre reuniões online, tarefas domésticas e pausas improvisadas que outro hábito se consolida — o da compra digital. A ida ao shopping, para muitos, foi substituída por uma aba de navegador aberta no e-commerce.

A consolidação do home office como regime permanente ou híbrido para boa parte da população ativa brasileira mudou não apenas a configuração do trabalho, mas também a maneira como o consumo se insere no cotidiano. Segundo a Bare International, 38% dos trabalhadores no Brasil já atuam em modelos remotos. Esse número não apenas representa uma transformação no mercado de trabalho, como também acende um sinal sobre as mudanças no comportamento do consumidor.

Em 2024, o comércio eletrônico brasileiro faturou R$ 204,3 bilhões — uma alta de 10,5% em relação ao ano anterior. Foram mais de 414 milhões de pedidos, com ticket médio de R$ 492,40, e um total de 91,3 milhões de compradores, segundo dados da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm). A expansão do setor acompanha, de forma quase direta, a reorganização da vida doméstica.

Para especialistas, a relação entre o avanço do e-commerce e a popularização do trabalho remoto é mais do que coincidência. Trata-se de uma nova forma de integrar o consumo ao cotidiano, sem deslocamento, sem filas e com a conveniência de um clique. Os intervalos entre compromissos profissionais viraram janelas para resolver pendências, pesquisar preços ou finalizar compras esquecidas no carrinho. A jornada de compra, antes marcada por deslocamento e tempo reservado, agora é fragmentada e distribuída ao longo do dia.

A digitalização do consumo também envolve a migração da experiência de compra para plataformas de conversa. Segundo pesquisa do Opinion Box, 79% dos brasileiros já utilizam o WhatsApp para se comunicar com empresas. A ferramenta, antes restrita a mensagens pessoais, hoje funciona como vitrine, atendimento, negociação e fechamento de vendas — tudo no mesmo ambiente. O dado é reforçado por outro levantamento da ABComm, que aponta que 93% das empresas já utilizam o aplicativo como canal de vendas e suporte ao cliente.

Essa mudança de paradigma demanda mais do que presença digital: exige adaptação. No lugar da vitrine física, o feed do Instagram. Em vez da abordagem na porta da loja, mensagens diretas com linguagem personalizada. A lógica do consumo passou a seguir o ritmo da casa, da rotina híbrida e da informalidade. A pressa do expediente coexistindo com a liberdade de escolher o horário de comprar — inclusive no intervalo entre dois cafés.

A estética também passou a ter função estratégica. Em uma rede social, o impacto da imagem é tão decisivo quanto o layout de uma vitrine. Fotos claras, vídeos curtos, descrições objetivas e um feed coerente são os novos elementos que substituem o bom ponto no shopping. A comunicação precisa ser rápida, objetiva e empática — e isso vale mesmo quando quem atende é um robô.

O pós-venda, que muitas vezes era negligenciado no varejo tradicional, passou a ganhar novo peso na dinâmica digital. Manter o relacionamento com o cliente, garantir que o produto chegou em boas condições, enviar cupons ou convites para novas campanhas se tornaram etapas importantes da fidelização. Em tempos de concorrência algorítmica, a manutenção do vínculo é mais eficaz do que a captação pura e simples de novos consumidores.

A migração da lógica de consumo para dentro de casa cria um novo cenário social e econômico. O consumidor contemporâneo é multitarefa: compra enquanto trabalha, compara preços enquanto assiste a uma reunião, responde ao atendimento no mesmo chat em que conversa com amigos. A compra deixou de ser um evento isolado para se tornar um gesto corriqueiro. Assim como o cafezinho.

Esse fenômeno não pode ser compreendido apenas pelos números do faturamento. Ele expressa uma reorganização de hábitos e de relações. O espaço físico da loja, o tempo dedicado ao consumo e o próprio significado de comprar mudaram. A pandemia acelerou uma tendência que já existia, mas o home office sedimentou uma cultura digital que, agora, se impõe como permanente.

Não se trata de glamourizar a digitalização das relações de consumo, tampouco de ignorar as pressões sobre os pequenos empreendedores que precisam se adaptar rapidamente a essa lógica. Mas é fato que a casa virou também ponto de venda — e o celular, caixa registradora. A compra não exige mais cartão em mãos ou o passeio de domingo. Basta estar conectado, entre uma tarefa e outra.

A transformação em curso não diz respeito apenas ao consumo. É, antes de tudo, uma transformação das relações sociais mediados pela tecnologia. E, nesse cenário, o e-commerce não é apenas uma nova forma de vender, mas o espelho de uma rotina em que o profissional, o doméstico e o consumo já não têm mais fronteiras visíveis.

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