Parar de fumar exige ruptura com rotinas e vínculos emocionais
Cigarro é associado a hábitos cotidianos e funciona como válvula de escape para emoções como ansiedade e estresse
Apesar de campanhas de prevenção e restrição ao uso do cigarro, o Brasil registrou aumento no número de adultos fumantes em 2024. Dados preliminares do Ministério da Saúde apontam crescimento de 25% desde 2007, com um salto recente: de 9,3% da população adulta em 2023 para 11,6% em 2024. O cenário representa o maior índice desde que a pesquisa Vigitel começou a ser aplicada, e reacende o alerta sobre o impacto do tabaco na saúde pública, nos custos ao SUS e na produtividade.
Mais do que uma dependência química, o tabagismo envolve aspectos emocionais e comportamentais. O cigarro é frequentemente associado a rituais cotidianos e situações de conforto emocional, como pausas no trabalho, momentos de ansiedade ou interações sociais. Essa repetição cria vínculos psicológicos profundos, tornando o hábito resistente mesmo diante de alertas sobre seus riscos. Estudos mostram que o vício psicológico pode ser tão desafiador quanto o físico, com altas taxas de recaída associadas a fatores emocionais e ambientais.
O Instituto Nacional de Câncer (Inca) estima que o tabagismo seja responsável por cerca de 161 mil mortes por ano no país. Além disso, o custo econômico é significativo: segundo relatório da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), os gastos anuais com doenças atribuídas ao fumo ultrapassam R$ 125 bilhões, considerando despesas médicas e perda de produtividade. Mesmo com avanços em políticas de controle, o aumento recente aponta para novos desafios, incluindo a popularização de dispositivos eletrônicos e a mudança no perfil dos usuários.
O processo de cessação do tabagismo não é uniforme e, em geral, exige múltiplas tentativas. Pesquisas da Fiocruz indicam que entre 60% e 70% dos fumantes que tentam parar recaem nos primeiros seis meses. A reincidência está ligada à dificuldade em romper com a rotina estruturada em torno do cigarro. Técnicas como terapia cognitivo comportamental, reorganização de hábitos e suporte em grupos de apoio têm mostrado eficácia, mas a adesão ainda é baixa na maioria das regiões.
Parar de fumar, portanto, demanda mais do que acesso a métodos de substituição da nicotina. Exige intervenção contínua e abordagens que considerem o contexto emocional do usuário. O desafio está em tratar o cigarro não apenas como substância, mas como parte de um sistema de comportamentos automatizados que, para muitos, representa uma forma de regulação emocional diante da vida cotidiana.