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Análise

Regras mais duras do STF para big techs não é censura, mas defesa da sociedade

Ao O HOJE, especialistas comentam decisão do STF; eles veem avanço regulatório sem censura, enquanto gigantes da internet apontam incerteza jurídica e ameaça à liberdade

Bruno Goulartpor Bruno Goulart em 29 de junho de 2025
Regras mais duras do STF para big techs não é censura, mas defesa da sociedade
Foto: Gustavo Moreno/STF

Bruno Goulart

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que ampliou a responsabilização das plataformas digitais pelo conteúdo postado por usuários promete alterar profundamente o ambiente jurídico e empresarial da internet no Brasil. O julgamento, encerrado com placar de 8 a 3, revisitou o artigo 19 do Marco Civil da Internet, que previa que as empresas só poderiam ser responsabilizadas se descumprissem uma ordem judicial de retirada de conteúdo.

Para as big techs, como Meta e Google, o novo entendimento cria um cenário de incertezas. A Meta, dona do Facebook e Instagram, manifestou preocupação pública, afirmando que “a mudança traz insegurança jurídica e pode ter consequências negativas para a liberdade de expressão”. Além disso, estudo do Reglab (Centro de Estratégia e Regulação) estima que, com a decisão, o Brasil possa registrar mais de 243 mil novos processos judiciais em cinco anos, com impacto financeiro superior a R$ 250 milhões, alimentando uma possível “indústria da litigância”.

Não é censura

O presidente da Comissão de Direito Digital e Informática da OAB-GO, Rafael Maciel, porém, descarta que o entendimento do STF possa ser interpretado como censura. “Esse era um temor que se tinha, mas que muitas vezes é muito mais um jogo político das big techs, que fazem isso muito bem, para tentar colocar a população contra qualquer tipo de decisão que lhes seja minimamente desfavorável”, afirmou ao O HOJE. Para Maciel, a decisão não cria obrigação de remoção prévia de conteúdos e nem facilita que políticos usem o instrumento para calar críticos: “A decisão não traz essa responsabilidade para crimes contra a honra, por exemplo, que têm natureza subjetiva. Então, risco de censura eu não vejo nenhum.”

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Segundo ele, a decisão estabelece critérios claros para responsabilização em casos de conteúdos mais graves, como violência e apologia ao crime. “O que talvez possa ser um risco financeiro é a necessidade de as plataformas assegurarem maior transparência e direito à ampla defesa quando elas próprias promovem a remoção de conteúdo. Mas não vejo razão para aumento expressivo de ações judiciais”, destacou.

Notice and takedown

Na avaliação de Maciel, o argumento da Reglab de que haverá uma explosão de processos lembra debates antigos sobre o chamado “notice and takedown” — modelo americano em que o provedor, ao ser notificado extrajudicialmente, deve remover o conteúdo sob risco de punição. “No Brasil, nunca tivemos isso. Aqui, crimes contra a honra já dependiam de decisão judicial e isso não mudou.”

Já o cientista político Lehninger Mota entende que, apesar de a decisão não ser definitiva — porque cabe ao Congresso Nacional legislar sobre o tema —, ela representa um passo necessário. “Nenhuma lei vai atender todas as expectativas de todas as partes. Mas nada pode ficar desregulado. O Brasil é um Estado independente e tem autonomia para definir regras para qualquer empresa, seja brasileira ou multinacional”, afirmou.

Mota defende que regulamentação não é censura e considera exageradas as reações que tentam associar qualquer obrigação de transparência e responsabilização a restrição de liberdades. “As redes sociais não são uma coisa acima do Estado. Você pode falar o que quiser, assim como você pode falar o que quiser aqui no mundo real. Só que vai ser responsabilizado”, disse. Ele sugere que, para maior segurança, seja exigido que usuários se identifiquem com CPF. “A pessoa cria milhões de contas falsas para atacar, espalhar fake news e acha que nunca vai ser responsabilizada.”

Para o especialista, a decisão do STF, ainda que não agrade a todos, expõe a omissão do Congresso, que evitou enfrentar o tema. “Como não existe vácuo de poder, o Supremo está tomando para ele as decisões. É lamentável. Deveria ser uma uma discussão dentro do Congresso com amplo debate público, fazendo as pessoas entenderem que prejudica a democracia você ter um meio de comunicação onde facilite as notícias falsas.”

Regras mais duras

Na prática, o Supremo deixou claro que crimes mais graves — como incitação à violência, terrorismo e pornografia infantil — exigem uma atuação mais diligente das plataformas, que devem ser céleres na remoção sob pena de responsabilização. No entanto, conteúdos de opinião ou críticas políticas continuam protegidos pela exigência de decisão judicial prévia.

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