Ato de Bolsonaro reelegeu Flávio, mas provou que Tarcísio é melhor
Anúncio de escolha feito de supetão teve efeito rápido e mais veloz ainda a fumaça sumiu, provando que a chance da direita está com os governadores, não com a família do ex-presidente
O ex-presidente Jair Bolsonaro já foi condenado duas vezes, pelo caso da reunião com autoridades estrangeiras em que falou sobre urnas eletrônicas e pelo 8 de Janeiro. Além desses, há outros 21 processos no Supremo Tribunal Federal com ministros que o odeiam (Alexandre de Moraes e Flávio Dino), que ele indicou (André Mendonça) e que votou em seu favor no julgamento da bagunça na Praça dos Três Poderes (Luiz Fux). É impossível prever em quantos terá sucesso – até agora, em nenhum – ou a quantos anos será condenado no total (no mínimo, vai passar de meio século).
No Brasil, qualquer que seja o crime ou seu autor, ninguém pode ficar mais de 30 anos no regime fechado. Completou 70 em março passado, então, pode facilmente comemorar o centenário atrás das grades. Na sexta-feira (5), cometeu o grande acerto para riscar as previsões sombrias deste parágrafo, com duas consequências: atirou seu filho senador, Flávio, de volta ao centro das articulações e assumiu que o governador de São Paulo é o astro do elenco. Se Flávio teria problemas na reeleição, ganhou vitamina para evitar problemas.
O retrato que veio das ruas
Flávio Bolsonaro (PL-RJ) anunciou que havia sido escolhido pelo pai candidato ao Palácio do Planalto pelo seu grupo. Nos dias seguintes saíram pesquisas mostrando que, entre os familiares do ex-presidente, os bolsonaristas preferiam a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, presidente nacional do PL Mulher, que será candidata ao Senado pelo Distrito Federal junto com o governador Ibaneis Rocha (MDB) e sua vice, Celina Leão (PP), que vai disputar o GDF.
Outra resposta das ruas trazida pelos levantamentos foi que o atual ocupante do cargo, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ganharia de todos da direita, à exceção de um: apareceu em empate técnico com Tarcísio, que foi ministro da Infraestrutura no governo de Bolsonaro. Parece ruim para o ex e seu rebento? Pois é exatamente o contrário: o que ele queria, conseguiu – um lugar de protagonista na mesa das negociações.
Queriam deixar de fora o sobrenome Bolsonaro
Pelo rumo tomado antes do pré-lançamento de Flávio por Jair, o sobrenome ficava nos encontros apenas como um fantasma pairando sobre os participantes, tipo saco, dispõe do que interessa, mas na hora H é deixado de fora, aproveita-se apenas o conteúdo – no caso de Goiás, a soja, o milho e outros cereais.
O certo é que Flávio voltou às rodas… e na cabeceira da mesa. Aproveitou a mídia espontânea para anunciar que nesta segunda-feira (8) diria seu preço para sair do jogo. Deu mostras do que pode ser o valor, a anistia para todos os envolvidos no 8 de Janeiro, inclusive seu pai. Eita, alto lá: no caso de Jair Bolsonaro, só serve se for perdão amplo, geral e irrestrito, traduzindo, em todos os processos, inclusive o transitado em julgado (não há mais recurso para as depredações nas sedes dos Poderes em Brasília), sem faltar a inelegibilidade.
Evitar cano como o que Motta está dando
Para se eleger presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB) uniu bolsonaristas e Centrão – sim, senhoras e senhores, são grupos diferentes: os primeiros são de direita, o 2º, Centrão, é mais dividido que pão de forma. Promessa nº 1: pautar o projeto de anistia para Jair Bolsonaro e seus aliados. Até agora, não cumpriu.
Caso o Congresso aprove o perdão, o STF pode considerá-lo inconstitucional, como fez com o ex-deputado federal Daniel Silveira, do Rio de Janeiro – condenado por falar mal de ministros do Supremo, Bolsonaro o anistiou e, depois de Lula ganhar a presidência, as vítimas de sua verve o mandaram de volta para o xilindró. Agora, se alguém quiser o apoio de Flávio e demais bolsonaristas, não adianta mais prometer, é primordial mostrar as cartas antes: aprovar a anistia nas duas Casas (Senado e Câmara dos Deputados), colocar Bolsonaro e seus aliados em liberdade, em seguida está feito o acordo.
A bolsa de valores e a carrada de abóboras
Vai dar certo? Pode ser que “sim” e pode ser que “sim, por enquanto”, como na piada em que o sujeito que despencou do 30º andar falou lá pela altura do 20º: “Sim, por enquanto, tudo bem”. Por enquanto, a escolha de Bolsonaro sacudiu as pré-campanhas, além de derrubar a bolsa de valores e elevar o dólar. Ou seja, está dando certo.
Do jeito que a carroça andava, as abóboras selvagens jamais se acomodariam. Determinados setores da direita queriam lançar uma chapa sem os bolsonaristas, que entrariam apenas no papel de eleitores, mais conhecido como massa de manobra. Foi preciso que um sujeito que está cumprindo pena visse o que seus partidários aqui fora toleraram sem chiar: sapo de fora não ronca, apenas vai para o brejo dar seus pulinhos e jamais consegue uma RAM.
Caiado evitou domínio do Centrão sobre a direita
O Centrão estava todo serelepe com o melhor dos dois mundos, montado nos cargos distribuídos pelo presidente Lula e posando de oposição ao lado dos bolsonaristas. A cartada mais ousada ocorreu quando tentou se manter nos ministérios e ainda ocupar a vaga de vice-presidente na chapa do governador Tarcísio de Freitas.
Quem deu um chega-pra-lá no Centrão foi o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, quando o presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), o excluiu da lista de presidenciáveis da direita. Se Caiado não tivesse balançado a moita com a sola da bota, os que estavam atrás dela continuariam escondendo as garras na palma da mão, enquanto as cravava nas costas dos companheiros.

As conversações andam mais velozes que o britânico Lando Norris, campeão de Fórmula 1 de 2025. Caso Tarcísio deixe o Governo de São Paulo, o rearranjo pode ser com seu secretário de Governo, Gilberto Kassab, presidente nacional do PSD, sendo candidato ao cargo e tirando os ocupantes de ministérios. A mexida afetaria a esquerda, pois Lula teria de escalar Geraldo Alckmin para concorrer com Kassab e abrir a vaga de vice para o MDB.
Flávio Bolsonaro disse que já agendou conversa com o presidente nacional do Republicanos, Marcos Pereira, deputado federal por São Paulo. Será o mais tenso dos diálogos porque o assunto atrai resultado ríspido: para unir a direita e o Centrão, Marcos teria de se manter aliado de Tarcísio e ao mesmo liberá-lo para se filiar ao PL. Ocupante de cargo majoritário não precisa esperar a janela da infidelidade para mudar de partido, mas ninguém quer brigar com a Igreja Universal, a TV Record e o Republicanos ao mesmo tempo e por um tema passível de consenso.
Tarcísio transita bem em todos os lados porque o mastodôntico Estado de São Paulo é praticamente um país – se fosse independente, seria um dos 30 maiores países (46 milhões de habitantes), com quase 1/3 do PIB brasileiro. Sua rejeição é, segundo as pesquisas do fim de semana, 32 pontos percentuais menor que a de Lula. É o queridinho de seus colegas governadores, inclusive do de Goiás, Ronaldo Caiado. Já disse que, se fosse eleito presidente, anistiaria os condenados pelo 8 de Janeiro. Portanto, só falta continuar inteiro depois de dizer a Flávio que precisa de um vice bolsonarista, mas sem o sobrenome Bolsonaro.