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sexta-feira, 26 de dezembro de 2025
psicoterapia inacessível

Saúde mental no Brasil avança pela via da medicação, não da escuta

Dados revelam que saúde mental segue tratada com remédios enquanto a psicoterapia permanece inacessível para a maioria da população

Luana Avelarpor Luana Avelar em 26 de dezembro de 2025
Saúde mental
Foto: FreePik

O cuidado com a saúde mental no Brasil tem avançado de forma desigual. Enquanto o sofrimento psíquico se amplia em diferentes faixas etárias e classes sociais, o acesso à escuta profissional permanece restrito, e a resposta predominante segue sendo a prescrição de medicamentos. Os números não indicam apenas uma tendência clínica, mas expõem uma escolha estrutural sobre como o país decide lidar com o adoecimento emocional.

O Índice Instituto Cactus–Atlas de Saúde Mental (iCASM), elaborado pelo Instituto Cactus em parceria com a AtlasIntel, aponta que apenas 5,1% da população brasileira está em acompanhamento psicoterapêutico. No mesmo recorte, 16,6% dos brasileiros fazem uso de medicamentos controlados. Em termos práticos, isso significa que a saúde mental no país é tratada, majoritariamente, pela via química, enquanto a terapia segue como um recurso para poucos.

Saúde mental e o descompasso estrutural

O contraste se torna ainda mais evidente quando cruzado com dados de prevalência. Estimativas nacionais indicam que mais de 18 milhões de brasileiros convivem com transtornos de ansiedade, colocando o país no topo do ranking mundial. Paralelamente, o mercado farmacêutico segue em expansão: apenas em 2021, as vendas de antidepressivos cresceram 58%, segundo dados do setor.

Para a psicóloga Maria Klien, o cenário revela um desequilíbrio que ultrapassa decisões individuais. “Estamos diante de um modelo em que a saúde mental é respondida com medicação imediata. Ao tratar apenas os sintomas, negligenciam-se as origens do sofrimento, perpetuando um ciclo de dependência química no lugar do cuidado integral”, afirma.

A leitura do iCASM ajuda a compreender essa lógica. Cerca de 70% da população depende exclusivamente do Sistema Único de Saúde (SUS). Embora o SUS concentre a maior rede pública de saúde mental, enfrenta limitações crônicas: escassez de profissionais, demanda reprimida e sobrecarga dos serviços. Nesse contexto, a prescrição medicamentosa se impõe como solução mais rápida e disponível.

O levantamento também indica que grande parte dos antidepressivos é consumida sem acompanhamento contínuo, configurando quadros de automedicação prolongada. O resultado é o mascaramento de sofrimentos mais complexos e o aumento de riscos associados ao uso prolongado desses fármacos.

Os impactos já se refletem no mundo do trabalho. Dados do Ministério da Previdência Social mostram que, em 2024, houve 472 mil afastamentos por transtornos mentais, com custo superior a R$ 3 bilhões. Entre jovens, especialmente da geração Z, o consumo de medicamentos controlados cresce ao mesmo tempo em que se elevam índices de ansiedade e burnout.

Ao final, os dados revelam menos uma expansão do cuidado e mais um encurtamento dele. A saúde mental no Brasil não é ignorada, mas administrada como urgência química. Onde faltam políticas de escuta, sobram receitas. E, nesse arranjo, o sofrimento deixa de ser elaborado para ser silenciado.

Saúde mental
Foto: CRFTO

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