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terça-feira, 26 de novembro de 2024
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NOSTALGIA

Velha infância

Cheia de referências à cultura pop dos anos 80, a série ‘Stranger Things’, da Netflix, diverte adultos saudosistas com trama sobrenatural

Postado em 26 de julho de 2016 por Sheyla Sousa
Velha infância
Cheia de referências à cultura pop dos anos 80

Júnior Bueno

Enquanto crianças e adultos de cinco países andavam pelas ruas, hipnotizados, caçando pokémons virtuais – ou sofrendo crises agudas de ansiedade, porque o jogo não está disponível, no caso dos brasileiros – a rede de vídeos Netflix colocou no ar uma série que celebra a última década em que as bicicletas ainda eram o maior sonho de consumo das crianças, e passar a noite brincando com amigos de carne e osso permanecia como a ideia mais bem acabada de diversão. Stranger Things é uma diversão feita para agradar os nostálgicos dos anos 80 e embala com uma série de referências e uma trilha sonora repleta de hits um thriller sobrenatural.

Disponível desde o dia 15 de julho para os assinantes do serviço de streaming, a serie criada pelos irmãos Matt e Ross Duffer é uma carta de amor aos anos 1980, surfando na onda retrô que parece se alimentar exatamente das ilimitadas possibilidades de consumo nostálgico que a tecnologia oferece. De That ‘70s Show (anos 1970) a Mad Men (anos 1960), já encerradas, a Masters of Sex (anos 1950) e The Americans (anos 1980), ainda em exibição, muitas séries têm apostado nesse filão. 

Mas talvez nenhuma tenha sido tão bem-sucedida no objetivo de alcançar públicos de idades diferentes: entre os muitos espectadores que passaram as últimas semanas devorando os oito episódios, estão tanto os cinquentões que eram adolescentes, em 1983, quanto a legião de jovens e crianças que nunca gravou uma fita cassete ou assistiu a um televisor sem controle-remoto. A receita deu tão certo que, mesmo antes da estreia, a série já havia  uma segunda temporada confirmada. 

A trama combina suspense, terror sobrenatural e a paranoia real da época: a Guerra Fria. Enquanto uma turma de garotos de 12 anos tenta descobrir o paradeiro de um amigo que desapareceu, os espectadores se divertem caçando pistas de referências aos anos 1980. Steven Spielberg e Stephen King são as influências mais evidentes na trama. Do cineasta, há referências explícitas a Poltergeist, escrito e produzido por ele, e E.T. obra-prima oitentista de Spielberg, ambos de 1982. De King, impossível não lembrar de Chamas de Vingança (1984) e Conta Comigo (1986).

A ideia do horror invisível, mas sempre presente, bebeu nos clássicos A Morte do Demônio (1981) e O Enigma de Outro Mundo (1982). Há diversão à vontade para quem se dedicar a identificar os ícones da época, a começar pelos dois adultos que lideram o elenco: Winona Ryder, no papel da mãe que não desiste de encontrar o filho, mesmo quando todo mundo acha que ela está ficando maluca; e Matthew Modine, o assustador vilão de cabelo platinado. Os dois possuem carreiras que começaram na década de 1980 e se desaceleram nos últimos anos.

A trilha sonora não poderia deixar de homenagear a década do pogobol e é uma atração à parte – desde a música tema, com um sintetizador fininho, até a música ‘principal’ Should I Stay or Should I Go, do The Clash, que serve de amarração para a relação fraternal de Will e Johnathan e é a música favorita do garoto mais novo. Fazem parte ainda da trilha hits da década, como Raise a Little Hell, da banda Trooper; Heroes, releitura de Peter Gabriel para a canção de David Bowie; White Rabbit, do Jefferson Airplane, e There Is A Light That Never Goes Out, de The Smits, dentre outros. 

O segredo do sucesso de Stranger things, porém, não está na profusão de referências ou na trama de suspense, mas no adorável elenco infantil, comandado por Millie Bobby Brown, no papel de Onze, misteriosa menina de cabelos curtos que tem poderes sobrenaturais. Sua personagem passou sua infância servindo de cobaia para uma terrível organização. Millie é uma atriz que, ao mesmo tempo, evoca a inocência de uma garota que cresceu distante da civilização (e não conhece conceitos básicos como os de amizade ou promessa), como também confere peso dramático a alguém que, mesmo tão nova, já passou por muita coisa. A turma de garotos não fica atrás, com desempenhos sobrenaturalmente graciosos e convincentes.

A série assusta os espectadores mais jovens com monstros e dimensões paralelas, diverte os mais velhos com a bem cuidada reconstituição de época e as referências oitentistas, além de mostrar para espectadores de todas as idades como a ciência pode ser divertida. O nome da cidade onde se passa a história não poderia deixar isso mais claro: Hawkins, uma homenagem ao cientista Stephen Hawkings. Mas é o puro prazer de contar com amigos de verdade que vai lembrar, a adultos e crianças, o poder mágico que nenhum pokémon tem. 

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