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terça-feira, 26 de novembro de 2024
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CRÍTICA

Moonlight: Afeto sob a luz do luar

Primeiro filme com grande visibilidade do diretor Barry Jenkins, ‘Moonlight’ mostra que é possível enxergar a realidade áspera através de um

Postado em 22 de fevereiro de 2017 por Sheyla Sousa
Moonlight: Afeto sob a luz  do luar
Primeiro filme com grande visibilidade do diretor Barry Jenkins

Toni Nascimento 

Durante as suas quase duas horas de duração, 1 hora e 51 minutos para ser mais específico, Moonlight – Sob a Luz do Luar parece ser filmado através de uma lente mágica, capaz de transformar algumas das misérias do mundo em poesia triste, às vezes tornando a realidade brutal em um conto de fadas pós-moderno. Toda essa poesia visual executada pelo diretor Barry Jenkins e pelo diretor de fotografia James Laxton, torna o longo uma daquelas experiências que superam a função básica de ser uma boa história, e, indo além, se tornam necessárias para a sua época. 

Em um mundo onde a intolerância ganha cada vez mais espaço – às vezes através da voz de líderes de grandes nações, e talvez Donald Trump seja o maior deles, e o preconceito ainda se mostre resistente em pleno século 21, seja ele contra raça, gênero ou mesmo identidade–, o cinema se torna em alguns casos uma arma contra a ignorância, levando ao maior número de pessoas histórias que ensinem, através da tela, grande lições que a sociedade não está sendo capaz de absorver e entender. 

O filme, que concorre ao Oscar 2017 com oito indicações e é um dos favoritos logo atrás de La La Land, conta a história de Chiron em três fases da sua vida: infância, adolescência e vida adulta. É interpretado magistralmente bem por Alex H. Hilbbert quando criança, Ashton Sanders quando adolescente e por Trevante Rhodes na vida adulta. Quando a luz do cinema ascende e as letras começam a subir, torna-se nítido como as três linhas temporais, depois de completas, mostram como a realidade pode ser brutal e que algumas vezes na vida a aleatoriedade de circunstâncias define mais o futuro do que os próprios personagens dela. 

Chiron é negro e gay, e, em meio a uma comunidade negra preconceituosa, ele descobre aos poucos quem é e aquilo que sente. Apesar das três fases valorizarem o silêncio muito mais do que os diálogos para conseguir contar a história, é Alex H. Hilbbert que consegue deixar a ausência de voz palpável, desde a sua primeira cena, quando aparece correndo de outros garotos que querem bater nele, e acaba se encontrando pela primeira vez com o traficante de drogas Juan, interpretado pelo concorrente ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante pelo papel, Mahershala Ali. 

É interessante como, neste ponto, o filme consegue subverter a convenção e desperta questionamentos que vão além daqueles propostos pelo plot central do longa. Chiron é criado apenas pela mãe, Paula, interpretada de maneira única e marcante pela atriz Naomie Harris, que se prostitui para conseguir usar drogas. Sem carinho e cuidado em casa, o garoto acha abrigo na vida de Juan e sua esposa, Teresa, interpretada pela cantora – e agora – atriz Janelle Monáe. 

Chiron é tratado bem e tem sua sexualidade aceita, pela primeira vez na vida, pelo homem que vende drogas à sua mãe e a outras milhares de pessoas, fazendo do vício um negócio lucrativo. É neste homem que o garoto projeta o mais próximo que conhece de um pai, e é nesta família, mesmo que em quase silêncio, que ele vai descansar. Ainda na infância – apesar de que é na adolescência que será desenvolvimento –, Chiron encontra seu primeiro – e talvez único – amor. 

Kevin (interpretado por Jaden Piner na infância, por Jharrel Jerome na adolescência e por Andre Holland na vida adulta) é, desde garoto, bem-resolvido na sua sexualidade, e se torna um espelho para Chiron. Na juventude, os dois se envolvem e, em um abraço, o personagem principal enxerga todo o afeto possível que a vida humana e o amor podem proporcionar. 

E, já no meio do filme, é possível vislumbrar e se confirmará, mais tarde, no fim, sobre o que Moonlight se trata. A adaptação usa o racismo e a homossexualidade para mostrar, de forma e sutil, qual é solução para os problemas listados no começo da crítica. E simplesmente notamos que, contra todo mal causado pelos homens e principalmente contra a dor, é preciso afeto.

Moonlight é sobre afeto. Sobre como o ser humano consegue mudar a rota dos outros através do mal que pratica e como consegue ajudar e até salvar por meio  do bem e do afeto, do amor, que usa com os outros. Tudo isso é notável quando Chiron fala, pela primeira vez, e se entrega para Juan e Tereza, mesmo depois de ganhar muitas feridas por dentro, quando beija o amigo na praia depois de deslumbrar carinho vindo dele, quando perdoa a mãe, já adulto, depois de tudo que sofreu por ela ao notar que ela o ama – apesar de tudo. 

Com um roteiro, também escrito por Barry Jenkins, que afasta a prosa o máximo possível de uma película e a aproxima ao máximo de uma crônica de costumes, ele deixa claro para o público que a melhor arma para vencer os preconceitos é o afeto. E, no fim das contas, a arte imita a vida, e a realidade também deveria ser sobre afeto.

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