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sexta-feira, 29 de novembro de 2024
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Descaso

Famílias sofrem com corte de medicamentos da Prefeitura de Goiânia

Corte na distribuição de medicamentos compromete o tratamento medicamentoso, pois diminui as opções| Foto: Wesley Costa

Postado em 8 de junho de 2020 por Sheyla Sousa
Famílias sofrem com corte de medicamentos da Prefeitura de Goiânia
Corte na distribuição de medicamentos compromete o tratamento medicamentoso

Igor Caldas

Após cortes de medicamentos fornecidos gratuitamente para a população pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS), população carente sofre com falta de fármacos essenciais para tratamentos de patologias relacionadas à saúde mental, colocando em risco o tratamento de pessoas carentes com diversos tipos de transtornos. Estudos demonstram que a incidência de depressão aumentou durante a quarentena. 

A Portaria 170 da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) informa a atualização da relação de medicamentos fornecidos pela prefeitura. Medicações retiradas do fornecimento da SMS como o zolpidem, citalopram, escitalopram, sertralina, venlafaxina, alprazolam, clonazepam cp, nitrazepam, Bupropiona, Lorazepam, Imipramina. Membros do Conselho local de Saúde do Centro de Atenção Psicossocial (Caps) Esperança denunciam que além dos cortes, faltam profissionais e medicamentos que ainda estão listados para serem distribuídos. 

De acordo com o vice-presidente do Conselho, Edinaldo Marques Neves, a atitude foi feita de forma arbitrária sem consulta aos profissionais de saúde, que são os responsáveis pelas prescrições. O ato compromete significativamente o tratamento medicamentoso, pois diminui as opções de fármacos e traz a necessidade de compra de medicamentos, por parte dos pacientes.

Membros do Conselho Local do Caps Esperança foram até o Paço Municipal na última semana para a entrega de um documento à Gerência de Saúde Mental que relatava esse e outros problemas que a área tem enfrentado na Capital. No entanto, a negativa da gerência em recebê-los gerou indignação. “Deixo aqui minha indignação com a saúde mental em Goiânia, onde o descaso foi comprovado mais uma quando a própria gerência de Saúde Mental, que deveria cuidar dos usuários, não deixou o Conselho nem entregar um documento e não se dispôs a nos ouvir”, diz a nota de repúdio, publicada no último dia 3.

Situação precária

Carmen Lúcia Ferreira trata de depressão e ansiedade no Caps Esperança e também é membro do Conselho. Ela afirma que desde que começou o tratamento, há dois anos e meio, nunca viu a unidade de saúde em situação tão precária. “O Caps Esperança está pedindo socorro porque tem profissionais que querem ajudar as pessoas, mas não tem o apoio do governo para fazerem esse trabalho”. A paciente ainda diz que muitos servidores chegam a gastar dinheiro do próprio bolso para comprar insumos que faltam na unidade.

A paciente ressalta que a unidade do Caps Esperança atende várias regiões de Goiânia porque é considerado referência em tratamento de saúde mental, mas não está mais conseguindo atender a demanda por falta de recursos. “Como lá é diferenciado, as pessoas indicam o tratamento no local. Mas muitos tratamentos não fazem efeito sem fármacos”.

Carmem cita seu caso como exemplo. Quando ela fica sem tomar os remédios, não consegue se levantar da cama. “Eu tomo dois remédios. Um é para conseguir dormir e o outro é para passar o dia bem. Sem eles, eu fico de cama, deitada o dia inteiro”. Ela relata que algumas pessoas que fazem tratamento no Caps, têm doenças graves e não conseguem nem raciocinar sem os medicamentos. “Eu estou expondo meu caso, porque sei que preciso, mas existem pessoas ainda mais necessitadas do que eu, que não têm nenhuma condição de arcar com os custos dos medicamentos”.

Uma das características mais marcantes da unidade, segundo Carmen, é a atenção dada pelos profissionais de saúde aos pacientes em tratamento. Na última crise de depressão e ansiedade de Carmen, ela foi procurada pelos servidores do Cais. “Lá, eles se preocupam com a gente. Da última vez que fiquei de cama a doutora me ligou para ver se estava bem, conversou comigo e marcou uma consulta”. Carmem declara que a aproximação entre profissional e paciente fundamental para que o tratamento faça efeito. 

Estudos mostram aumento de ansiedade e depressão 

De acordo com uma pesquisa coordenada por Alberto José Filgueiras Gonçalves, professor Adjunto do Departamento de Fundamentos em Psicologia do Instituto de Psicologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) houve o número crescente de casos de ansiedade durante a pandemia Covid 19. A pesquisa realizada pela Uerj entre o início da quarentena no Rio de Janeiro e as últimas semanas de abril deste ano, mostrou um aumento no número de casos de depressão neste período e a piora de sintomas naqueles que já tinham um transtorno mental prévio. 

O estudo aponta que o número de procura pelas consultas psiquiátricas e modalidades de psicoterapia tem sofrido um crescimento que já se mostrava desde dezembro de 2019 e com o surgimento da pandemia é observado um chamado “tsunami de problemas mentais”, conforme relatam especialistas da área. A procura por atendimentos psiquiátricos levou a uma regulamentação apressada da telemedicina, que até então ainda se encontrava em análise pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). Os serviços de seguro de saúde e saúde suplementar mostraram uma crescente na busca por consultas on-line na psiquiatria de até 100 consultas ao dia nos planos.

Ansiedade e depressão

Estudos revelam que o tratamento da depressão e dos transtornos ansiosos tem grande eficácia com uso de antidepressivos inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS) com grau de evidência certificada por análises e estudos clínicos. Os fármacos ISRS mais conhecidos são a fluoxetina e sertralina, porém há uma variedade maior de substâncias como: paroxetina, fluvoxamina, citalopram, escitalopram. Alguns desses medicamentos foram suprimidos da distribuição da SMS, como é o caso do escitalopram, sertralina e citalopram.

Um documento redigido pelos profissionais de saúde do Caps Esperança demonstra por estudos técnicos a necessidade de haver um arsenal medicamentoso variado à disposição nos serviços de saúde mental. De acordo com os estudos, o paciente deve ser atendido com respaldo cientifico e seguimento de protocolos que demonstram melhor eficácia e tenha seu sofrimento abrandado com uso de fármacos eficientes até que consiga recuperar e desenvolver seu capital mental por meio da psicoterapia e técnicas integrativas.

Apenas dessa forma, eles serão capazes de retomar autonomia emocional e sua funcionalidade social, laboral e desfrutar os prazeres da vida, sendo capaz de vencer as adversidades que ela traz. Da mesma forma como um dia este paciente foi antes de adoecer. O documento conclui que a escolha de corte dos fármacos por uma questão econômica representa uma verdadeira “escolha de Sofia” em relação às pessoas que tem problemas psíquicos.

“Entendemos a situação de crise que vivemos, as dificuldades que encontramos nas áreas financeiras, gestão, e ainda por cima política. Sabemos que devido a crise, escolhas difíceis devem e estão sendo feitas, e muitas outras ainda estarão por vir. Porém, tudo que pedimos é que não tenhamos que fazer a “Escolha de Sofia” justamente com aqueles que foram obrigados a fazer esta escolha infeliz em suas própria vidas, depois de adoecerem por algo que eles mesmos nem sempre compreendem, e que lhes privaram de algo inato a todo ser humano: o prazer viver”, conclui o documento. (Especial para O Hoje)

 

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