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domingo, 24 de novembro de 2024
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Economia

Saída da Ford vem depois de produção e vendas de veículos encolherem 45%

O episódio revela muito da falta de visão e incapacidade da equipe econômica do senhor Paulo Guedes e de parte dos empresários nacionais de tomar decisões estratégicas | Foto: Reprodução

Postado em 14 de janeiro de 2021 por Sheyla Sousa
Saída da Ford vem depois de produção e vendas de veículos encolherem 45%
O episódio revela muito da falta de visão e incapacidade da equipe econômica do senhor Paulo Guedes e de parte dos empresários nacionais de tomar decisões estratégicas | Foto: Reprodução

Lauro Veiga 

A
ausência de uma política de desenvolvimento econômico de longo prazo, baseada
na imposição de contrapartidas claras a empresas e grupos eventualmente
beneficiados no processo, permeia a decisão da Ford de deixar o Brasil. O
achatamento sistemático do mercado doméstico também compõe a equação por trás
daquela decisão, enquanto economistas e analistas pró-mercados tentam empurrar
para a opinião pública análises simplistas e sabidamente equivocadas, mas com
objetivos nada dignificantes. Adicionalmente, o episódio revela muito da falta
de visão e incapacidade da equipe econômica do senhor Paulo Guedes e de parte
dos 
empresários
nacionais de tomar decisões estratégicas.

A
tal reestruturação global aventada pela multinacional para justificar sua
decisão na verdade parece dizer mais respeito aos maus resultados que a
companhia tem colhido nos últimos anos, com perdas econômicas e de mercado para
concorrentes asiáticos principalmente. Essa parece ser uma parte da história,
mas que não explica tudo. Como têm lembrado os economistas André Roncaglia e
Paulo Gala, a perda de escala da operação brasileira parece explicar muito mais
a movimentação ensaiada pela Ford, entre outros fatores.

As
séries históricas de dados da Associação Nacional de Fabricantes de Veículos
Automotores (Anfavea) mostram que a produção e as vendas do setor vêm
encolhendo desde os primeiros anos da década passada, tendências agravadas pela
pandemia, mais recentemente. Mesmo antes da crise sanitária, a economia
brasileira já vinha sustentando indicadores medíocres, demonstrando baixa
capacidade de retomar um ritmo mais alentado de crescimento depois da recessão
de 2015/16. A produção de veículos montados atingiu seu nível mais elevado na
série em 2013, com praticamente 3,714 milhões de unidades (um salto de 120% em
10 anos).

O
encolhimento do mercado

No
ano passado, foram montados 2,014 milhões de veículos, o pior desempenho em 17
anos, num tombo de 45,8% em sete anos.

As
vendas, medidas pelo total de veículos licenciados a cada ano, não tiveram
melhor sorte. Depois de crescerem 166% entre 2003 e 2012, para 3,802 milhões de
unidades – recorde para o setor até o momento –, as vendas despencaram 45,9%
até 2020, chegando a apenas 2,058 milhões (o número mais baixo desde 2016, em
plena recessão). As montadoras – denominação muito apropriada para uma
indústria que se limita a montar veículos, sem gerar ganhos tecnológicos para o
setor e para o restante da economia – liquidaram praticamente um quarto dos
empregos nos últimos anos, fechando 39,11 mil vagas entre outubro de 2013 e
dezembro de 2020. No período, o total de empregados saiu de 159,648 mil para
120,538 mil, numa queda de 24,5%.

Balanço

·  
Os governos (estaduais e federal) concederam pacotes
de incentivos fiscais à multinacionais do setor, com crédito barato oferecido
pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) – que agora
se preocupa em cobrar R$ 335,0 milhões em linhas de financiamento contratadas pela
Ford.

·  
Todas aquelas medidas foram desenhadas sem que
houvesse um real política de desenvolvimento no País, que deveria ter imposto
contrapartidas pelos benefícios distribuídos, envolvendo percentuais crescentes
de utilização de conteúdo local na produção, investimentos em pesquisa e
desenvolvimento tecnológico, de forma a construir internamente centros com
capacidade para a produção própria de veículos, além da geração de empregos e
de exportações de bens de alto valor agregado, contribuindo para reforçar o
superávit na balança comercial, de forma estrutural.

·  
Sem mercado e sem qualquer tipo de compromisso com o
País, decisões como a da Ford tendem a se multiplicar. Como lembram Roncaglia e
Gala, as multinacionais (e qualquer tipo de empresa, no fundo) buscam mercados
que lhes permitam uma escala de produção capaz de diluir custos fixos, gerar
margens de retorno para o investimento realizado e explorar terceiros mercados
a partir de bases instaladas em regiões específicas, em condições competitivas.

·  
Fossem outros os ocupantes do Planalto e, mais
especificamente, do Ministério da Economia, e fossem de outra qualidade os
empresários do País, podia ser articulado um movimento para assumir a operação
brasileira da Ford, com apoio financeiro do BNDES, evitando o fechamento de
empregos, estimados em 5,0 mil apenas nas unidades da montadora (perto de 4,0%
dos empregos totais do setor), sem incluir os impactos sobre o restante da
cadeia de fornecedores de autopeças e insumos.

·  Sob outro formato, proposta semelhante foi levantada
pelo premiado jornalista Luís Nassif em seu blog (
https://jornalggn.com.br/), que
sugere a nacionalização da Ford brasileira, em caráter emergencial, e a
abertura de licitação para “grupos que se interessem em assumir a empresa”,
igualmente com parte do investimento financiado pelo BNDES. Mas seria esperar
muito de um desgoverno que sequer consegue organizar a vacinação em massa
contra a Covid-19.

 

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