Suposta tentativa de silenciar mulheres em Goiânia, Aparecida e Rio Verde aponta para discriminação de gênero na política
Parlamentares Aava Santiago (PSDB) e Marussa Boldrin (MDB) dizem que houve tentativa de intimidação política contra elas dois meses depois de Camila Rosa (PSD) ter o microfone desligado por presidente da Câmara de Aparecida de Goiânia
Três casos suspeitos de discriminação de gênero contra políticas goianas em 2022 apontam para uma pratica rotineira no Poder Legislativo em Goiás, de acordo com quem denuncia ter sido vítima desse tipo de tentativa de silenciamento. O primeiro deles ocorreu no dia 2 de fevereiro na Câmara de Aparecida de Goiânia. Enquanto a vereadora Camila Rosa (PSD) discutia a existência da cota de gênero nas eleições, o presidente da Casa, André Fortaleza (MDB), ordenou que o som do microfone da parlamentar fosse cortado.
A atitude levou Camila ao choro durante a sessão ordinária da Casa. Em nota, Fortaleza negou que tenha pedido o corte da fala da vereadora em um ato de desprezo às mulheres. Semanas depois, na tribuna do plenário da Câmara de Goiânia, o presidente do Legislativo da cidade vizinha chamou o caso de “showzinho”.
Em Rio Verde
Na segunda-feira (4/4), a vereadora Marussa Boldrin (MDB), pré-candidata a deputada estadual por Rio Verde, passou por situação parecida com a de Camila Rosa. Durante a abertura da feira de agronegócio Tecnoshow Comigo, a parlamentar relatou que acompanhava a comitiva do governador Ronaldo Caiado (União Brasil) em visita à cidade do Sudoeste goiano quando foi abordada pelo ex-vice-prefeito e pré-candidato a deputado federal Dannillo Pereira (PSD) “de uma forma muito agressiva”.
De acordo com Marussa, Dannillo disse à vereadora que ela “não seria candidata a nada”. A parlamentar afirmou que o ex-vice-prefeito de Rio Verde chegou a apontar o dedo para ela. “Eu disse ‘sim, eu sou pré-candidata a deputada estadual’. Eu mal concluí a frase, ele falou ‘você não é candidata a nada, muito menos por cota feminina’.”
A parlamentar indagou, em vídeo publicado no Instagram, se o pré-candidato a deputado federal “daria de dedo no rosto de um homem”. “Uma pessoa como ele não respeita as mulheres. Uma pessoa como ele não respeita os meus eleitores. E muito menos respeita a democracia”, declarou Marussa.
Cena “constrangedora”
A vereadora descreveu que foi acolhida por quem presenciou a cena “constrangedora” e a tiraram de perto de Dannillo Pereira. “Eu senti que estava sendo invadida, que estava sendo desrespeitada naquele momento. Mas tudo isso me traz uma lição: quanto mais pessoas querem me tacar pedra, eu saio fortalecida e com muito mais apoiadores.”
O jornal O Hoje não conseguiu falar com o ex-vice-prefeito Dannillo Pereira sobre a denúncia feita pela vereadora Marussa Boldrin. O espaço segue aberto para manifestação do pré-candidato a deputado federal.
Terceiro caso
Os professores da rede municipal de ensino em Goiânia decidiram entrar em greve no dia 15 de março. Desde então, a prefeitura, depois de muito forçar o fim dos protestos, que têm entre as pautas o reajuste para todos os servidores da Educação dos 33,24% do novo piso nacional da categoria, foram recebidos na sexta-feira (1º/4) no Paço Municipal. Mas a proposta não agradou a categoria, que prevê aumento de 10,16% e reposição de 9,32% da data-base de 2020 e 2021.
Desde o início da greve, os vereadores Mauro Rubem (PT) e Aava Santiago (PSDB) têm acompanhado a mobilização dos professores para tentar intermediar uma tentativa de negociação da categoria com o prefeito Rogério Cruz (Republicanos) e o secretário municipal de Educação (SME), Wellington Bessa. Pela segunda vez, o titular da SME foi convidado a participar da Comissão de Educação e Cultura, Ciência e Tecnologia da Câmara de Goiânia pela presidente do grupo de trabalho no Legislativo da capital, a parlamentar tucana.
A reunião estava marcada desde a semana passada. Na manhã de terça-feira (5/4), inclusive com a participação de vereadores da base do prefeito Rogério Cruz na Casa, a Comissão de Educação ouviu o secretário Bessa por videoconferência. Nos instantes finais da sessão extraordinária da comissão, Aava disse ao O Hoje que um grupo de sete vereadores, capitaneados pelos parlamentares Leo José (PTB), Clécio Alves (Republicanos) e Thialu Guiotti (Avante), tentaram interromper a fala do titular da SME na Casa.
Sem comunicar
De acordo com Leo José, Thialu e Clécio, a reunião com Wellington Bessa não tinha sido comunicada aos vereadores e deveria ser realizada no plenário, não na Comissão de Educação. Na ocasião, representantes do Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Goiás (Sintego) e do Sindicato Municipal dos Servidores da Educação de Goiânia (Simsed) participavam da sessão na sala da comissão. As gritos, como mostram vídeos gravados no momento em que o grupo de parlamentares interrompeu a reunião com o secretário, Leo José e Clécio Alves acusaram Aava Santiago de querer resolver a situação da greve sozinha.
O jornal O Hoje entrou em contato com os vereadores Clécio Alves e Leo José, mas não obteve retorno dos dois parlamentares. Já Thialu Guiotti respondeu que os parlamentares não foram informados sobre a realização da reunião com Wellington Bessa na Câmara Municipal. “Acho que deveria ser debatido em plenário com a presença de todos”, disse Thialu.
Momentos depois do ocorrido, Aava acusou o grupo de vereadores que interrompeu a participação do secretário municipal de Educação na comissão de tentativa de violência política de gênero. “Surgiu no plenário uma conversa completamente atravessada de que o [Romário] Policarpo [presidente da Câmara] estava reunido a portas fechadas, sendo que o Policarpo nem estava na Câmara porque está com covid, com quatro vereadores e o secretário para resolver as coisas e que isso era absurdo porque tinha que ser resolvido no plenário. Mas não existia essa conversa. O que existia era a reunião da Comissão de Educação”, afirmou a vereadora.
Foi quando, de acordo com Aava, o vereador Thialu Guiotti falou na comissão que a reunião deveria ocorrer no plenário. Em seguida, Clécio Alves suspendeu a sessão no plenário e mandou os parlamentares irem até a sala da presidência da Casa. “Chegando lá, era uma sessão extraordinária da Comissão de Educação, e não o que eles estavam ventilando. Só que, mesmo sem ver o Policarpo lá, eles começaram a gritar comigo e me atacar”, descreveu a tucana.
O que mostra o vídeo
No vídeo, é possível ver o vereador Leo José gritar repetidas vezes para Aava Santiago na sala da comissão: “Você vai votar sozinha? Você vai votar sozinha? Você vai votar sozinha?”. Em seguida, Leo José alega que a presidente da comissão “está jogando muito para a plateia”. Nas imagens, aparecem junto ao grupo que interrompeu a falta do secretário de Educação na sala da comissão os parlamentares Dr. Gian (MDB), Leandro Senna (Republicanos), Edgar Duarte (PMB) e Pastor Wilson (PMB).
O vereador Isaías Ribeiro (Republicanos) também aparece ao final do vídeo deixando a sessão extraordinária, mas Aava explicou que ele estava na reunião porque é membro da comissão. Além de Aava Santiago como presidente, fazem parte do grupo temático de trabalho da Câmara Mauro Rubem como vice-presidente, além do líder do prefeito na Casa, Anselmo Pereira (MDB), Gabriela Rodart (DC), Geverson Abel (Avante), Joãozinho Guimarães (Solidariedade), Paulo Henrique da Farmácia (Agir) e Marlon Teixeira (Cidadania) como integrantes titulares.
A vereadora disse que quando Clécio falou para o grupo de vereadores deixar a sala da comissão, “saiu todo mundo junto”. Enquanto a reunião da Comissão de Educação era concluída, Aava relatou que o grupo de vereadores encabeçado por Leo José, Clécio Alves e Thialu Guiotti desceu para o plenário e começou a atacar a presidente do grupo temático na Casa. “Sem eu estar presente. No plenário, o vereador Leo José me atacou.”
Durante a confusão, a conexão do secretário Bessa caiu e ele não participou da parte final da sessão da Comissão de Educação, logo após a ida do grupo de vereadores, que interromperam a reunião com o titular da SME. “Concluímos a reunião quando eles saíram. Só que o secretário entrou no carro e chamada dele caiu antes das minhas considerações finais falando que seria apresentada uma contraproposta. Tudo isso por causa desse tumulto”, explicou Aava.
Mal-entendido
Aava contou ao O Hoje que o único vereador que acompanhou o grupo que interrompeu a participação de Wellington Bessa na Comissão de Educação foi o Pastor Wilson, que teria reconhecido o mal-entendido. “Quem me procurou no plenário para se justificar, pedir desculpa e dizer que estava errado foi apenas o Pastor Wilson”, pontuou a presidente da Comissão de Educação.