Hábitos cotidianos que comprometem a saúde do fígado
A prática regular de exercícios físicos pode beneficiar o fígado mesmo sem perda significativa de peso
Responsável por filtrar toxinas, auxiliar na digestão, armazenar nutrientes e manter o equilíbrio metabólico, o fígado é uma peça-chave para o funcionamento do organismo. Embora seja conhecido por sua capacidade de regeneração, ele pode ser afetado de forma irreversível por práticas nocivas que se acumulam com o tempo.
Médicos alertam que muitos comportamentos comuns, muitas vezes ignorados, podem prejudicar progressivamente a saúde hepática. O resultado pode ser o surgimento de doenças graves, como a cirrose, quando o tecido saudável é substituído por cicatrizes, ou até a falência do órgão.
Um dos principais desafios clínicos está na identificação precoce dessas condições. No início, os sintomas são discretos e podem se manifestar apenas como cansaço frequente ou mal-estar persistente. Com o agravamento do quadro, surgem sinais mais evidentes, como a icterícia, quando a pele e os olhos adquirem tom amarelado.
Apesar de o álcool ser um dos principais fatores de risco, ele não é o único. Entre os hábitos que podem comprometer o fígado está o consumo frequente de bebidas alcoólicas, mesmo em quantidades moderadas. A chamada doença hepática alcoólica avança gradualmente: começa com o acúmulo de gordura, evolui para inflamação e pode chegar à cirrose. Embora o processo seja lento, os danos podem ser severos. Por isso, especialistas recomendam não ultrapassar 14 doses de álcool por semana, intercalando dias sem ingestão.
A alimentação desequilibrada também tem papel central no comprometimento hepático. A MASLD, sigla para a doença hepática gordurosa associada à disfunção metabólica, novo nome da antiga esteatose hepática não alcoólica, tem se tornado cada vez mais comum, sobretudo entre pessoas com sobrepeso, hipertensão, diabetes ou colesterol alto. O excesso de gordura abdominal é um dos principais indicadores de risco.
O tipo de alimento consumido tem impacto direto. Produtos com alto teor de gorduras saturadas, como frituras e processados, elevam a chance de acúmulo de gordura no fígado. Bebidas e comidas ricas em açúcar também são prejudiciais. Um levantamento publicado em 2018 mostrou que o consumo elevado de refrigerantes e outras bebidas adoçadas está associado a um risco 40% maior de desenvolver fígado gorduroso.
Estudos mais recentes também relacionam o consumo de ultraprocessados, como fast food e refeições prontas, ao aumento expressivo de doenças hepáticas. Por outro lado, dietas baseadas em alimentos naturais, como frutas, verduras, cereais integrais, leguminosas e peixes, ajudam a proteger o órgão e até a reverter os primeiros estágios da esteatose.
Manter o corpo hidratado é outro ponto importante. A ingestão de aproximadamente dois litros de água por dia colabora com os processos naturais de filtragem e desintoxicação conduzidos pelo fígado.
Uso incorreto de paracetamol
Comum no tratamento de dores e febre, o paracetamol é amplamente utilizado por sua eficácia e fácil acesso. No entanto, especialistas alertam que o uso inadequado, mesmo em doses ligeiramente acima do recomendado, pode representar um risco sério para o fígado.
O órgão é responsável por metabolizar o paracetamol, processo que gera uma substância tóxica conhecida como NAPQI. Em situações normais, esse composto é neutralizado pela glutationa, um agente protetor natural do organismo. No entanto, em casos de overdose, os estoques de glutationa se esgotam, permitindo o acúmulo do NAPQI, que pode destruir células hepáticas e levar à falência hepática aguda, condição muitas vezes fatal.
O risco é ainda maior quando o medicamento é combinado com álcool ou utilizado repetidamente sem orientação médica. Especialistas recomendam atenção rigorosa à dosagem indicada e alertam: o uso frequente de analgésicos deve sempre ser acompanhado por um profissional de saúde.
Sedentarismo e tabagismo
A falta de atividade física é apontada como um fator de risco relevante para o desenvolvimento de doenças hepáticas. A inatividade favorece o ganho de peso, a resistência à insulina e distúrbios metabólicos, todos associados ao acúmulo de gordura no fígado.
Por outro lado, a prática regular de exercícios físicos pode beneficiar o fígado mesmo sem perda significativa de peso. Um estudo demonstrou que oito semanas de treino de resistência foram suficientes para reduzir em 13% a gordura hepática e melhorar o controle da glicemia. Atividades aeróbicas, como caminhadas rápidas de 30 minutos realizadas cinco vezes por semana, também se mostraram eficazes na redução da gordura no órgão e no aumento da sensibilidade à insulina.
Outro fator pouco conhecido pelo público é o impacto do cigarro na saúde do fígado. Embora frequentemente relacionado ao câncer de pulmão e a doenças cardiovasculares, o tabagismo também compromete de forma significativa o funcionamento hepático. A fumaça do cigarro contém milhares de substâncias tóxicas que, ao serem processadas pelo fígado, provocam estresse oxidativo, processo em que radicais livres danificam as células do órgão e favorecem o surgimento de cicatrizes, como as observadas na cirrose.
Além disso, o cigarro é um importante fator de risco para o câncer de fígado. Substâncias como nitrosaminas, alcatrão, cloreto de vinila e 4-aminobifenil são reconhecidas por seu potencial carcinogênico. De acordo com a organização Cancer Research UK, cerca de 20% dos casos de câncer hepático no Reino Unido estão associados ao tabagismo.
Cuidados simples
Apesar de ser um dos órgãos mais resistentes do corpo humano, o fígado não está imune aos efeitos cumulativos de hábitos prejudiciais. Especialistas ressaltam que algumas medidas simples no dia a dia podem fazer grande diferença na preservação da saúde hepática.
Entre as principais recomendações estão o consumo moderado de álcool, a interrupção do tabagismo, o uso responsável de medicamentos e a adoção de uma alimentação equilibrada. A prática regular de atividades físicas e a ingestão adequada de água também são fundamentais para o bom funcionamento do órgão.
Sinais como fadiga constante, náuseas frequentes ou o amarelamento da pele e dos olhos (icterícia) podem indicar problemas no fígado. Nestes casos, a orientação é buscar atendimento médico. O diagnóstico precoce aumenta significativamente as chances de tratamento eficaz.