Coluna

A retomada (quando vier) tende a ser muito lenta, mostra histórico recente

Publicado por: Sheyla Sousa | Postado em: 14 de abril de 2020

As
estimativas continuam escorrendo freneticamente das planilhas para o noticiário
econômico, sinalizando uma crise mais dramática do que a imaginada inicialmente
pelos mercados, mas também por analistas e economistas de diversas vertentes do
pensamento econômico. Em meio aos sinais de uma grave retração da atividade
econômica diante da duração ainda indeterminada da pandemia, já houve quem se
arriscasse a prever que a retomada, em algum ponto do futuro, poderá ser
relativamente rápida, a se considerar o tamanho do tombo anunciado.

As
perspectivas de uma saída mais tranquila ou mais traumática da crise dependerá,
o que parece evidente, das ações e políticas que os governos adotarem nesta
fase, da rapidez em sua implantação efetiva e de altas doses de coordenação e
de cooperação entre os governos e entre esses e o setor privado. O Brasil já
tropeçou nos dois últimos pontos. Houve certa demora na definição das medidas e
há dúvidas em relação à capacidade de atender a tempo às faixas da população
mais vulnerável que estão fora dos cadastros oficiaise de programas públicos de
transferência de renda e ainda ao total de trabalhadores informais, ao mesmo
tempo em que os Estados têm tomado decisões de forma isolada, sem uma
coordenação racional.

O
histórico recente não parece recomendar as apostas numa reação mais substancial
da economia assim que encerrada a crise. Mesmo porque há grande probabilidade
de a retração se prolongar muito além dos dois a três meses considerados pela
equipe econômica ao desenhar o pacote de socorro a bancos, empresas e às
famílias. O mais provável é que esse pacote tenha ainda que ser reforçado mais
à frente.

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Retomando
o fio da meada, os indicadores dos setores de serviços, varejo ampliado
(classificação que inclui as concessionárias de veículos e motos, lojas
autopeças e de material de construção, além de todo o varejo convencional) e da
indústria mostram que a economia sequer conseguiu retomar os níveis anteriores
à recessão de 2015/2016 e, no caso da produção industrial, os resultados ainda
estavam abaixo daqueles alcançados antes da greve dos caminhoneiros, em maio de
2018.

Previsões
revisadas

Notoriamente,
a economia já enfrentava sérias dificuldades para imprimir um ritmo mais
vigoroso aos negócios em geral e não há motivos, até aqui, para supor que essa
capacidade venha a ser retomada na sequência de uma crise que ameaça produzir
um tombo inédito no Produto Interno Bruto (PIB) em apenas um ano. Mesmo com
toda a ajuda do setor público, as estimativas mais recentes sinalizam a perspectiva
de que a retração possa atingir 5,0% neste ano, na projeção mais recente do
Banco Mundial, com algumas consultorias já trabalhando com estimativa de perda
de 6%. Na média das previsões do mercado financeiro, coletadas pelo Banco
Central (BC) e reunidas no relatório Focus, o setor espera queda de 2,0% para
este ano na média das estimativas. No final de março, os prognósticos indicavam
recuo de 0,59%.

Balanço

·  
As
vendas do varejo ampliado, a despeito da reação observada depois da recessão,
vinham desacelerando neste começo do ano estavam, em fevereiro, 7,2% abaixo do
seu melhor momento, registrado em agosto de 2012. Da mesma forma, no setor de
serviços, persistia uma redução de 11,1% frente a novembro de 2014, quando
havia sido anotado o pico para a atividade na série mais recente do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

·  
A
produção da indústria chegou a fevereiro com queda de 2,4% em relação a abril
de 2018, um mês antes da greve dos caminhoneiros, que paralisou o abastecimento
em todo o País. Na comparação entre os trimestres encerrados em fevereiro deste
ano e em mais de 2011, o IBGE anotava uma retração de 16,6% para o setor. A
crise de agora, numa diferença central em relação à recessão anterior, atinge a
oferta (produção de bens e serviços) e a demanda, o que explica as previsões
muito mais negativas.

·  
No
relatório divulgado no domingo (“A economia nos tempos da Covid-19”), o Banco
Mundial recomenda que os países atuem em diversas frentes para evitar um
desastre ainda maior, providenciando liquidez para o setor financeiro,
reforçando substancialmente a ajuda aos mais vulneráveis e adotando políticas
de sustentação do emprego (e, portanto, da renda).

·  
Mesmo
assim, será difícil evitar que o PIB caia perto de 4,6% na América Latina e no
Caribe, com baixas de 6,0% para México e Equador (países que demoraram mais a
reagir ao coronavírus) e retrações de 5,2% e de 5,0% para Argentina e Brasil. O
enfrentamento da pandemia e de seus efeitos sobre a economia, acrescenta o
economista chefe do banco para a região, Martin Rama, “exigirá políticas
coerentes e direcionadas em uma escala raramente vista antes”.

·  
Considerando
as medidas já anunciadas pelo governo federal, um grupo de economistas do
Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV) projeta
redução de 5,2% para a massa salarial (recorde desde o início da série em
2003), com fechamento de 6,0 milhões de empregos, desemprego de 17,8% (era de
11,6% no trimestre terminado em fevereiro deste ano) e queda de 3,4% para o
PIB, num cenário base. Sem as medidas, o tombo na massa salarial poderia
atingir 10,3%.

·  
No
caso de um agravamento da crise, com prolongamento das medidas de isolamento
social, a massa salarial pode encolher 13,8%, refletindo tombo de 13,5% na
população ocupada, o que estaria mais próximo de uma retração de 7,0% no PIB. O
desemprego, nesta hipótese, saltaria para 23,8%, lançando mais 12,6 milhões de pessoas
na desocupação e deixando desempregados perto de 24,9 milhões de brasileiros.