Agro dispõe de tecnologia para cortar emissões, mas esta não chega a todos

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 09 de setembro de 2023

A ciência agronômica já dispõe de ferramentas e modelos “adequados e eficazes” para reduzir substancialmente as emissões da agropecuária no País, declara Isabel Garcia-Drigo, gerente de clima e emissões do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora). O arsenal desenvolvido pela pesquisa brasileira contempla desde formatos de plantio direto na palha recomendados para cada região, intensificação da pecuária de corte, até práticas para preservar matas e florestas, removendo carbono da atmosfera, relaciona a especialista. Mais relevante, o fim do desmatamento, legal ou ilegal, acrescenta ela, contribuiria de forma decisiva para reduzir emissões e tornar o setor mais sustentável, o que exigirá, entre outros pontos, o enfrentamento da grilagem de terras, sobretudo na Amazônia.

O grande problema, complementa Isabel, será garantir “que todo este receituário seja realmente aplicado por todos os perfis de produtores: pequenos, médios e grandes”. Os compromissos assumidos por entidades e grandes empresas do setor, avalia ela, são de fato fundamentais, mas há a necessidade, na sua avaliação, de que “sejam traduzidos em metas e ações concretas”. Considerando o universo de médias empresas em toda a cadeia, até aqui, “infelizmente o alcance é ainda pequeno”.

Um dos caminhos para a transformação sustentável das propriedades rurais, sustenta Isabel, está na construção de uma coordenação público-privada, envolvendo os diversos atores do agro, combinando formas efetivas de monitoramento do desmatamento, outras questões ambientais e sociais, a exemplo do combate ao trabalho análogo à escravidão, e desenvolvimento de sistemas de acompanhamento de emissões nas fazendas. Essa coordenação, entende Isabel, deveria articular ainda “ações de inclusão e acompanhamento de produtores irregulares e de apoio àqueles regulares, mas que apresentam menor desempenho, por meio de crédito e assistência técnica qualificada”. A seu ver, “somente excluir produtores de uma cadeia não vai solucionar o problema do desmatamento e das emissões associadas”.

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Um quarto das emissões

Isoladamente, continua Isabel, o setor agropecuário ainda responde por 25% das emissões de gases formadores do efeito estufa no País, correspondendo a algo em torno de 600,0 milhões de toneladas de carbono equivalente. Daquele volume, detalha a especialista, “quase 64% referem-se a emissões causadas pela fermentação entérica de animais ruminantes e o metano (NH4) é o principal gás de efeito estufa”.

Balanço

  • A Raízen sustenta hoje uma carteira de R$ 3,0 bilhões em financiamentos atrelados a metas de sustentabilidade e protagonizou a sétima e oitava emissões de debêntures amarradas a indicadores sustentáveis, somando em torno de R$ 1,2 bilhão, conforme Ricardo Mussa, CEO da empresa. “Temos R$ 11, 3 bilhões investidos, com foco na expansão do nosso portfólio de renováveis, o que inclui nossas plantas de etanol de segunda geração (E2G)”, acrescenta ele, lembrando que a Raízen deverá colocar de pé 20 plantas de E2G até 2023, das quais oito já foram anunciadas e cinco encontram-se em diferentes fases de construção. Até 2030, os negócios renováveis da empresa deverão responder por 80% do Ebitda justado, quando se espera que a pegada de carbono de todo o negócio já esteja negativa. A oferta de produtos renováveis deverá aumentar 80% até lá.
  • A Bunge assegura que mais de 97% dos volumes de soja adquiridos no Brasil já ocorrem em áreas comprovadamente livres de desmatamento. “Já alcançamos avançada rastreabilidade e monitoramento das nossas compras diretas e indiretas de soja em áreas de alto risco de desmatamento na América do Sul”, reforça Rossano de Angelis Jr, vice-presidente de Agronegócio da Bunge na América do Sul, como parte da meta de zerar o desmatamento e a conversão até 2025.
  • Até o momento, o monitoramento realizado pela multinacional atinge mais de 16 mil fazendas, cobrindo em torno de 20,0 milhões de hectares, com uso de tecnologia de satélite de última geração. Nas áreas de cerrado no Brasil, ainda de acordo em ele, o monitoramento passou a cobrir 100% de todo o volume de soja comprado da cadeira direta de fornecimento, alcançando 82% da cadeia indireta de suprimentos.
  • “Hoje 100% da produção de carne da Marfrig provêm de animais oriundos de áreas livres de desmatamento”, sustenta Paulo Pianez, diretor de sustentabilidade e comunicação corporativa da empresa. O compromisso antidesmatamento foi assumido com o Greenpeace ainda em 2009 e reforçado com o lançamento, em julho de 2020, do Programa Marfrig Verde+, desenvolvido em parceria com a IDH, iniciativa para a promoção do comércio sustentável. No começo da década passada, a companhia passou a monitorar com uso de satélites e em tempo real em torno de 25,0 milhões de hectares, conforme Pianez. A plataforma de rastreabilidade adotada pela empresa agrega recursos de blockchain, assegurando mais credibilidade e maior segurança aos dados inseridos no sistema.
  • Tomando como base o ano de 2019, afirma Pianez, a companhia se comprometeu a reduzir emissões diretas, resultantes do processo produtivo, e indiretas, associadas ao uso de energia, em 68% até 2035. A cadeia de suprimentos da Marfrig deverá reduzir suas emissões em um terço também até a primeira metade da próxima década.