Agronegócio torna-se mais dependente da China, que dita rumo da exportação

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 20 de março de 2024

O mercado chinês assumiu papel estratégico para o agronegócio brasileiro nas últimas décadas, saindo de uma participação de apenas 2,73% como destino das exportações do setor em 2000, para 36,16% no ano passado, percentual mais elevado na série histórica do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), agravando a dependência do setor a um único mercado, num cenário que se complica um pouco mais quando o caso é a soja. Desde 2013, lembra Sueme Mori, diretora do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC) e diretora de relações internacionais da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), a China tornou-se o principal destino das exportações do setor. “Há sem dúvida uma associação muito forte entre o ganho de relevância do Brasil no cenário externo assim como de nossas exportações e o aumento das compras da China”, comenta.

Numa perspectiva histórica, prossegue Sueme, em 2000, as vendas do setor destinadas à China aproximaram-se de US$ 561,52 milhões, representando 2,73% das exportações totais do agronegócio, com a União Europeia respondendo por 36,44% da pauta. No ano passado, a fatia do mercado europeu havia recuado para 13,0%, correspondendo a pouco mais de um terço da participação chinesa. Segundo dados oficiais, detalhados pelo secretário de Comércio e Relações Internacionais do Mapa, Roberto Perosa, as vendas externas do agronegócio como um todo avançaram algo próximo 4,8% no ano passado, saindo de US$ 158,87 bilhões para o recorde de US$ 166,55 bilhões, registrando um acréscimo equivalente a US$ 7,68 bilhões, e a contribuição do país asiático foi decisiva num cenário de queda dos preços internacionais das commodities em geral. No mesmo período, as vendas externas de produtos de base agropecuária para a China elevaram-se de US$ 50,718 bilhões para algo em torno de US$ 60,240 bilhões, num crescimento próximo de 18,8%.

Queda, sem os chineses

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“As vendas ao mercado chinês foram recordes na série histórica”, reforça Perosa, superando o resultado de 2022 por qualquer coisa em torno de US$ 9,53 bilhões. Tudo somado, excluindo-se as compras chinesas, as exportações do agronegócio para os demais países recuaram ligeiramente de US$ 108,15 bilhões para US$ 106,31 bilhões, em baixa de 1,70%. “Além do mercado chinês, os países que mais contribuíram para o aumento das vendas brasileiras do agronegócio foram Argentina (com mais US$ 1,63 bilhão); Indonésia (mais US$ 736,11 milhões); México (mais US$ 709,94 milhões) e Iraque (mais US$ 670,54 milhões)”, registra ainda o secretário.

Balanço

  • Sueme pondera que persiste uma concentração expressiva na pauta de bens exportados pelo país, o que não refletiria nem a capacidade de produção e nem a diversidade da agropecuária brasileira. A soja em grão respondeu no ano passado por praticamente dois terços da pauta e 73,1% da oleaginosa exportada pelo país, em volume, tiveram o mercado chinês como destino final, acrescenta Francisco Carlos Queiroz, da Consultoria Agro do ItaúBBA. “Nos últimos quatro ou cinco anos, em média, a China tem absorvido em torno de 70% das nossas exportações do grão”, acrescenta ele.
  • A decisão do governo chinês de abrir o mercado para importações de milho transgênico, no final de 2022, levou a um “boom” dos embarques brasileiros para aquele destino, elevando a participação do país asiático de menos de 3,0% para perto de 29,0% de todo o milho exportado pelo Brasil, conforme Queiroz. O salto contribuiu para impedir que os preços do grão, aqui dentro, caíssem ainda mais, diante da safra recorde colhida pelo país, considera o analista. “O mercado chinês também foi a salvação para o boi gordo”, emenda Cesar Castro Alves, consultor do setor agro do ItaúBBA.
  • As exportações para aquele mercado vinham em baixa até novembro do ano passado, mas experimentaram níveis recordes em dezembro, o que fez com que o balanço do período fosse positivo, considerando que a China foi o destino de 60,4% da carne bovina in natura exportada pelo Brasil. As exportações do produto in natura avançaram levemente entre 2022 e 2023, saindo de 2,586 milhões para 2,604 milhões de toneladas de carcaça equivalente. Incluindo miúdos e carne bovina industrializada, de acordo com Alves, o crescimento atingiu perto de 5,7%, com as exportações evoluindo de 3,099 milhões para 3,276 milhões de toneladas.
  • A expectativa de quebra na safra de milho tende a afetar negativamente as exportações esperadas para este ano, conforme Queiroz, mas os embarques de carnes podem ainda registrar algum avanço, na previsão de Alves. Como novidade, embora ainda em proporções reduzidas, as exportações de café para a China, que saltaram mais de 200% no ano passado, para algo em torno de 1,3 milhão de sacas, em torno de 4,0% do total embarcado, podem trazer números positivos para este ano, antecipa Alves.
  • O aumento da demanda por alimentos, associado ao aumento da renda média naquele país e ao crescimento demográfico, sugere Sueme, deve continuar favorecendo as exportações brasileiras. Segundo ela, nota-se uma preocupação muito grande do governo chinês em relação à segurança alimentar, que ao mesmo tempo busca reduzir a dependência de fontes de suprimento.
  • Em tempos de tensões geopolíticas, a boa relação construída com os chineses, sua dependência de importações de alimentos e a capacidade de produção do agronegócio brasileiro alimentam expectativas positivas em relação ao desempenho das exportações, sugere ainda a diretora do CEBC, lembrando que o “Brasil tem condições de exportar muito mais do que exporta hoje”. Os dados de 2022, produzidos pelo lado chinês, prossegue ela, mostram que o país forneceu 60,9% da soja em grão importada pela China, além de 42,4% de toda a carne bovina in natura, 36,5% do frango e 24,9% da carne suína importados pelos chineses.