Alta dos juros tem efeitos limitados sobre os preços

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 07 de outubro de 2022

O ritmo de alta dos preços pagos pelo consumidor em geral começa a inverter a tendência de baixa observada desde julho, sob impacto da redução de impostos sobre combustíveis, energia e no setor de comunicação. Além da mudança de tendência, já esperada, os indicadores utilizados para medir a inflação mês a mês sugerem, adicionalmente, que os efeitos da escalada das taxas de juros sobre os preços têm sido limitados, na melhor das hipóteses – o que significa dizer que trabalhadores e suas famílias, empresários e suas empresas pagarão um custo muito elevado quando se considera o resultado bastante modesto sobre o nível de preços.

Mais claramente, o estrago sobre a atividade econômica, com o encarecimento do crédito e, portanto, dos custos para financiar investimentos, tende a ser mais dramático ao reduzir as possibilidades de crescimento, esfriando os negócios em toda a economia, e afetando, portanto, salários e empregos. As projeções mais recentes trabalham com perspectivas de crescimento muito baixas para 2023, em evidente desaquecimento diante dos números esperados para este ano, já nem tão alvissareiros assim.

O impacto sobre as contas públicas, da mesma forma, não deve ser menosprezado. A conta dos juros, sustentada pelos governos, já vem cobrando um preço elevado ao longo deste ano, causando desequilíbrios para as finanças públicas, especialmente nas esferas estaduais e federal. O dado mais recente da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), a valores atualizados até agosto deste ano, mostra um aumento de 33,07% nas despesas com juros do chamado governo central (que considera as contas do Tesouro, da Previdência e do Banco Central).

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Entre janeiro e agosto deste ano, os gastos com juros atingiram R$ 313,554 bilhões frente a R$ 235,631 bilhões em idêntico período do ano passado – um acréscimo de R$ 77,923 bilhões. Para comparar, durante os mesmos oito meses, o governo gastou perto de R$ 59,394 bilhões com o Bolsa Família, atual Auxílio Brasil. Vale dizer, os recursos drenados pela conta dos juros, que serviram para engordar os ganhos do cassino financeiro instalado no País, foram quase 5,3 vezes maiores do que todo o gasto com o auxílio aos mais vulneráveis.

Queda menor

Calculado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), o Índice de Preços ao Consumidor (IPC), que responde por 60% do Índice Geral de Preços– Disponibilidade Interna (IGP-DI), saiu de -0,57% em agosto para 0,02% em setembro, refletindo o avanço dos chamados preços livres (determinados em tese pelo mercado sem interferência do poder público), que saíram de 0,24% para 0,57%. A alta nesta área foi contida pelo comportamento dos preços dos alimentos, que aceleram sua queda na passagem de agosto para setembro, saindo de um recuo de 0,15% para redução de 0,45%. O efeito da queda dos preços monitorados (combustíveis e energia, por exemplo) perdeu algum fôlego, numa velocidade menos intensa de redução. A variação média dos preços no setor passou de -2,89% em agosto para -1,61% em setembro.

Balanço

  • No setor de serviços, onde a retomada tem sido mais relevante em função da reversão das medidas de distanciamento social, a inflação ao consumidor avançou de 0,27% para 1,31% também entre agosto e setembro. A inflação acumulada em 12 meses no setor de serviços, que fechou o ano passado em 4,93%, elevou-se para 7,12% nos 12 meses encerrados em setembro deste ano (acima dos 6,82% registrados até agosto).
  • Por sua vez, os preços dos bens industriais para o consumidor final anotaram desaceleração na comparação entre os dois meses. A taxa de variação dos preços no setor, que havia alcançado 0,46% em agosto, passou a registrar estabilidade virtual em setembro, numa oscilação de 0,01%.
  • Uma parcela dessa queda, no entanto, está associada a bens industriais não duráveis, que inclui também alimentos. Os preços dos bens industriais não duráveis, que haviam registrado elevação de 0,50% em agosto, sofreram queda de 0,49% em setembro, numa reviravolta de quase um ponto percentual.
  • Em 12 meses, os preços dos bens industriais acusaram alta de 7,18% até setembro, muito próxima da taxa de 7,23% acumulada entre janeiro e dezembro de 2021, mas inferior ao índice de 7,88% que havia sido captado nos 12 meses finalizados em agosto deste ano.
  • Os preços dos bens duráveis, também em 12 meses, chegaram a subir 8,19% até agosto e passaram a variar 7,79% em setembro, mantendo-se ainda acima do índice de 6,50% nos 12 meses do ano passado. Os preços dos semiduráveis mantiveram praticamente o mesmo ritmo, com altas de 9,03% e de 9,01% no acumulado em 12 meses até agosto e setembro deste ano, respectivamente. Para comparar, em 2021, aqueles preços haviam registrado alta de 5,04%.
  • Mais uma vez, os não duráveis exerceram influência maior na desaceleração observada para os preços industriais em geral. A taxa acumulada em 12 meses caiu de 9,91% em dezembro de 2021 para 6,60% em agosto, recuando para 5,02% em setembro.
  • Na visão do economista André Braz, coordenador dos índices de preços do Ibre, “os preços de commodities e combustíveis continuam a orientar a desaceleração” dos índices de inflação no atacado e ao consumidor. Para ele, o Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA), que responde por 20% do IGP, “antecipa maior contração das pressões inflacionárias”.
  • O IPA saiu de recuo de 0,63% em agosto para baixa de 1,68% em setembro, com redução para preços de produtos agrícolas e bens industriais. O “índice de difusão”, que afere o percentual de preços em alta entre os diversos itens pesquisados pelo instituto, acrescenta Braz, mostra que 69% dos itens que compõem o IPA encontravam-se em alta em setembro de 2021, percentual reduzido para 30% em setembro deste ano. Em tese, essa redução no atacado tenderia a influenciar os preços ao consumidor, mantendo a inflação em baixa.
  • O cenário, no entanto, não está isento de riscos. Na quarta-feira, a Opep+, que reúne os maiores países exportadores de petróleo, sob liderança da Arábia Saudita, decidiu impor um corte na produção de petróleo do grupo, equivalente a 2,0 milhões de barris de petróleo por dia, correspondendo a uma redução de 2,0% na oferta mundial. Como resultado, os preços do barril no mercado internacional acumulavam, até ontem, altas de 11,9% e de 7,8% para os tipos WTI (West Texas Internacional) e Brent desde 30 de setembro.