Atraídos pela especulação financeira, estrangeiros aplicam US$ 35,4 bilhões

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 26 de junho de 2021

Nos cinco primeiros meses deste ano, o mercado financeiro havia atraído perto de US$ 35,428 bilhões em capitais estrangeiros, numa virada frente ao mesmo período do ano passado, quando o Banco Central (BC) chegou a registrar a saída de US$ 22,999 bilhões. Entre um período e o outro, portanto, a reviravolta significou um impacto próximo a US$ 58,427 bilhões no mercado de dólar e, como consequência, também sobre as contas externas do País. Esses dólares, no entanto, não ajudaram a produzir um único parafuso a mais aqui dentro e nem contribuíram para amenizar a grave crise de desemprego que a economia enfrenta. Foram integralmente destinados a aplicações em ações, derivativos, títulos de dívida e outras operações financeiras.

Os valores acima refletem os fluxos de entrada e de saída de dólares, vale dizer, operações de compra e de venda da moeda norte-americana registrados diariamente pelo BC. O grande problema desse tipo de movimentação é que esse tipo de aplicação tende a ser volátil ao extremo e, da mesma forma que foram aportados por aqui, poderão celeremente “voar” para outros mercados, gerando crises ou instabilidades na economia. Outro caminho para avaliar essas movimentações em moedas estrangeiras está na análise dos dados desagregados do balanço de pagamentos, que consolida as relações do Brasil com o restante do mundo, incluindo exportações e importações de bens e serviços, remessas de lucros e dividendos ao exterior, pagamento de juros e a entrada de investimentos estrangeiros.

O balanço de pagamentos, por sua vez, é composto das contas de transações correntes (onde são contabilizadas exportações, importações, lucros e dividendos, viagens internacionais, despesas com fretes, aluguel de equipamentos, entre outros serviços), de capital e financeira (onde entram os investimentos diretos e na especulação financeira, chamados de “investimento em carteira”). Entre janeiro e maio deste ano, esses “investimentos em carteira” (ações, títulos públicos e de empresas privadas e outras formas de aplicação financeira) registraram a entrada líquida de US$ 12,471 bilhões (a diferença entre a entrada e a saída de dólares desse mercado).

Continua após a publicidade

Reviravolta

Para comparar, nos mesmos cinco meses do ano passado, o País chegou a registrar a saída líquida de US$ 31,678 bilhões, ou seja, neste ano, houve uma reviravolta nesta área do tamanho de quase US$ 44,149 bilhões. Foi muito mais do que o crescimento absoluto dos investimentos diretos aqui dentro, que cresceram o correspondente a US$ 5,149 bilhões. Mais precisamente, o investimento direto avançou de US$ 17,333 bilhões entre janeiro e maio do ano passado para US$ 22,482 bilhões em igual período deste ano, numa alta de 29,7%.

Balanço

  • Entre os investimentos em carteira, parte relevante dos dólares aportados no País teve como destino ações e títulos negociados no mercado doméstico e fundos de investimento. Na soma das três modalidades, o País registrou a entrada líquida (descontada a saída de dólares daquelas modalidades de aplicação) de US$ 16,448 bilhões entre janeiro e maio deste ano. Em 2020, registrou-se a saída líquida de US$ 33,892 bilhões, numa “virada” muito próxima a US$ 50,339 bilhões.
  • Os dados mostram que, embora o investimento direto, supostamente destinado a atividades produtivas (mas que pode estar sendo direcionado também para compra de empresas instaladas no País), tenha apresentado algum crescimento, o investimento especulativo avança com maior vigor. Essa discrepância pode gerar focos de instabilidade para o lado real da economia, na medida em que uma saída brusca desses capitais “andorinha”, na denominação adotada pelos vizinhos argentinos, poderá causar nova onda de desvalorização do real, com escalada do dólar e novas pressões inflacionárias.
  • Mesmo o avanço do investimento, apresentado no dado acumulado entre janeiro e maio, precisa ser analisado com cautela. O fato é que esse crescimento foi assegurado nos primeiros meses do ano e, na sequência, vem perdendo fôlego. Em maio, o investimento direto encolheu 39,9% frente ao mesmo mês de 2020, caindo de US$ 3,080 bilhões para US$ 1,229 bilhão. Frente a abril deste ano, quando somaram US$ 3,544 bilhões, a queda foi de 65,3%. Desde fevereiro, o tombo já atinge 86,36% (já que haviam alcançado US$ 9,007 bilhões no segundo mês do ano, o melhor resultado em 2021 até o momento).
  • Nos 12 meses terminados em maio de cada ano, o investimento direto saiu de US$ 60,425 bilhões em 2020 para US$ 39,316 bilhões neste ano, o que significou uma retração de 34,93% (ou seja, US$ 21,109 bilhões a menos). As aplicações de curtíssimo prazo em fundos de investimento, ações e títulos de dívida, ambos negociados no mercado doméstico, realizadas entre junho de 2020 e maio de 2021 corresponderam à entrada de US$ 41,840 bilhões, mais do que todo o investimento direto. Nos 12 meses imediatamente anteriores, o País havia sofrido com a fuga de US$ 50,437 bilhões.
  • Atenção: ainda que esse capital especulativo busque lucros de curtíssimo e curto prazo e que sua saída repentina possa gerar turbulências, as contas externas do País continuam apresentando bons resultados. O Brasil registrou o segundo mês de superávit em sua conta de transações correntes, com saldo positivo de US$ 3,840 bilhões em maio. Em dois meses, o saldo acumulado atinge US$ 9,199 bilhões. Nos primeiros cinco meses do ano, a conta ficou negativa em US$ 6,213 bilhões (cobertos com folga por investimentos de US$ 22,482 bilhões). O déficit encolheu 71,7% frente ao acumulado entre janeiro e maio de 2020, quando somou US$ 21,921 bilhões.