Crédito avança sustentado por operações de curto prazo

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 29 de junho de 2021

O forte ritmo de crescimento de novos empréstimos contratados por empresas e pelas famílias tem sido sustentado, neste ano, principalmente por operação de prazos mais curtos, o que poderá significar riscos maiores adiante. Mais claramente, caso os juros básicos ganhem a velocidade desejada pelos mercados, os setores que operam no lado real da economia poderão enfrentar dificuldades para honrar compromissos financeiros, passando a buscar caminhos para refinanciar a dívida contratada nos últimos meses de forma a alongar seus prazos e reduzir seu peso sobre receitas e orçamentos. O cenário complica-se quando se acrescenta à equação as taxas recordes de desemprego e desalento e as dificuldades evidentes enfrentadas pela economia para retomar o emprego.

Nos cinco primeiros meses deste ano, as concessões de crédito saltaram para quase R$ 1,788 trilhão, crescendo 11,0% diante de igual período do ano passado. Àquela altura, os bancos haviam liberado a pessoas físicas e jurídicas perto de R$ 1,611 trilhão. Entre os dois períodos, as concessões apresentaram um acréscimo de R$ 177,1 bilhões, em grandes números.

O aumento foi mais relevante para as famílias, numa alta de 18,9% (de R$ 807,9 bilhões para R$ 960,8 bilhões (ou seja, R$ 152,9 bilhões a mais, o que significa dizer que os créditos novos destinados a pessoas físicas contribuíram com 86,3% para o avanço das concessões totais). No caso das empresas, as concessões saíram de R$ 802,8 bilhões para R$ 826,9 bilhões, numa variação de apenas 3,0% (ou seja, em termos reais, descontada a inflação, houve uma redução de 4,3%). De qualquer forma, em valores nominais, os valores registram variação de R$ 24,1 bilhões.

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Dinheiro mais caro

A abertura dos dados divulgados ontem pelo Banco Central (BC) mostra que boa parte do crescimento observado concentrou-se no segmento de crédito livre (ou seja, financiado a taxas de mercado e sem direcionamento pelo governo). As concessões de recursos livres subiram de R$ 1,479 trilhão nos cinco meses iniciais de 2020 para R$ 1,610 trilhão, subindo 8,9% (quer dizer, R$ 131,15 bilhões a mais), o que representou 74,1% do avanço acumulado pelas concessões totais. Dentro outras questões, o custo do dinheiro no mercado de crédito livre é muito mais alto, chegando a 39,9% ao ano para tomadores pessoas físicas e a 14,6% para as empresas, diante de, respectivamente, 6,7% e 7,6% no segmento de crédito direcionado, com prazo médio de 198,6 (ou seja, quase 17 anos) meses para o pagamento de empréstimos e financiamentos. No segmento de crédito livre, o prazo médio gira em torno de 43,6 meses (três anos e meio, praticamente).

Balanço

  • Os números desagregados apontam elevação de 3,1% para as empresas, com as concessões de recursos livres avançando modestamente de R$ 756,97 bilhões para R$ 780,47 bilhões. E mesmo assim este segmento do mercado de crédito respondeu por 97,5% do aumento geral das concessões liberadas para pessoas jurídicas.
  • O aumento foi mais vigoroso no caso das pessoas físicas, embora a contribuição tenha sido menor. Os empréstimos lastreados em recursos livremente negociados pelo sistema financeiro cresceram 14,9% nas linhas destinadas às famílias, saindo de R$ 721,88 bilhões para R$ 829,53 bilhões, numa elevação correspondente a R$ 107,65 bilhões (o que, por sua vez, representou 70,4% do aumento nas concessões totais para pessoas físicas).
  • Naquela área, as operações com cartão de crédito, lideradas pelas transações à vista (o que inclui igualmente os pagamentos parcelados “sem juros” pelas lojas), foram responsáveis por quase 75,6% do aumento das concessões livres (ainda no segmento de pessoas físicas). Cresceram de R$ 501,31 bilhões entre janeiro e maio do ano passado para R$ 582,73 bilhões no mesmo intervalo deste ano, com alta de 16,2%. Olhando o total das concessões para pessoas físicas, as compras pelo cartão responderam por 53,2% do aumento geral.
  • Para as empresas, o crescimento das concessões de crédito com recursos livres sofreu a influência principalmente do salto de 43,1% registrado pelas compras financiadas por cartão de crédito, pela antecipação, por meio dos bancos, de faturas de cartões de crédito a vencer, que subiram 10,6%, e principalmente pelo salto de 42,7% no desconto de duplicatas. As concessões para capital de giro, ao contrário, desabaram ladeira abaixo, com perda de 36,3% entre os cinco meses iniciais de 2020 e o mesmo período deste ano. Em valores nominais, caíram de R$ 139,53 bilhões para R$ 88,92 bilhões, numa perda de R$ 50,611 bilhões.
  • As concessões para descontos de duplicatas cresceram, no entanto, R$ 66,840 bilhões, passando de R$ 156,42 bilhões para R$ 223,26 bilhões.
  • Para comparação, os novos empréstimos e financiamentos concedidos com recursos direcionados para as empresas praticamente não saíram do lugar, variando apenas 1,34% (de R$ 45,80 bilhões R$ 46,41 bilhões). O crescimento ficou todo concentrado nas linhas de crédito rural para pessoas jurídicas, onde as concessões avançaram 26,1%, evoluindo de R$ 16,081 bilhões para R$ 20,278 bilhões. Sem o crédito rural, as concessões direcionadas encolheram pouco mais de 12,0%, de R$ 29,718 bilhões para R$ 26,136 bilhões. O tombo está diretamente relacionado à retração de 23,8% acumulada pelas concessões do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que havia liberado R$ 15,829 bilhões para as empresas entre janeiro e maio do ano passado e concedeu R$ 12,064 bilhões ao setor nos mesmos cinco meses deste ano (simplesmente R$ 3,765 bilhões a menos em recursos para financiar investimentos em modernização e expansão de fábricas e lojas, construção de infraestrutura e outros projetos de prazo mais longo).