Com economia derrapando, inflação despenca em março

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 12 de abril de 2023

A taxa “cheia” da inflação de março não retrata com precisão objetiva o que está ocorrendo de fato com os preços neste momento. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado mensalmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), veio abaixo do que os especialistas consideram como o “consenso do mercado” – por “mercado” aqui entenda-se “mercado financeiro”. Mas ainda em níveis ainda elevados para as pretensões do Banco Central (BC), sugerindo uma inflação acima da meta (muito embora o IPCA acumulado em 12 meses tenha recuado de 5,90% em dezembro para 4,65% em março. Para mera comparação, que diz um tanto sobre o nível de insanidade que contamina o debate econômico e as decisões do BC, o IPCA acumulado em 12 meses até março do ano passado estava em 11,30%.

As análises em geral continuaram a registrar uma tendência “gradual” de desaceleração no ritmo de alta dos preços, processo igualmente conhecido como “desinflação” no linguajar particular de analistas, economistas e comentaristas pró-mercado. A análise dos dados do IBGE sugere, no entanto, uma tendência de queda um pouco mais acentuada do que indicam as análises, com preços mostrando desaceleração em setores essenciais (alimentos, num exemplo) e a taxa geral sendo pressionada principalmente pela alta dos combustíveis e da energia elétrica residencial.

Um primeiro dado chama a atenção na publicação do IPCA ontem pelo IBGE. O chamado “índice de difusão”, que aponta o percentual de itens em elevação no momento da pesquisa, caiu para seu nível mais baixo em meses, desabando de 76,13% em março do ano passado, quando o índice mensal havia alcançado 1,62%, para 59,95%. Historicamente, o indicador pode ser considerado baixo, embora signifique que praticamente 60% dos preços estavam em alta no mês passado. O índice de difusão, no entanto, ainda que seja um indicador relevante, não permite identificar adequadamente o ritmo dos preços. Dito de forma mais clara, não é possível indicar quantos preços e/ou itens entraram em aceleração e qual o percentual daqueles que contribuíram para a “desinflação” em curso. Analisado isoladamente, o índice apenas informa o percentual dos produtos que subiram.

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Atacado em baixa

De toda maneira, a redução no percentual de itens ou produtos em processo de alta parece já refletir a tendência de esfriamento da economia, capturado também pelos índices de preço no mercado atacadista. Respondendo por 60% do Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI), medido mensalmente pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), o Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA) tem trafegado por terreno negativo desde julho do ano passado. Foram oito quedas em nove meses, numa tendência interrompida brevemente em dezembro do ano passado, quando o índice registrou elevação de 0,32%. O movimento de baixa foi retomado nos meses subsequentes, passando a indicar deflação (inflação negativa ou queda nos preços médios no atacado) no acumulado em 12 meses a partir de fevereiro deste ano.

Balanço

  • Para se ter uma dimensão do processo de queda nos preços naquele setor, o IPA havia alcançado 11,27% nos 12 meses finalizados em junho do ano passado, o que já correspondia a uma sensível desaceleração frente aos 49,59% registrados entre junho de 2020 e maio de 2021, na taxa anual mais elevada na série recente do Ibre e próxima aos índices registrados antes do Plano Real. Como se recorda, houve forte contribuição dos combustíveis, da energia e de setores mais afetados pelo estrangulamento das cadeias de suprimento globais, fazendo faltar insumos, peças, componentes e pressionando seus custos.
  • Em março deste ano, o IPA acumulou baixa de 3,51% num intervalo também de 12 meses. A velocidade da queda acentuou-se mais recentemente, com a taxa mensal passando de -0,04% em fevereiro para -0,71% no mês imediatamente seguinte. A redução foi puxada pela queda de 3,45% nos preços dos bens intermediários e pelo tombo de 8,45% nos custos das matérias primas brutas, sempre no período entre abril de 2022 e março deste ano.
  • Analisados por sua origem, os preços no atacado dos produtos agropecuários acumulavam retração de 6,87% nos 12 meses terminados em março, com redução de 2,11% para bens industriais. Especificamente no mês de março deste ano, as principais influências negativas dentro do IPA vieram dos preços da soja (-5,66%), do óleo diesel (-5,52%), do farelo de soja (-7,66%), da gasolina (-3,91%) e da batata inglesa (-17,26%).
  • O IPCA de março, agora na contabilidade do IBGE, saiu de 0,84% em fevereiro para 0,69% nas quatro semanas terminadas em 15 de março (IPCA-15), mas fechou os 30 dias de março em 0,71%, sugerindo leve aceleração. Os aumentos dos preços dos combustíveis ao consumidor final e da tarifa de energia residencial responderam por pouco mais de 68% do índice de março. Até fevereiro, o índice havia sofrido pressões dos gastos com educação, em decorrência de aumentos das mensalidades escolares e nos preços dos materiais didáticos. Essa pressão esvaziou-se em março, como de resto ocorre todos os anos, comprovando a sazonalidade daqueles custos.
  • Item de extrema volatilidade, as passagens aéreas têm apresentado queda nas últimas medições, recuando 5,32% em março. Se excluídos os itens educação, combustíveis, energia elétrica e passagens áreas, os demais preços denotam forte desaceleração. Na média, com as exclusões já apontadas, o IPCA “demais”, numa classificação escolhida aleatoriamente pela coluna, recuou de 0,46% em fevereiro para 0,35% nas quatro semanas encerradas em 15 de março e encerrou os 30 dias de março em 0,25%.
  • Em outro indício da perda de ânimo na economia, os preços médios dos produtos industriais e dos serviços saíram de 0,5% e 1,4% em fevereiro para 0,3% em março (em ambos os casos, a variação se equivaleu), conforme acompanhamento do Itaú BBA.