Com juros nas nuvens, bens de capital despencam há nove meses em sequência

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 05 de julho de 2023

O ambiente macroeconômico manteve-se francamente hostil aos investimentos também em maio, quando a produção de bens de capital engatou seu nono mês consecutivo de perdas severas na comparação com idênticos períodos do ano imediatamente anterior. A indústria do setor fabrica máquinas, equipamentos, caminhões, ônibus e outros itens destinados à expansão dos demais setores da economia. Mas as decisões de investimento continuam amarradas, como já notório, pelas taxas de juros abusivas impostas ao País pelo senhor Roberto Campos Neto, atual ocupante da presidência do Banco Central (BC) “independente”.

Os dados da pesquisa mensal da produção industrial Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) assinalam retração para a fabricação de bens de capital desde junho do ano passado, somando nove meses de registros negativos até maio deste ano e já prestes a completar todo um ano de perdas, considerando-se que os juros não caíram, o que só deve começar a ocorrer a possivelmente a partir de agosto – ainda assim, pode-se apostar que os cortes virão em doses homeopáticas, o que significa dizer que os juros continuarão sendo um obstáculo importante para a retomada dos investimentos e da atividade econômica em geral pelo menos até o final deste ano.

Comparada aos mesmos períodos do ano anterior, a produção recuou 1,3% em setembro, com quedas de 4,7% em outubro, virtual estagnação em novembro (recuo de 0,1%), seguida de fortes quedas em todos os meses seguintes, o que levou a uma retração acumulada de 11,2% entre agosto do ano passado e maio deste ano. Mais recentemente, o setor de bens de capital anotou retrocessos de 15,4% e de 11,6% em abril e maio, respectivamente. Nos cinco primeiros meses deste ano, diante de idêntico período de 2022, o setor encolheu 9,6% e acumulou perdas de 5,0% nos 12 meses terminados em maio deste ano, frente aos 12 meses imediatamente anteriores.

Continua após a publicidade

Freio na produção

Na avaliação do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), “bens de capital têm sido o principal freio para a indústria em 2023. Como se sabe, as decisões de investimento são particularmente prejudicadas pelo quadro de elevação das taxas de juros reais que temos visto no País, ao que se somam o enfraquecimento do mercado interno e as incertezas em relação a reformas estruturais, como, por exemplo, quanto à aprovação ou não da reforma tributária e com quais características”. De fato, a produção da indústria em geral simplesmente não cresceu nos últimos 12 meses até maio e acumula nos cinco meses iniciais deste ano recuo de 0,4%. Para o Iedi, a indústria em geral e o setor de bens de capital em particular registram “trajetória de progressiva deterioração”.

Balanço

  • O setor de bens de capital experimentou tendências discrepantes e vinha em queda desde 2015, chegando no início da pandemia em níveis historicamente baixos. Por isso, foi um dos poucos grandes setores da indústria a apresentar variação positiva em relação a fevereiro de 2020, avançando 3,3%. Não chega a ter relevância maior, já que a produção passou a despencar nos meses seguintes, voltando a crescer no final de 2020, voltou a apresentar um comportamento oscilante, com altos e baixos em 2021, atingindo seu maior nível na década em maio de 2022. Desde lá, encolheu 12,1% desde lá até maio deste ano, na série mensal com ajuste sazonal.
  • A retração de 11,6% registrada pelos bens de capital em maio foi influenciada por resultados negativos vigorosos dos produtos destinados aos setores de energia, num retrocesso de 40,0% na comparação com maio de 2022, e queda de 15,4% para os bens de capital de uso misto. A indústria em seu conjunto consumiu 2,2% menos bens de capital em maio, enquanto a agricultura e o setor de transportes reduziram as compras em 7,7% e 7,1% respectivamente. Como exceção, o setor de construção ampliou as compras de bens de capital em 5,1%.
  • No acumulado entre janeiro e maio, comparado aos mesmos cinco meses do ano passado, os bens de capital destinados ao setor de energia despencaram 27,0%, seguido por baixa de 12,9% na produção de bens de capital de uso misto, redução de 8,4% para a indústria em geral e de 6,9% para a agricultura.
  • A modesta reação observada pelo conjunto da indústria na saída de abril para maio deste ano, numa variação de apenas 0,3%, sequer repôs a perda de 0,6% registrada entre março e abril. Adicionalmente, essa elevação tímida veio, na visão do Iedi, “graças a um avanço de 1,2% na atividade extrativa, já que a indústria de transformação (-0,1%) ficou mais uma vez no vermelho”.
  • Da mesma forma, o avanço de 1,9% anotado na comparação com maio do ano passado veio na sequência do tombo de 2,7% observado em abril, igualmente em relação ao mesmo mês de 2022. Para anotar, o crescimento deu-se sobre uma base fragilizada pelo recuo de 0,3% registrado na comparação entre maio de 2022 e o mesmo mês de 2021.
  • Considerado pelo Iedi como “outro freio importante” ao desempenho da indústria como um todo, o segmento de bens intermediários, espécie de “ coração” do setor industrial, já que fornece insumos para todas as empresas do setor, acumulou baixa de 1,0% nos primeiros cinco meses deste ano, frente ao mesmo intervalo de 2022. A produção no setor caiu 1,7% em janeiro, sofreu baixa de 3,0% em fevereiro, caiu mais 1,1% e 2,7% em março e abril, para avançar 3,1% em maio (sempre em relação aos mesmos meses do ano passado). Mês a mês, os dados dessazonalizados acumulam resultados positivos nos últimos quatro meses, mas com variação de apenas 0,1% em maio. Em 12 meses, também até maio, a produção de bens intermediários recuou 0,8%.