Comércio perde faturamento sob a miopia reiterada do BC

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 15 de dezembro de 2023

Parte dos economistas parece ter verdadeira adoração por “modelos”, planilhas e conceitos tecnicistas, “elegantes”, como gostam de dizer, mas distantes da realidade e do dia a dia de donos de empresas, trabalhadores e de suas famílias. A lentidão deliberada do Banco Central (BC) nos cortes aplicados à taxa básica de juros e, portanto, sua recusa em abrir mão da política de arrocho monetário, a despeito de todos os indicadores mostrarem inflação em baixa, uma economia debilitada e com nítida perda de ânimo, refletem a miopia reiterada da autoridade monetária em relação ao lado real da economia, impondo um preço desnecessariamente alto a todo o País a pretexto de atingir a meta inflacionária definida para os próximos dois anos – o tal “horizonte relevante da política monetária” mencionado a cada nota do Comitê de Política Monetária (Copom).

O espaço para continuar dando sustentação a essa política, que além de tudo impõe um custo fiscal muito elevado ao governo, sofreu novo baque com a decisão de ontem do Federal Reserve (FED), o banco central dos Estados Unidos. Pela terceira reunião consecutiva, o Comitê de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês), similar ao Copom brasileiro, mas com uma composição mais diversificada e ampla, decidiu manter a taxa básica de juros por lá numa faixa entre 5,25% e 5,50% ao ano. Motivo? Segundo o comunicado distribuído pelo comitê, a atividade econômica experimentou desaquecimento mais recentemente, com moderação no ritmo de avanço do emprego e igualmente uma redução da taxa inflacionária – ainda que esta mantenha-se acima dos níveis considerados mais adequados pelo FED.

Equívoco ou má intenção?

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A questão, portanto, é tentar desvendar o que há por trás das decisões do BC brasileiro, já que as tendências se aproximam, ainda que não sejam exatamente comparáveis diante das realidades evidentemente diversas entre as duas economias. De toda forma, com o esfriamento da atividade tornando-se cada vez mais evidente aqui dentro, a condução da política monetária tem se mostrado no mínimo equivocada. A aceleração dos cortes traria vantagens em praticamente todas as áreas, barateando o crédito, favorecendo uma melhoria nas condições de funcionamento da economia e abrindo espaço para uma retomada, o que injetaria ainda maior ânimo nas decisões de investimento do setor privado, além de beneficiar a saúde das contas públicas. Apenas como referência, um corte de um ponto percentual na Selic, numa estimativa ainda grosseira, resultaria numa redução de quase R$ 79,0 bilhões nas despesas com juros em 12 meses – mais do que os R$ 64,206 bilhões investidos pelo governo central entre novembro do ano passado e outubro deste ano.

Balanço

  • Naquele mesmo período, os juros consumiram nada menos do que R$ 617,772 bilhões, o que significa dizer que os recursos injetados na especulação financeira, a “bolsa-especulador”, foi pouco mais de quatro vezes maior do que os recursos destinados ao Bolsa Família, que distribuiu R$ 153,558 bilhões aos mais pobres também nos 12 meses encerrados em outubro deste ano.
  • Os números do varejo divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sancionam até aqui as projeções menos otimistas para a atividade econômica neste final de ano. Os dados dessazonalizados do instituto mostram que o volume de vendas recuou 0,3% em outubro no varejo restrito, depois de variar 0,5% em setembro, na comparação com os meses imediatamente anteriores. O comércio ampliado, incluindo concessionárias de veículos, motos, lojas de autopeças e de materiais de construção, além do “atacarejo” de alimentos, bebidas e fumo, já não havia crescido em setembro e agora em outubro anotou baixa de 0,4%.
  • Incluídos no varejo restrito, postos de combustíveis, hipermercados e supermercados anotaram recuos, pela ordem, de 0,7% e de 0,8% na passagem de setembro para outubro. O dado negativo do comércio amplo, aparentemente, estaria igualmente relacionado às redes de atacado especializadas em alimentos, bebidas e cigarros, já que as vendas de veículos, motos e autopeças avançaram 0,3% (o que não repôs a perda de 0,7% anotada em setembro), com elevação de 2,8% nas lojas de material de construção – neste caso, repondo perda igualmente de 2,8% observada em setembro.
  • Para Goiás, os dados dessazonalizados do IBGE estão disponíveis apenas para o conjunto do varejo tradicional e do comércio amplo, sem abertura por segmento. No setor varejista, houve desaceleração no ritmo das vendas, que haviam crescido 1,7% em setembro e passaram a avançar apenas 0,3%. No varejo ampliado, o crescimento de 1,4% registrado em setembro deu lugar a uma variação de apenas 0,3% em outubro.
  • Na média do País, a comparação com idêntico período do ano passado também sugere perda de fôlego naquelas duas áreas. Para o varejo mais restrito, os volumes vendidos, que haviam crescido 3,2% em setembro, variaram meros 0,2% em outubro, acumulando elevação de 1,6% nos primeiros dez meses deste ano em relação a igual intervalo de 2022. O comércio ampliado conseguiu crescer 2,5% em outubro, levemente abaixo da variação de 2,8% anotada em setembro. O avanço em dez meses ficou limitado a 2,4%.
  • Em seu conceito mais amplo, o varejo em Goiás vendeu 2,8% a mais em outubro, praticamente repetindo a taxa de variação de setembro (2,7%). Mas no varejo restrito, a variação ficou em 2,7% diante de outubro do ano passado, depois de um incremento de 4,1% em setembro. Em dez meses, enquanto o varejo restrito variou apenas 0,9%, o comércio ampliado recuou 0,7%, com tombo de 21,5% no atacado de alimentos e bebidas.