Crescimento (modesto) esperado para 2022 será puxado pelo setor externo

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 05 de julho de 2022

Na mais recente edição de seu Relatório Trimestral da Inflação, onde consolida suas projeções para o comportamento dos principais indicadores macroeconômicos e para a economia brasileira como um todo, o Banco Central (BC) decidiu recalibrar as suas expectativas para o atual exercício, revisando ligeiramente para cima as previsões para o Produto Interno Bruto (PIB) e seus componentes. Os números trabalhados pelo BC consideram uma expectativa de avanço mais acentuado do que se previa para a atividade econômica nos dois primeiros trimestres do ano, com desaquecimento nos dois trimestres seguintes, levando o PIB a uma variação de 1,7% frente à previsão anterior, que fixava uma estimativa de 1,0% para os 12 meses deste ano, saindo de variação de 4,6% em 2021, na sequência do tombo de 3,9% registrado no primeiro ano da pandemia.

Em grande parte, o crescimento de 1,7% realizado no primeiro trimestre deste ano pode ser explicado por um efeito meramente estatístico, relacionado ao incremento de 2,8% registrado na segunda metade do ano passado, o que já sinalizava forte desaceleração em relação à taxa de 7,9% observada nos seis meses finalizados em setembro do mesmo ano. Esse crescimento expressivo só foi possível, no entanto, porque comparado a uma base muito deprimida. Para comparação, nos seis meses encerrados em setembro de 2020, o PIB havia desabado 7,2%. A desaceleração alongou-se até a entrada deste ano, quando o crescimento semestral atingiu também 1,7% nos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

De toda forma, conforme ressalta o próprio BC, o resultado observado para o PIB no primeiro trimestre deste ano levou o PIB a apresentar crescimento de 1,6% em relação aos níveis registrados no final de 2019, “mas ainda 2,3% abaixo da tendência pré-pandemia”. Mais claramente, a economia ainda não teria conseguido acompanhar a variação aguardada para os anos seguintes na fase anterior ao começo da pandemia.

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O rabo e o cachorro

No exercício adivinhatório da autoridade monetária, o tombo de 2,7% esperado para os investimentos neste ano e o menor crescimento do consumo dos governos neste ano (saindo de variação de 2,3% na primeira previsão para 1,8% na estimativa mais atual) quase anulam o avanço projetado para o consumo das famílias (mais 1,7%), deixando para o setor externo boa parte do trabalho de puxar a economia para cima. No economês típico do BC, “tendo em vista as novas estimativas para os componentes da demanda agregada (soma do consumo dos governos e das famílias, do investimento total e dos volumes exportados, já descontados os volumes importados), as contribuições da demanda interna e do setor externo para a evolução do PIB em 2022 são estimadas em 0,5 e 1,2 pontos de porcentagem, respectivamente”.

Balanço

  • Claramente, a contribuição da demanda doméstica tende a ser reduzida para algo em torno de 29% para o crescimento geral do PIB. O setor externo passaria a ser responsável por quase 71%. Em termos mais populares, seria como se o rabo estivesse balançando o cachorro, afinal, apenas o consumo das famílias respondeu por quase 61% na formação do PIB do ano passado, diante de uma participação de 20,1% para as exportações.
  • A contribuição do setor externo, no conceito das contas nacionais, reflete a diferença entre volumes exportados e importados. Num paradoxo apenas aparente, o resultado do setor tende a ser determinado por uma queda mais acentuada das importações do que o previsto inicialmente. Na projeção anterior, o BC havia projetado redução de 2,0% para os volumes importados de bens e serviços neste ano em relação a 2021 e agora espera um retrocesso de 4,0%. No ano passado, apenas para comparação, as compras externas haviam saltado 12,4%.
  • Nas exportações, a revisão foi menos intensa, mas com sinal positivo, saindo de uma estimativa de elevação de 2,0% para um avanço de 2,5%, frente a um incremento de 5,8% em 2021. No ano passado, portanto, o setor externo exerceu influência negativa na formação do PIB, pressionando para baixo a geração de riquezas. Na verdade, parte dessas riquezas e da renda nacional foi transferida para fora do País, ajudando a gerar renda e emprego em outros países.
  • O processo inverte-se agora, mais por conta da retração das importações. De acordo com o BC, “a revisão negativa incorpora dados recentes do volume de bens importados, que mantiveram patamar abaixo do verificado em 2021. Essa trajetória pode refletir tanto a alta persistente do preço de produtos importados, quanto uma redução do descolamento entre importação e atividade doméstica”.
  • Os bens importados ficaram mais caros, com seus preços apresentando alta mais intensa do que aquela registrada pelas exportações, o que tende a reduzir os volumes comprados lá fora pelo País. Na leitura do BC, essa redução apenas ajustaria aqueles volumes aos níveis esperados para a atividade econômica (já que a importação havia apresentado um salto no ano passado frente a uma variação de 3,6% para o consumo das famílias e de 2,0% na área governamental).
  • A redução projetada para o investimento, na visão do BC, reflete o resultado inferior ao esperado no primeiro trimestre e a evolução muito mais modesta da produção de bens de capital. “O aperto das condições financeiras, as dificuldades na cadeia de suprimentos de alguns setores e a elevada incerteza em relação às economias mundial e doméstica são fatores prejudiciais à trajetória futura dos investimentos”, anota o BC.
  • Numa anotação final, a instituição espera alta de 1,2% para a indústria, associada ao avanço de 1,8% para as indústrias extrativas, queda de 0,9% para a indústria de transformação (diante da perda de 2,6% esperada inicialmente), alta de 3,8% para a construção civil e de 6,0% para os “serviços industriais de utilidade pública” (produção de eletricidade, gás e água). Neste último caso, a influência vem do desligamento de usinas térmicas altamente poluidoras em função da melhora no regime de chuvas, o que tenderá a permitir maior uso de hidrelétricas, usinas solares e eólicas, que geram maior valor do que as térmicas.