Custos disparam, mas margens no campo tendem a continuar no azul

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 17 de agosto de 2022

As projeções mais recentes do Itaú BBA, detalha o economista Guilherme Bellotti, indicam margens de R$ 3.552 e de R$ 2.933 por hectare, da porteira para dentro, respetivamente para soja e para o milho na safra 2022/23, com redução de 41,3% e de 17,4% em relação ao ciclo anterior. Os resultados projetados pela instituição contemplam preços médios relativamente mais baixos para as duas culturas e avanços de 55,7% e de quase 10% para os custos agrícolas da soja e do milho, seguindo a mesma ordem. “As margens de lucratividade da soja, na verdade, voltam ao padrão observado há três anos, numa estimativa que não inclui custos de arrendamento”, reforça André Pessoa, da Agroconsult.

Pessoa identifica uma “grande mudança” na composição dos resultados da agricultura nos últimos três anos, com contribuição mais efetiva do milho de segunda safra. Até então, o chamado “milho safrinha” praticamente não contribuía para o resultado da atividade, mas ajudava a diluir custos fixos e agregava ganhos agronômicos relacionados à rotação de culturas. “Nos três últimos ciclos, os preços mais altos do milho permitiram rentabilidades iguais e mesmo superiores à da soja, numa mudança que veio para ficar”, diagnostica ele.

Num olhar de mais longo prazo, Pessoa acredita que o agronegócio deve continuar avançando, em termos de valor agregado, contribuindo para atenuar a tendência prolongada de baixo crescimento da economia como um todo. No ano passado, segundo levantamento realizado em conjunto pela CNA e pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (Esalq/USP), o Produto Interno Bruto (PIB) do agronegócio representou 27,55% do PIB total brasileiro, na contribuição mais elevada desde 2003.

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Fase de baixa

A pecuária tende a enfrentar uma fase de baixa relativa nos preços do setor entre 2023 e 2024, depois de dois anos de valorização do bezerro e retenção de vacas pelos produtores, avalia Rafael Ribeiro, assessor técnico da Comissão Nacional de Pecuária de Corte da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Segundo ele, os abates de novilhas, que haviam caído 13,6% e 17,2% em 2020 e 2021, passaram a anotar elevação de 11,4% no primeiro trimestre deste ano, sinalizando um aumento na oferta de animais. Ao longo deste ano, no entanto, as condições de mercado experimentaram melhora em maio e junho frente a março e abril, quando os preços estiveram mais “frouxos” e os custos mais salgados.

Balanço

  • Nas suas contas, o primeiro ciclo de confinamento, entre maio e julho, o equilíbrio entre preços e custos foi mais delicado. O confinador pagou em torno de R$ 3,7 mil por boi magro, enfrentou uma diária de R$ 24 por cabeça no confinamento e recebeu R$ 325 por arroba pelo animal terminado para abate, embolsando um lucro de R$ 255,20 por cabeça. No segundo giro, iniciado em agosto e a ser finalizado entre novembro e dezembro, o custo do boi magro elevou-se ligeiramente para R$ 3.841, mas a diária baixou para R$ 21,50, num reflexo do recuo nos custos do milho e do farelo de soja, e o preço de venda do boi terminado subiu modestamente, para R$ 337 por arroba. O lucro final, em consequência, deve avançar perto de 12%, para R$ 565 por cabeça.
  • As exportações têm dado suporte aos preços no mercado doméstico, embora surjam dúvidas em relação à capacidade de absorção de novos aumentos pelo mercado doméstico diante da renda proporcionalmente menor das famílias, analisa César Castro Alves, consultor de agronegócio do Itaú BBA. Com impulso da China, no caso da carne bovina, e a saída da Ucrânia do mercado de frango, abrindo espaço para exportadores como o Brasil, na descrição do consultor, as vendas externas do complexo carnes apresentaram forte incremento no primeiro semestre, crescendo 35,3%, de US$ 9,043 bilhões para US$ 12,234 bilhões.
  • A alta de 24,6% nos preços médios na exportação, conforme o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), impulsionou aquele resultado, já que os volumes embarcados registraram variação de 8,6% na comparação com os primeiros seis meses do ano passado, saindo de 3,751 milhões para 4,073 milhões de toneladas.
  • As previsões de Castro para os embarques neste ano apontam altas próximas a 20% para carne bovina, somando 2,768 mil toneladas de carcaça equivalente, e de 6% para o frango, para um total de 4,729 milhões de toneladas, mas recuo de 5% nas exportações de carne suína, o que limitaria as vendas a 1,060 milhão de toneladas. Wagner Yanaguizawa, analista do departamento do Rabobank Brasil, antecipa recorde nas vendas externas de frango, num cenário de oferta global limitada, com destaque para as compras dos Emirados Árabes e do Japão.
  • O ajuste no plantel chinês, que recompôs a criação de suínos em bases mais industriais desde a crise gerada pela peste suína africana, levou a uma retração de 38,4% nas compras da carne suína brasileira pelo país oriental, pressionando os preços para baixo aqui dentro, retoma Ribeiro. “O preço do quilo vivo de suíno chegou a ficar abaixo do preço do frango em determinado momento, causando prejuízos entre R$ 1,00 a mais de R$ 3,00 por quilo para os criadores não integrados”, observa ele. O resultado foi um “forte descarte de matrizes entre março e maio deste ano e produtores saindo da atividade”. A produção independente de suínos responde por 20% a 25% do mercado brasileiro, arremata.