Coluna

Dívida externa de empresas e famílias salta 27,9% e atinge R$ 1,68 trilhão

Publicado por: Sheyla Sousa | Postado em: 30 de abril de 2020

A
escalada do dólar nas últimas semanas contribuiu para que a dívida externa
contratada por empresas não financeiras e pelas famílias experimentasse
elevação nominal (sem descontar a inflação do período) de 23,4% entre dezembro
de 2019 e março deste ano, acumulando um salto de 27,9% em relação ao terceiro
mês do ano passado, segundo dados do Banco Central (BC). Convertida em reais, a
dívida externa daqueles setores passou de R$ 1,312 trilhão em março de 2019
para R$ 1,359 trilhão em dezembro do mesmo ano, avançando para R$ 1,678 trilhão
no mês passado. Na comparação com o chamado “crédito ampliado” levantado pelo
setor não financeiro, que de certa forma reflete a dívida total contratada por
empresas e famílias, a participação da dívida externa, que havia recuado de
24,75% em março para 23,71% em dezembro de 2019, atingiu 27,28% em março deste
ano.

Desde
o encerramento de 2019 até o final de março passado, a cotação dólar registrou
alta média de 28,0% segundo acompanhamento diário feito pelo BC. A
desvalorização levou a uma alta quase corresponde no saldo da dívida externa
quando medida em reais, elevando seu peso no balanço das empresas e no
orçamento das famílias (certamente das famílias de renda mais alta, que têm
acesso a aplicações e instrumentos de crédito nominados em moeda estrangeira –
o que, convenhamos, não é a realidade da maior parte das famílias no País).

No
primeiro trimestre deste ano, o aumento de 23,4% no saldo da dívida contratada
em moeda estrangeira correspondeu a um acréscimo de R$ 318,6 bilhões. A dívida
total (ou “crédito ampliado”, na classificação do BC) subiu R$ 418,1 bilhões
(mais 7,3%, avançando de R$ 5,733 trilhões para R$ 6,151 trilhões, em valores
arredondados). Assim, a cada R$ 100 acrescidos ao saldo de dívida total, pelo
menos R$ 76,20 vieram de compromissos externos. Na comparação com o PIB, o
crédito ampliado total elevou sua participação de 76,2% em março de 2019 para
79,0% em dezembro e daí para 83,8%. A fatia da dívida externa havia recuado
levemente de 18,85% para 18,73% entre março e dezembro de 2019, subindo para
22,85% em março deste ano.

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“Riqueza”
financeira

As
distorções que ainda predominam na economia, incluindo um dos níveis mais
elevados de concentração da renda em todo o mundo, continuaram alimentando o
cassino financeiro, mesmo depois de várias rodadas de corte na taxa básica de
juros. Os dados do BC mostram, de fato, uma reorganização na distribuição da
“riqueza financeira” entre os diversos instrumentos e aplicações disponíveis no
mercado financeiro, movimento que se mostra mais nítido a partir de janeiro
deste ano. Considerando o seu total, o dinheiro aplicado em poupança, quotas de
fundos de investimento, títulos públicos e privados mantém-se em crescimento,
ainda que o ritmo desse avanço tenha sofrido desaceleração na passagem de
janeiro para março deste ano.

Balanço

·  
Em
março do ano passado, aqueles investimentos somavam perto de R$ 6,409 trilhões,
representando 92,12% do PIB, conforme dados brutos do Banco Central. No mesmo
mês deste ano, o dinheiro estacionado em aplicações financeiras diversas
aumentou 6,81% (bem mais do que a inflação, que acumulou variação de 3,30% nos
12 meses terminados em março passado), atingindo R$ 6,846 trilhões,
correspondendo a 93,24% do PIB.

·  

revelando uma tendência de reorganização das aplicações, o dinheiro investido
em títulos privados cresceu 15,23% na mesma comparação, passando de R$ 1,653
trilhão para R$ 1,905 trilhão. Essa modalidade de investimento respondeu por
57,67% do incremento registrado para o total da “riqueza financeira” nos mesmos
12 meses.

·  
A
participação dos títulos privados (incluindo letras financeiras e de crédito,
aceites de letras de câmbio, letras hipotecárias e imobiliárias e ainda
certificados de operações estruturadas) no total avançou de 25,79% para
27,83%.Na comparação com janeiro deste ano, o saldo dessas aplicações aumentou
6,53%.

·  
O
dinheiro estacionado em quotas de fundos de investimento (fundos de renda fixa,
cambial e os chamados multimercados, que destinam suas aplicações para títulos
federais, privados e no mercado de capitais) cresceu menos, variando 5,61% em 12 meses, ao passar de R$ 3,282 trilhões para R$ 3,467
trilhões. Na comparação com o estoque total da “riqueza financeira”, sua fatia
recuou de 51,21% para 50,64%.

·  
Mas
na comparação com janeiro, os fundos perderam 2,1% de suas aplicações, já que o
estoque no primeiro mês do ano somava algo em torno de R$ 3,541 trilhões
(52,08% do total).

·  
Esse
recuo explica em boa parte o leve incremento de 0,71% registrado pelo total da
assim chamada “riqueza financeira” entre janeiro e março. A hipótese é que os
donos do dinheiro no País teriam redirecionado suas aplicações e investimentos
para papéis privados, reduzindo sua exposição a títulos federais diante da
perspectiva de uma remuneração menos generosa.

·  
A
possibilidade de que essa mudança no comportamento dos investidores se mantenha
ao longo da crise é remota. A forte retração dos negócios desde março tornou o
cenário para os investidores muito mais sombrio, com a escalada dos riscos e
ameaça de quebradeira de empresas.