Dívida total das famílias passou a representar 78% da renda disponível

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 28 de agosto de 2021

Em seu conceito ampliado, o saldo dos créditos contratados pelas famílias havia experimentado um aumento de 15,9% na comparação entre maio deste ano e o mesmo mês de 2020, saindo de pouco mais de R$ 2,227 trilhões para R$ 2,581 trilhões. Comparado ao Produto Interno Bruto (PIB), o estoque da dívida avançou de 30,2% para 32,6% em igual intervalo. Mas a renda das famílias encolheu 3,5% em valores nominais na mesma comparação, como mostra o dado mais recente divulgado pelo Banco Central (BC), o que fez a relação entre dívida e renda subir de 64,9% para 77,9%.

A massa salarial ampliada disponível, que inclui salários, aposentadorias, pensões, pagamentos do programa Bolsa Família e benefícios de prestação continuada, descontados o Imposto de Renda recolhido na fonte e as contribuições para a Previdência, caiu de R$ 3,433 bilhões nos 12 meses encerrados em maio do ano passado para pouco menos de R$ 3,313 trilhões nos 12 meses imediatamente seguintes. Colocado de outra forma, as famílias viram seu endividamento subir em algo próximo a R$ 353,90 bilhões, enquanto sua renda disponível sofreu perda de R$ 120,32 bilhões. Em relação ao PIB, a massa ampliada de rendimentos perdeu em torno de 5,6 pontos de porcentagem, saindo de 47,4% para 41,8%, enquanto a dívida, na mesma comparação, ganhou 2,4 pontos.

Na comparação entre maio deste ano e dezembro do ano passado, os rendimentos líquidos das famílias, considerando os valores recebidos em 12 meses, apresentou variação de apenas 0,75% (menos do que a inflação de um único mês, lembrando que em maio o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo, o IPCA, registrou variação de 0,83%). O saldo do crédito ampliado concedido às famílias aumentou 5,3%, também em valores nominais. A disparidade entre dívidas e renda tende a afetar a propensão para consumir das famílias, numa tendência a ser agravada daqui para frente pela alta continuada das taxas básicas de juros, o que deverá encarecer o custo do crédito em toda a economia e esfriar ainda mais a demanda.

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Endividamento ainda avança

A série estatística do BC para a massa ampliada de rendimentos é atualizada com certo atraso pela autoridade monetária e o dado mais recente refere-se a maio, conforme mencionado. Mas os dados do crédito às famílias cobrem o período até julho deste ano e o estoque continuou em crescimento, avançando mais 3,1% desde maio, para quase R$ 2,661 trilhões, o que correspondeu a 32,8% do PIB, diante de 30,7% em julho do ano passado, quando havia somado R$ 2,260 trilhões – o que resultou num aumento de 17,7% em 12 meses.  A dívida é formada por empréstimos e financiamentos contratados pelas famílias em bancos e outras instituições financeiras, créditos dos fundos constitucionais regionais e outras operações de crédito, incluindo algumas em moeda estrangeira, mas de relevância menor, já que responderam por 0,76% da dívida total em julho.

Balanço

  • O valor da dívida externa das famílias manteve-se ao redor de R$ 20,1 bilhões em julho deste ano, diante de R$ 18,6 bilhões no mesmo mês do ano passado, crescendo 8,1%. O valor ficou ligeiramente abaixo dos R$ 20,7 bilhões registrados em março deste ano, recuando 2,9%, refletindo alguma redução do dólar no período, antes do mais recente surto de alta gerado pelas turbulências em série produzidas pelo Planalto.
  • As taxas de juros nos empréstimos contratados por empresas e pelas famílias no segmento de crédito livre já apontam reação às altas dos juros básicos, que começaram a ser elevados em março pelo Comitê de Política Monetária (Copom). Na média, os juros do crédito livre subiram de 25,5% ao ano em dezembro passado para 28,9% em julho, subindo 3,4 pontos de porcentagem. A elevação foi mais sensível para as pessoas jurídicas, com os juros saindo, na média, de 11,6% para 15,4% (mais 3,8 pontos).
  • Para as pessoas físicas, as taxas saíram de 37,2% para 39,8% (mais 2,6 pontos). Neste caso, registrou-se até mesmo algum recuo quando se considera que os juros haviam alcançado 40,1% em fevereiro. A tendência, de toda forma, considerando os aumentos já decretados pelo Copom, deve ser de alta nos próximos meses.
  • Até aqui, os indicadores de inadimplência continuam bem-comportados, mantendo-se ao redor de 3,0% sobre o saldo total dos créditos contratados no segmento livre.
  • Na avaliação do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), “o crédito continuou se expandindo a um ritmo robusto na entrada da segunda metade do ano”, com alta de 20,6% para o total das concessões (novos empréstimos e financiamentos) em julho deste ano, diante de igual mês do ano passado. O cálculo do Iedi desconta a inflação medida pelo IPCA, indicando crescimento real da liberação de crédito novo no mercado.
  • Esse comportamento ajuda a reforçar o ritmo dos negócios, mas carrega riscos diante do encarecimento do crédito antecipado pela retomada da política de juros altos. O Iedi lembra que as concessões de crédito têm crescido a taxas de dois dígitos desde abril deste ano, embora o desempenho ainda reflita “fracas bases de comparação”. O avanço, acrescenta o instituto,“vem sendo suportado pelas operações livremente pactuadas entre as partes”, com alta de 23,7% na comparação entre julho deste ano e igual período de 2020.
  • “O crédito oficial, que no início da crise da Covid-19 assumiu mais rapidamente um comportamento anticíclico, mostra agora nítida desaceleração”, crescendo 5,7% naquela mesma comparação, sempre conforme o Iedi.
  • No caso do crédito contratado pelas famílias, acrescenta o instituto, “os empréstimos oficiais continuam se expandindo na esteira no financiamento habitacional” e“as taxas de crescimento estão no positivo desde o último trimestre de 2020 e são mais elevadas do que as do crédito às empresas”. Em julho deste ano, as concessões totais para pessoas físicas registraram alta de 27,6% diante do mesmo período de 2020.